O artigo analisa brevemente o desenvolvimento do movimento operário na China nas últimas duas décadas e a evolução do papel da China Labour Bulletin (CLB) na defesa dos direitos dos trabalhadores e na promoção da democracia no local de trabalho. Ao sustentar que a negociação coletiva é a melhor forma de promover o diálogo e resolver disputas trabalhistas, o autor debate a crítica de que tal abordagem seria inviável devido à falta de sindicatos independentes na China. Concluindo, ele argumenta que, em longo prazo, o Partido Comunista chinês não terá opção a não ser formar uma aliança com o movimento dos trabalhadores e esta aliança, por sua vez, permitirá ao Partido sair do papel de instituição autoritária e altamente centralizada e transformar-se em um partido amplamente social-democrata capaz de tolerar e valorizar o desenvolvimento da democracia de base e da sociedade civil.
Quase uma década após a Revolução Laranja, a Ucrânia ainda está aprendendo a lidar com a democracia. Era óbvio para mim em 2008, quando visitei Kiev para participar de uma reunião do Movimento Mundial para a Democracia, que este país, que havia sido aclamado três anos antes como exemplo de protesto pacífico e mudança democrática, ainda não havia abraçado inteiramente os valores democráticos. Na chegada ao aeroporto, os agentes de controle de fronteiras ucranianas selecionaram cada uma das pessoas negras da nossa delegação e as fizeram ficar em uma fila especial para passarem pelos procedimentos de imigração.
Isso foi um choque e me fez pensar novamente sobre a definição de democracia. Seria ela um fim em si mesma ou um caminho, um processo que pode ajudar a resolver problemas no cotidiano das pessoas comuns? Desde 1997, tenho conversado com trabalhadores chineses comuns em meu programa de rádio chamado Radio Free Asia sobre seus problemas reais e prementes. Nessas interações tão pessoais não havia espaço para slogans políticos. Esses trabalhadores estavam focados em encontrar soluções dentro do sistema existente. E isso me levou à conclusão de que a democracia não diz respeito apenas às eleições presidenciais e às bandeiras políticas. Não é apenas um evento que acontece a cada quatro anos ou algo assim. É um processo em constante evolução que envolve toda a sociedade. Trata-se, creio eu, de um processo no qual deteriora-se a desigualdade social e por meio do qual diferentes grupos de interesse podem resolver suas diferenças via diálogo pacífico e comprometimento. E surge a importante pergunta: além de eleições, o que pode ser feito? E, antes das eleições, o que podemos fazer para cultivar o espírito de democracia?
Neste breve artigo, vou tentar responder a estas questões, focando especificamente o trabalho da organização China Labour Bulletin (CLB), como parte de uma luta mais ampla por democracia e direitos humanos na China. A CLB surgiu em 1994 como um boletim informativo abordando e expondo casos de violação de direitos trabalhistas na China. Mas, em 2002, nós da CLB decidimos não apenas disseminar notícia, mas também participar ativamente dela. Estabelecemos um programa de assistência jurídica que permitia aos trabalhadores buscar reparação por violações de direitos por meio de processos legais e judiciais. Na verdade, muitos dos casos que discutimos em meu programa de rádio tornaram-se processos judiciais nossos. No entanto, imediatamente encontramos um problema ideológico e político inconveniente.
Fornecer assistência jurídica aos trabalhadores poderia reduzir a raiva que eles sentem em relação ao principal responsável por essas violações de direitos – o Partido Comunista. Mesmo que o trabalhador não obtivesse sucesso, o processo ainda lhe permitiria enxergar legitimidade em um sistema não democrático e, assim, inadvertidamente, reforçar o regime comunista. Pode-se dizer que trabalhar dentro do sistema desta forma é quase como fingir que se está criticando alguém, enquanto na verdade o estamos apoiando.
Apesar de todos os desafios envolvidos na prestação de assistência jurídica aos trabalhadores que dela necessitavam, resolvemos continuar com base na lógica de que aplicar as normas legais existentes já era em si um avanço substantivo. Além disso, independentemente de haver ou não ações judiciais bem-sucedidas, elas podem ajudar a ressaltar quais questões jurídicas são importantes e levar adiante a discussão sobre reforma legal. Assim, aos poucos, mais e mais trabalhadores estarão cientes da lei e a utilizarão para requer reparação. Isto, então, aumentará a autoconfiança de outros trabalhadores buscando a defesa de seus direitos. Dito de outra forma, mesmo com um impacto limitado em relação à promoção da democracia, a prestação de assistência jurídica aos trabalhadores pode, pelo menos, promover o Estado de Direito e levar à mudança.
Em relação às doenças ocupacionais, por exemplo, antes que os trabalhadores pudessem obter um diagnóstico oficial da pneumoconiose, uma doença pulmonar mortal, o empregador precisava emitir um certificado declarando que eles foram empregados em um ambiente com grande quantidade de poeira.
Mesmo que um hospital normal diagnosticasse a doença, a clínica de doenças ocupacionais não assinava o diagnóstico sem o certificado do empregador. Para piorar a situação, a grande maioria dos trabalhadores com pneumoconiose era formada por mineradores e trabalhadores da construção civil que nunca tiveram um contrato de trabalho e que muitas vezes foram demitidos depois que contraíram a doença, o que tornava muito difícil a comprovação da relação de trabalho. É claro que seria muito fácil colocar a culpa de todos esses problemas no Partido Comunista, mas, em vez disso, em 2008, começamos a ajudar esses trabalhadores com pneumoconiose, a quem tinha sido negado um diagnóstico em clínicas de doenças ocupacionais, a processar seus empregadores em ambos os tribunais civil e criminal, processar as autoridades locais por omissão e as clínicas e os empregadores por formação de quadrilha e fraude. Os tribunais rejeitaram a maior parte desses casos e, entre os que foram aceitos, a grande maioria não obteve sucesso. No entanto, nunca desistimos e, até agora, apresentamos dezenas de processos relacionados à pneumoconiose em 13 províncias diferentes por toda a China.
Uma vez que estes casos de pneumoconiose tratavam de questões puramente jurídicas e econômicas, a mídia chinesa pôde se envolver e relatá-los em profundidade. Esta cobertura gerou muita discussão pública sobre quem deveria ser responsabilizado no caso de trabalhadores que contraíram doenças ocupacionais, e o debate público ajudou a pressionar ainda mais o governo para mudar a legislação. Finalmente, em 2011, o Ministério da Saúde alterou sua Regulamentação para o Diagnóstico de Doenças Ocupacionais e eliminou a necessidade de que os trabalhadores obtivessem um certificado de seu empregador comprovando que eles trabalhavam em um ambiente com grande quantidade de poeira, bem como a emissão de comprovação de vínculo empregatício. Em algumas províncias, o governo local ainda deu um passo a mais ao cobrir as despesas médicas dos trabalhadores e pagar-lhes ajudas de custo. Embora essas mudanças não signifiquem muita coisa quando comparadas aos direitos que os trabalhadores deveriam ter, elas ilustram como casos individuais, tenham sido eles vitoriosos ou não, são capazes de exercer pressão sobre o governo.
Além disso, estes casos de pneumoconiose também ajudaram no desenvolvimento da sociedade civil na China. A Love Save Pneumoconiosis, por exemplo, uma organização voluntária criada por um jornalista de renome há alguns anos, cresceu rapidamente e atua agora como uma vitrine para o avanço da conscientização e do ativismo de pessoas comuns em toda a China. Ela tem ajudado a ampliar os limites das organizações da sociedade civil para muito além da simples caridade, criando vários centros regionais em toda a China e desenvolvendo uma rede nacional de alto nível que oferece ajuda básica para os necessitados e faz lobby junto ao governo central em Pequim para a mudança.
Mas apesar do sucesso que tivemos na obtenção de compensação para os trabalhadores e na mudança das leis, era óbvio desde o início que havia violações em número muito superior à capacidade de qualquer organização. Então, o que poderíamos fazer? Mais uma vez, optamos por não seguir o caminho mais fácil, que seria culpar o Partido por tudo. Em vez disso, procuramos soluções práticas no âmbito local, tais como: maneiras de se prevenir as violações de direitos, de salvar vidas, de economizar recursos judiciais e desenvolver soluções sistemáticas de longo prazo.
Uma coisa que eu aprendi depois de duas décadas de trabalho no movimento operário chinês, quando me encontrava em semiexílio em Hong Kong, é que existem apenas duas situações em que destacar as falhas do governo faz sentido: em uma ditadura absoluta e em uma democracia. Como deve estar claro a partir dos exemplos acima, a China encontra-se em algum lugar entre esses dois pontos. É um regime autoritário, mas também está sujeita à pressão da opinião pública. E é por isso que é importante manter o pensamento positivo e procurar soluções viáveis.
Em 2005, por volta da mesma época em que a Organização Mundial do Comércio realizava uma reunião em Hong Kong, a CLB realizou seu próprio seminário, no qual anunciamos um novo programa que demonstrava ter potencial para cortar pela raiz todas as violações de direitos trabalhistas. A peça central desse programa era a promoção de um sistema de negociação coletiva em fábricas chinesas. Ainda me lembro dos sorrisos descrentes e desejos de “boa sorte” de meus amigos em grupos de direitos trabalhistas e sindicais naquela reunião. Na época, ninguém viu a possibilidade de criação de um sistema de negociação coletiva sob o regime do Partido Comunista chinês, que nega aos trabalhadores o direito à livre associação, e meu pensamento corajoso custou-me um grande número de amigos no movimento operário internacional; amigos que me apoiavam desde 1989 e cuja amizade eu muito valorizava.
Compreendi completamente por que eles estavam tão céticos. Naquela época, o regime comunista, com medo de que um movimento contrário ao governo, como o polonês Solidarity, se desenvolvesse na China, frequentemente sentenciava os líderes dos trabalhadores a longas penas de prisão. Mas pareceu-me que uma maneira de evitar que mais ativistas da causa trabalhista e líderes grevistas fossem jogados na cadeia seria estabelecer um mecanismo que pudesse resolver os conflitos entre trabalho e gestão de forma pacífica e que, ao mesmo tempo, tirasse o governo da jogada. Esses trabalhadores grevistas que haviam sido presos pelo regime comunista no início dos anos 2000 não estavam pedindo por mudanças políticas.
Eles pediam apenas que seus problemas econômicos fossem resolvidos. Essas queixas estavam relacionadas a questões fundamentais de subsistência, como ter comida suficiente na mesa para suas famílias, e, como tal, nunca poderiam ser erradicadas por meio de supressão política. Além disso, como a economia chinesa seguia o caminho da liberalização e se desenvolveu tornando-se mais firmemente integrada à economia mundial, as questões dos direitos trabalhistas tornaram-se muito menos problemáticas para o governo. Concluímos que a repressão do governo aos direitos dos trabalhadores não poderia durar por muito tempo e que uma nova oportunidade para o movimento dos trabalhadores surgiria se pudéssemos tomar a iniciativa de despolitizar as questões trabalhistas. Em outras palavras, neste importante momento em que o Partido estava começando a perceber que sua posição anterior sobre o movimento operário havia sido equivocada, nossa dúvida era qual caminho seguir: continuar a enfatizar a natureza política dos direitos dos trabalhadores ou focarmos em questões econômicas básicas, como garantir que os trabalhadores recebessem a parte da riqueza que eles mesmos ajudaram a criar?
No entanto, em 2005, essa ideia era completamente politicamente incorreta. As pessoas poderiam facilmente nos criticar dizendo que a CLB tinha sofrido uma lavagem cerebral pelo Partido Comunista chinês ou mesmo que a CLB estava vendendo os trabalhadores e minando o movimento operário chinês! Vista de qualquer perspectiva, parecia que a nossa nova abordagem era um suicídio político. Mais uma vez eu entendia as acusações, mas tinha certeza de que a necessidade de se contar com um sistema de negociação coletiva era impulsionada por exigências fundamentais nascidas no chão de fábrica. Afinal, a negociação coletiva não é boa apenas para os trabalhadores; ela beneficia também o empregador e o governo, criando uma tripla vitória para as partes envolvidas. No longo prazo – não importando se é na China ou em outra parte do mundo, em um regime autocrático ou em uma democracia – é absolutamente necessária uma relação saudável entre trabalho e gestão e ela só é possível com base na igualdade e no respeito mútuo. Independentemente das consequências para a CLB, mantivemos nossas crenças e nunca nos esquivamos de explicá-las a líderes do governo, políticos, sindicalistas, ativistas sindicais, acadêmicos e jornalistas. Mais tarde, a negociação coletiva se tornou amplamente discutida e foi até mesmo apontada como uma possível solução capaz de beneficiar as três partes envolvidas em relação aos problemas inerentes às relações de trabalho na China.
Então, em maio de 2010, pouco antes da Primavera Árabe, os trabalhadores em toda a China mostraram ao mundo que estavam prontos para a mudança. Tudo começou em uma fábrica de autopeças da Honda, em Guangdong, quando várias centenas de trabalhadores entraram em greve para exigir um aumento salarial (MITCHELL; SOBLE, 2010). Embora os trabalhadores tenham tido êxito e suas demandas basicamente atendidas, a disputa foi de fato resolvida por intelectuais e figuras públicas vindas de fora do movimento, e não pelos próprios trabalhadores. Em outras palavras, embora a greve tenha sido iniciada pelos trabalhadores, ela foi resolvida por pessoas com um “status social mais elevado”. Por que o governo não empregou as forças policiais para dissolver a greve, em vez de enviar essas pessoas de fora para mediar um acordo? Eu não sei, e não quero especular sobre o motivo. Tudo o que eu sei é que o governo agiu assim e parecia estar funcionando. Na CLB, vimos isso como um momento histórico e como uma oportunidade para avançar. Ficou claro que não eram apenas os trabalhadores que estavam prontos para avançar, mas o governo também estava pronto para a mudança.
No ano seguinte, houve outro caso importante. Centenas de trabalhadores de uma fábrica da Citizen Watch, em Shenzhen (THE DEVELOPMENT…, 2012) entraram em greve e desta vez elegeram democraticamente seus representantes, além de iniciarem negociação coletiva com a direção e negociarem seu acordo com sucesso. Os trabalhadores tinham uma queixa antiga relacionada ao não pagamento de horas extras no período entre 2005 e 2010. Durante esse período, a direção não incluiu a pausa diária de 40 minutos como parte de suas horas normais de trabalho e recusou-se a pagar horas extras até que os empregados compensassem os 40 minutos “perdidos”. A greve não conseguiu resolver o problema, de modo que os trabalhadores contrataram um escritório de advocacia local, especializado em negociação coletiva, para trabalhar para eles e ajudá-los a negociar um acordo com a direção. Após uma semana de negociações face a face, em 17 de novembro de 2011 os trabalhadores aceitaram da direção a oferta de pagamento de 70% das horas extras atrasadas. Neste momento, uma das perguntas mais frequentes na cobertura midiática deste caso era “Onde está o sindicato?”.
Mais uma vez, vale a pena dizer que poderíamos ter focado no fato de que o Partido Comunista era responsável pelas condições que permitiram à Citizen explorar os trabalhadores e se apoderar de suas horas extras. Não haveria risco político para nós em escolher esta abordagem – condenar capitalistas e comunistas –, mas escolhemos a abordagem politicamente incorreta ao trabalhar dentro do sistema para encontrar uma solução. Afinal, esses abusos por parte das corporações transnacionais acontecem em todo o mundo, tanto nas democracias quanto nas autocracias. O sistema político não é a única questão; a questão imediata no caso da China é encontrar uma solução para os problemas reais no âmbito local – mesmo que tenhamos que colocar a política de lado por um tempo e nos concentrarmos apenas nas questões econômicas cotidianas.
A má notícia é que logo após o fechamento do acordo coletivo na Citizen, os representantes dos trabalhadores foram demitidos. Então, você poderia concluir que não valeu a pena. Mas, para nós, este episódio chamou atenção para um problema que todo o movimento sindical enfrenta, ou seja, como proteger os líderes dos trabalhadores e ao mesmo tempo manter a dinâmica do diálogo saudável. Assim, a luta continua. Em casos mais recentes em Shenzhen (SHENZHEN…, 2014) e Guangzhou (WORKERS’…, 2014), tivemos uma situação em que vários trabalhadores foram processados pelas autoridades por conta de seus atos de protesto. E, novamente, você poderia entender isso como mais um exemplo da repressão do governo, mas se você considerar o apoio que esses trabalhadores têm recebido de seus colegas de trabalho e de grupos de direitos trabalhistas em Guangdong, você verá que agora os trabalhadores estão prontos para se levantarem e levarem à frente um movimento de trabalhadores forte e vibrante na China.
Em chinês a palavra “crise” (??) consiste em dois caracteres, “perigo” e “oportunidade”. Esta sabedoria antiga enfatiza que há dois lados para tudo. Você pode focar o lado bom ou o lado ruim de qualquer situação. Nós da CLB tentamos sempre ver os pontos positivos e aproveitar a oportunidade quando ela surge. Como mencionado anteriormente, a greve da Citizen e a negociação coletiva que se seguiu a ela levantou uma questão muito importante: onde estão os sindicatos? Todos na China sabem que os sindicatos são controlados e protegidos pelo partido. Os dirigentes da Confederação Geral dos Sindicatos da China estão em belos escritórios distantes dos trabalhadores comuns. Mas depois do caso da Citizen, a federação sindical local em Shenzhen não suportou mais as pressões e, em meados de 2012, decidiu mostrar que realmente estava ao lado dos trabalhadores, quando se envolveu em uma greve na fábrica de eletrônicos japonesa Ohms na cidade e, em seguida, organizou uma eleição democrática no sindicato da fábrica (RAMZY, 2012). O presidente da federação declarou publicamente que o sindicato era uma organização de trabalhadores e deveria ser eleito pelos próprios trabalhadores. Esta declaração agregou questões como greves, negociação coletiva e o papel dos sindicatos de tal forma que as greves hoje em dia já não são tabu para o sindicato oficial e cada vez mais trabalhadores pedem eleições sindicais democráticas.
É importante ressaltar que tal afirmação não veio de um dissidente como eu. Ela veio do líder de um sindicato oficial. E isso tem sua importância, pois dá ao sindicato oficial a chance de fazer algo de bom para os trabalhadores, ao mesmo tempo em que o resultado dessa ação é igualmente bom para os patrões e para o governo. Além de apoiar o sindicato, quando necessário, apoiamos também o governo, como quando publicamos um anúncio de meia página (CHINA…, 2010) em um grande jornal de Hong Kong, intitulado “Apoiem os esforços de Guangdong para estabelecer um sistema de negociação salarial coletiva: uma vitória para os trabalhadores, os empregadores e o governo”. O anúncio foi uma resposta às tentativas dos donos de empresas de Hong Kong de inviabilizar um projeto de lei no Legislativo de Guangdong que teria dado aos trabalhadores e à direção a chance de negociar salários e condições de trabalho com base na igualdade e no respeito mútuo. Então, sim, apoiamos abertamente a legislação proposta pelo governo de Guangdong controlado pelo Partido Comunista, porque neste caso a mudança legislativa proposta beneficiaria todos os envolvidos e, novamente, porque ao fazê-lo, isso nos ajudaria a focar na resolução de problemas trabalhistas no âmbito local, e não políticas partidárias.
Durante a última década, as estratégias da CLB mudaram de acordo com e em resposta ao cenário das relações de trabalho na China, em constante mudança. Nós não seguimos nenhuma agenda política, olhamos para o que estava acontecendo no âmbito local e agimos em conformidade, aproveitando as oportunidades conforme elas se apresentavam, identificando o caminho a seguir e permanecendo nele.
Olhando para trás, diria que tivemos sorte o suficiente para apertar o botão certo na hora certa, antes que a oportunidade de fazê-lo desaparecesse. Olhando para o futuro, tenho certeza que muitas outras pessoas discordarão de mim, mas estou confiante de que teremos outras oportunidades como esta. Na estrada à frente, eu posso ver o Partido Comunista chinês transformando-se em um partido amplamente social-democrata, e os valores social-democratas se tornando o padrão vigente. Em outras palavras, a China se tornará a versão do mundo em desenvolvimento dos países nórdicos da Europa.
Por que eu acho que isso poderia acontecer? Ao longo da última década aproximadamente, assistimos ao crescimento notável do movimento dos trabalhadores na China. Os trabalhadores deixaram o papel de vítimas e emergiram como uma sólida força coletiva, determinada e cada vez mais ativa. Vimos também o Partido Comunista se afastar da busca cega pelo crescimento econômico e se concentrar muito mais na resolução de questões básicas de subsistência, no aumento da renda e no combate às desigualdades sociais, como forma de fortalecer a sua própria legitimidade política. No futuro, a fim de realizar suas metas, acredito que o partido acabará por firmar uma aliança com o movimento dos trabalhadores. Para muitos, esta é uma possibilidade revoltante. Alguns perguntarão como eu ouso sugerir isso. Bem, se é necessário, se tal aliança pode ajudar a facilitar a transição pacífica para um regime melhor e um país melhor, então por que não dizê-lo e, mais importante, por que não fazê-lo?
Não se trata de avaliar se os funcionários do partido são bons ou maus. Eu simplesmente acredito que seja do interesse do partido formar uma aliança com o movimento dos trabalhadores. E há sinais de que os novos dirigentes do Partido e do governo também reconhecem isso. Eles deixaram claro em recentes declarações políticas (CHINA’S OFFICIAL…,2013) que uma de suas principais prioridades é melhorar o padrão de vida dos trabalhadores comuns e que, além disso, é de responsabilidade dos sindicatos fazer isso acontecer. É difícil entender por que haveria qualquer conflito entre os trabalhadores e o Partido a respeito dessa questão, seja a curto ou longo prazo. Um sindicato forte liderado por trabalhadores, com liberdade para negociar melhores salários e condições de trabalho nas bases é claramente bom para o partido, na medida em que contribui para seus objetivos declarados. Além disso, os trabalhadores precisam de força política ou de apoio para garantir que seus interesses sejam protegidos e promovidos pelo governo. Se pararmos para pensar, a linguagem básica do Partido e dos trabalhadores é a mesma; são as ultrapassadas concepções políticas que nos impedem de entender isso.
No longo prazo, uma aliança entre o movimento operário e o partido ajudará a elevar os níveis de qualidade de vida e aumentar a justiça social. Ela também permitirá que o Partido se transforme de uma instituição autoritária e altamente centralizada em um partido amplamente social-democrata que tolera e aprecia o desenvolvimento da democracia de base e da sociedade civil. Eu acredito ser inevitável que o Partido Comunista se dividida em dois campos: aqueles que acreditam na lei da selva e aqueles que acreditam na democracia social. E a única maneira de fazer prevalecer o campo social-democrata será uma aliança com os trabalhadores. Isso pode parecer fantasioso, mas se olharmos para os valores da cultura tradicional chinesa, que enfatizam a importância da igualdade social, você verá como eles podem ser alinhados aos ideais da democracia social. Esses valores surgiram nos movimentos políticos ao longo da história chinesa, mas, infelizmente, sempre foram esmagados e corrompidos por uma revolução violenta. Mas a situação é diferente hoje em dia. A Guerra Fria terminou um quarto de século atrás e o mundo não está mais dividido em diferentes campos políticos. Pelo contrário, agora está intimamente conectado pelo comércio e pelos interesses econômicos que as nações têm em comum. O discurso excessivamente politizado e partidário da Guerra Fria tem pouca relevância hoje. Acredito que o Partido Comunista chinês também reconhece isso e terá que se preparar para abraçar os valores social-democratas, não somente porque é a coisa politicamente correta a se fazer, mas porque é do seu interesse fazê-lo. Permitir que centenas de milhões de trabalhadores da China partilhem os frutos de 35 anos de desenvolvimento econômico é bom para a China e bom para o partido. O cenário alternativo, em que a repressão política é a norma e vale a lei do mais forte, não pode mais ser considerado. Seria uma catástrofe, não só para a China, mas para o mundo inteiro, se a segunda maior economia mundial se tornasse uma nova Rússia. Ninguém sabe ao certo como o processo democrático se desenvolverá na China, mas uma coisa é certa: o processo já está em andamento e não temos escolha a não ser nos envolvermos.
Bibliografia e outras fontes
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