Examinar os recentes fluxos migratórios oferece a oportunidade de entender as dinâmicas mais amplas que impelem as pessoas a migrar
Novos tipos de fluxos migratórios estão surgindo e não devem ser confundidos com fluxos estabelecidos há longa data. Examinar os fluxos migratórios desde sua origem nos permite entender melhor as complexas dinâmicas por trás deles. Estas dinâmicas nos contam algo sobre uma combinação maior de condições que só continuará a crescer, desde novos tipos de guerra e violência, até grandes perdas de habitat. Elas nos convidam a considerar essas condições estruturais mais amplas e não somente a existência desses fluxos por si só. Neste artigo, Saskia Sassen analisa três novos fluxos migratórios, cada um deles muito diferente entre si, especificamente: (1) de menores desacompanhados da América Central que se dirigem aos Estados Unidos da América; (2) o aumento do fluxo migratório dos Rohingya, uma minoria muçulmana fugindo de Mianmar/Birmânia; e (3) a migração em direção à Europa com pessoas originárias principalmente da Síria, Iraque, Afeganistão e vários países africanos, especialmente da Eritreia e da Somália.
Embora, frequentemente, as famílias desempenhem um papel crucial na elaboração de um cálculo econômico que aloca a determinados membros da família a opção migratória, Sassen observa que esses fluxos são diferentes. Eles emergem de condições claramente delineadas operando, respectivamente, em âmbito municipal, regional e geopolítico global.
Uma hipótese central que ordena meu trabalho sobre migrações é que elas ocorrem dentro de sistemas, ainda quando geradas por forças externas.11. Ver Saskia Sassen, The Mobility of Labor and Capital (Cambridge: Cambridge University Press, 1988). No caso dos Estados Unidos da América (EUA), isso pode ser visto em algumas das migrações que ocorreram após suas operações militares – concebidas no Pentágono, no Departamento de Estado e na Casa Branca. Por exemplo, a invasão estadunidense da República Dominicana, após a eleição do socialista Bosch, estabeleceu ligações com os EUA que levaram a uma migração totalmente nova principalmente de dominicanos de classe média para a costa leste dos EUA.22. Esta é a migração que tem início depois da invasão da República Dominicana promovida pelo presidente Reagan após a eleição de um político social-democrata (Bosch) à presidência do país. Ela não tem nenhuma relação com a migração do início do século XX de ativistas do sindicato dos tipógrafos que deixaram a República Dominicana rumo aos EUA para escapar da perseguição de seu próprio governo. Ademais, o fato de que as migrações acontecem dentro de sistemas também ajuda a explicar por que elas têm início em determinado momento, mesmo quando uma família ou uma comunidade é pobre há muito tempo. É possível demonstrar que a maioria das grandes migrações dos últimos dois séculos e, frequentemente, até de períodos anteriores, começaram em determinado momento – elas têm origens, não estão lá simplesmente desde o início.
Neste artigo eu me concentro em três fluxos que podem ser vistos como um conjunto particular de novas migrações que emergiram ao longo dos últimos dois anos.33. Para ter acesso ao argumento desenvolvido na íntegra e à documentação empírica, consulte os trabalhos da autora “A Massive Loss of Habitat: New Drivers for Migration,” Sociology of Development, forthcoming; Sassen, Expulsions: Brutality and Complexity in the Global Economy (Cambridge, Mass: Harvard University Press/Belknap, 2014); e Sassen, “A Savage Sorting of Winners and Losers: Contemporary Versions of Primitive Accumulation,” Globalizations 7, nos. 1-2 (Mar.-Jun. 2010): 23-50. As novas migrações são, amiúde, muito menores do que as migrações mais antigas em curso, mas analisá-las desde suas origens nos oferece a oportunidade de entender as dinâmicas mais amplas que impelem as pessoas a migrar. As migrações emergentes têm sido de interesse para mim desde longa data: isto é, o migrante como indicador de uma história em construção. Uma vez que o fluxo migratório é marcado pela migração em série, é necessário muito menos para explicar esse fluxo. Meu foco é, sobretudo, nesse contexto mais amplo dentro do qual um novo fluxo se inicia.44. Ver Sassen, The Mobility, 1988; Sassen, Guests and Aliens (New York: New Press, 1999); Sassen, Expulsions, 2014.
Aqui examino três fluxos emergentes. Cada um deles é facilmente considerado como parte de fluxos contínuos mais antigos. Meu foco são as especificidades de cada um desses novos fluxos. O primeiro deles é o aumento acentuado da migração de menores desacompanhados da América Central – especificamente, de Honduras, Salvador e Guatemala. O segundo é o aumento do fluxo migratório dos Rohingya, uma minoria muçulmana em fuga de Mianmar/Birmânia, onde ela viveu e conviveu pacificamente, por muito tempo, com a população majoritariamente budista até poucos anos atrás. O terceiro é a migração em direção à Europa, originária, principalmente, da Síria, do Iraque, do Afeganistão e de diversos países africanos, especialmente, da Eritreia e da Somália. Estes três casos são tipos muito diferentes de fluxos e o terceiro, por sua vez, contém múltiplos fluxos distintos. No entanto, cada um aponta para um contexto originário mais amplo marcado por condições, em sua maioria extremas, que podem ser descritas ou, pelo menos, feitas visíveis porque não se trata somente de parte de uma migração em série em que as famílias podem desempenhar um papel crucial na elaboração de um cálculo econômico que aloca a determinados membros da família a opção de migração.
Esses três novos fluxos podem ser descritos como emergentes de situações mais amplas do que as lógicas internas das famílias. Eles emergem de condições claramente delineadas que operam, respectivamente, em âmbito municipal, regional e geopolítico global. Permitam-me acrescentar de modo oportuno que a cidade e os contextos regionais estão frequentemente inseridos em um âmbito maior de dinâmicas, mas nos casos analisados aqui há também um efeito direto imediato nestes contextos subnacionais.
A extrema violência é uma condição central para explicar essas migrações, assim como o são trinta anos de políticas de desenvolvimento internacional que deixaram muitos habitats mortos (devido à mineração, às apropriações de terras para a expansão latifundiária e à monocultura agrícola) e expulsaram comunidades inteiras de seus territórios. Mudar para as favelas das grandes cidades tem, cada vez mais, se tornado a última opção, e aqueles que podem arcar com os custos recorrem à migração. Essa história de várias décadas de destruição e expulsões atingiu níveis extremos tornados visíveis em vastas extensões de sistemas terrestres e aquáticos que estão mortos hoje em dia. No mínimo, algumas das guerras e dos conflitos locais emergem destas destruições, em uma espécie de luta pelo habitat. E a mudança climática reduz ainda mais o território habitável. Eu desenvolvo todas estas questões em profundidade no livro Expulsions.55. Ver Sassen, Expulsions, 2014, capítulos 1 e 2.
Eu enfoco a seguir as características principais de uma variedade de fluxos emergentes, cada um deles marcado por condições extremas.66. Ver nota de rodapé 3 para ter acesso às fontes de dados e detalhes. Embora emergentes, estas condições podem, eventualmente, tornar-se preponderantes para os sistemas existentes de políticas de migração e refúgio, para as áreas de acolhida e para os homens, mulheres e crianças que formam esses fluxos.
A América Central é uma das principais regiões onde a migração de menores desacompanhados cresceu acentuadamente nos últimos dois anos.77. Permitam-me mencionar também que o número de detenções de cidadãos mexicanos diminuiu 18% entre o ano fiscal (período compreendido entre 30 de setembro do ano mencionado e 1º de outubro do ano anterior) de 2014 e o ano fiscal de 2015, de acordo com estatísticas do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (United States Department of Homeland Security, na denominação original em inglês), disponíveis em (“Department Is Better Targeting Its Enforcement Efforts To Prioritize Convicted Criminals And Threats To Public Safety, Border Security, And National Security,” US Department of Department of Homeland Security, 22 dez. 2015, acesso em 30 mai. 2016, https://www.dhs.gov/news/2015/12/22/dhs-releases-end-fiscal-year-2015-statistics), under sub-heading U.S. Customs and Border Protection (CBP) Enforcement Efforts at and between Ports of Entry. Um fator preponderante por trás dessa migração de menores é a violência urbana em rápida escalada dos últimos anos. Na minha percepção, a violência urbana ocorre, em boa parte, devido à destruição de economias rurais de pequenos proprietários em consequência do processo de apropriações de terras para a formação de latifúndios para agricultura de monocultura, mineração e da perda de vida da própria terra devido a estes usos. Fugir para as cidades era a única opção para um número crescente de pessoas do meio rural, mas as próprias cidades contavam com pouca geração de empregos. Outros grandes centros de emigração, em especial o Sudeste Asiático, assim como os fluxos de pessoas que chegam da África e Ásia através da região do Mediterrâneo, são constituídos, sobretudo, por homens, ainda que a quantidade de mulheres e crianças esteja crescendo. Embora a América Central tenha sido, por muito tempo, uma região de emigração por razões políticas e econômicas, este fluxo de crianças desacompanhadas é novo. Elas são impelidas a migrar em razão de um enorme medo por causa da extrema violência urbana que entrou em erupção nos últimos anos.
Os dados disponíveis mostram que cerca de sessenta e três mil menores desacompanhados, a maioria da América Central, cruzou a fronteira sul dos EUA entre 1º de outubro de 2013 e 31 de julho de 2014, de acordo com a Agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras do Governo dos EUA (US Customs and Border Protection, na denominação original em inglês).88. Danielle Renwick, “The U.S. Child Migrant Influx.” CFR Backgrounder, Council on Foreign Relations, Sept. 1, 2014, acesso em 21 mai. 2016, http://www.cfr.org/immigration/us-child-migrant-influx/p33380. Este número é quase o dobro do total de crianças migrantes que chegaram ao país durante o mesmo período do ano anterior. A estimativa é de que, ao final de 2014, até noventa mil crianças desacompanhadas tinham cruzado a fronteira com os EUA.99. Diana Villiers Negroponte, “The Surge in Unaccompanied Children from Central America: A Humanitarian Crisis at Our Border.” Brookings, 2 jul. 2014, acesso em 21 maio 2016, http://www.brookings.edu/blogs/up-front/posts/2014/07/02-unaccompanied-children-central-america-negroponte. Não existe nenhuma estimativa sobre aqueles que podem ter morrido nessa longa viagem ou que desistiram e ficaram no México, ou foram sequestrados para trabalhar em latifúndios de monocultura ou em minas. Em 2015, houve uma queda das chegadas aos EUA, já que o governo dos Estados Unidos pediu ao governo mexicano para controlar sua fronteira sul. No entanto, nos primeiros meses de 2016 o número de menores desacompanhados que atravessaram a fronteira dos Estados Unidos cresceu acentuadamente mais uma vez.
De acordo com declarações das próprias crianças, de pesquisadores, assistentes sociais e outros profissionais da área e especialistas do governo, a violência de grupos criminosos e da polícia é o principal fator que leva os jovens a emigrar.1010. Ver, por exemplo, Spencer Ackerman, Tom Dart, Daniel Hernandez, and David Smith, “Immigration Activists Condemn US Deportation Asylum Seekers.” Guardian, 4 jan. 2016, acesso em 10 jan. 2016, http://www.theguardian.com/us-news/2016/jan/04/immigration-activists-condemn-deportations-asylum-central-america; Jonathan Hiskey, Mary Malone, and Diana Orces, “Violence and Migration in Central America.” Americas Barometer Insights Series, 2014, acesso em 11 jan. 2016, http://www.vanderbilt.edu/lapop/insights/IO901en.pdf; Jana Sladkova, “Stratification of Undocumented Migrant Journeys: Honduran Case.” International Migration, 22 dez. 2013, acesso em 22 jun. 2016, http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/imig.12141/abstract;jsessionid=76BDEB06E3621C872631C5929E6CE4A9.f04t02; Elisa Wiener Bravo, The Concentration of Land Ownership in Latin America: An Approach to Current Problems (Rome: International Land Coalition, 2011); and Edilma L. Yearwood, “Let Us Respect the Children: The Plight of Unaccompanied Youth,” Journal of Child and Adolescent Psychiatric Nursing 27, no. 4 (2014): 205-6. Em 2014, 98% dos menores desacompanhados que chegaram à fronteira dos EUA eram de Honduras (28%), México (25%), Guatemala (24%) e El Salvador (21%). Esta desagregação de dados representa uma mudança significativa: antes de 2012, mais de 75% das crianças desacompanhadas eram do México.1111. Ver Muzaffar Chishti and Faye Hipsman, “Dramatic Surge in the Arrival of Unaccompanied Children Has Deep Roots and No Simple Solutions.” Migration Policy Institute, Policy Beat, 13 jun. 2014, acesso em 12 abr. 2016, http://www.migrationpolicy.org/article/dramatic-surge-arrival-unaccompanied-children-has-deep-roots-and-no-simple-solutions. Em 2015, 35% dos menores desacompanhados que chegaram à fronteira dos EUA eram da Guatemala, 28% do México, 24% de El Salvador e 14% de Honduras.1212. “Southwest Border Unaccompanied Alien Children Statistics FY 2016,” U.S. Customs and Border Protection, 2016, acesso em 10 jan. 2016, http://www.cbp.gov/newsroom/stats/southwest-border-unaccompanied-children/fy-2016.
Crianças salvadorenhas e hondurenhas vêm de algumas das regiões mais violentas do mundo. Elas temem a violência mais do que os conhecidos riscos de transitar sozinhas por todo o México e pelos desertos nas fronteiras dos EUA. De acordo com os dados coletados pelo Pew Research Center, San Pedro Sula, em Honduras, foi a capital mundial de assassinatos em 2013, com uma taxa de 187 homicídios por cem mil habitantes em 2013, impulsionados por uma onda de violência de grupos criminosos e pelo tráfico de drogas.1313. “UNODC Homicide Statistics 2013,” UN Office on Drugs and Crime (UNODC), Global Study on Homicide, 2013, acesso em 13 jan. 2016, https://www.unodc.org/gsh/en/data.html. Em 2012, a taxa de homicídios em Honduras foi de noventa assassinatos por cem mil habitantes, a mais alta do mundo.1414. “Intentional Homicides (per 100,000 People),” World Bank, 2015, acesso em 10 jan. 2016, http://data.worldbank.org/indicator/VC.IHR.PSRC.P5?order=wbapi_data_value_2013+wbapi_data_value+wbapi_data_value-last&sort=desc. Em 2011, El Salvador não se encontrava muito atrás de Honduras, com setenta homicídios por cem mil habitantes, estando na segunda posição em termos de homicídios na América Latina.1515. “UNODC Homicide Statistics 2013,” UNODC, 2013. Mesmo com uma queda significativa na taxa de homicídios – de setenta por cem mil habitantes, em 2011, para quarenta e um, em 2012, El Salvador só é superada por Honduras, Venezuela e Belize no mundo inteiro. Ademais, de acordo Banco Mundial, Honduras, Guatemala e El Salvador estão entre os países mais pobres na América Latina, com 30%, 26% e 17% de suas populações vivendo com menos de dois dólares por dia, respectivamente.1616. “Latin America and Caribbean,” World Bank, 2015, acesso em 10 jan. 2016, http://povertydata.worldbank.org/poverty/region/LAC.
Esta combinação de fatores contribui para explicar a alta emigração entre crianças e adultos. A situação mais extrema é de El Salvador, com até 18% de sua população deixando o país, o dobro quando comparado com Honduras e Guatemala. Exceto países muito pequenos, como Trinidad e Tobago, os chamados “países de emigração” raramente atingem esses patamares. As migrações da América Central são muito bem documentadas por pesquisadores e pela imprensa. Isto se dá em parte porque as migrações que vêm do sul da fronteira dos Estados Unidos estão ocorrendo há muito tempo.
Os contrabandistas estão à caça de potenciais migrantes, tanto jovens, quanto velhos. Eles estão em busca de negócios e a proliferação de quadrilhas de contrabando de migrantes aumentou a concorrência no mercado, então eles retratam uma situação muito mais positiva do que a política de migração de Obama oferece. Eles costumam dizer aos menores que, uma vez que eles estejam nos EUA, como menores de idade eles serão encaminhados para se tornarem cidadãos ou migrantes legais, o que é mentira. As deturpações promovidas pelos contrabandistas têm, evidentemente, contribuído para o aumento da emigração de menores – e, até mesmo, de adultos. Isso é novo. Sobretudo, no passado, os contrabandistas (frequentemente, denominados “coiotes”) que faziam os seus negócios de cruzar a fronteira dos EUA não eram tão profissionais: eles eram contratados para uma determinada função a um determinado preço e ponto final.
Os números repentinamente elevados, a falta de instalações para acomodar os menores em um sistema planejado para adultos e um forte sentimento anti-imigração podem ter contribuído para uma grande mudança na política nos EUA. A mudança levou a uma queda drástica de 60% no número de menores desacompanhados capturados em setembro de 2014, em comparação a um ano antes.1717. Elise Foley, “Mexico is Now Detaining More Central Americans than the U.S.” Huffington Post, 12 jun. 2015, acesso em 9 mai. 2016, http://www.huffingtonpost.com/2015/06/12/mexico-deporting-central-america_n_7571174.html; Secretaría de Gobernación, Instituto Nacional de Migración, n.d., acesso em 30 mai. 2016, http://www.gob.mx/inm; e “Mexico Now Detains More Central American Migrants Than The United States,” WOLA Advocacy for Human Rights in the Americas, 11 jun. 2015, acesso em 30 mai. 2016, http://www.wola.org/news/mexico_now_detains_more_central_american_migrants_than_the_united_states. No entanto, na realidade, o número de partidas originárias da América Central pode não ter diminuído muito, se é que elas diminuíram. O que mudou são as regras do jogo. Sob a pressão dos EUA, o México começou a prender e deportar dezenas de milhares de pessoas da América Central muito antes de chegarem à fronteira com os EUA. O que mudou para estes migrantes é o tratamento que eles estão recebendo na fronteira sul do México, que é ainda mais selvagem do que antes. Quando analisamos somente as partidas, como algo distinto das entradas nos EUA, as evidências parciais mostram que elas ainda podem ser elevadas, embora possam eventualmente diminuir.
Estes são os números. Entre outubro de 2014 e abril de 2015, o México deteve 92.889 migrantes provenientes da América Central. Durante o mesmo período, os EUA detiveram 70.226 migrantes que não possuíam origem mexicana, em sua maioria provenientes de Honduras, Guatemala e El Salvador. No entanto, os EUA tinham detido 159.103 migrantes que não possuíam origem mexicana no mesmo período do ano anterior, o que é mais do que o triplo do número de detidos pelo México antes da implementação da nova política.1818. Foley, “Mexico is Now Detaining…,” 2015. Dados do Instituto Nacional de Imigração do México mostram que 51.565 “migrantes” da Guatemala, Honduras e El Salvador foram deportados entre janeiro e abril de 2015 da fronteira sul do México de volta para casa e que, em 2014, durante este mesmo período, mais de 28.736 pessoas foram deportadas. A deportação de guatemaltecos aumentou 124%, seguida da deportação de salvadorenhos, que contou com um aumento de 79%, e de hondurenhos, com incremento de 40%.1919. Ver também os dados do Mexico’s National Immigration Institute compilados por diversos meios de comunicação (por exemplo, Associated Press Mexico, “Deportation In Mexico Up 79 Per Cent In First Four Months of 2015.” Guardian, 11 jun. 2015, acesso em 10 jan. 2016., http://www.theguardian.com/world/2015/jun/11/deportations-mexico-central-america; “Fuerte Incremento de Las Deportaciones Desde México,” Univision, 11 jun. 2015, acesso em 30 maio 2016, http://www.univision.com/noticias/noticias-de-mexico/fuerte-incremento-de-las-deportaciones-desde-mexico.
As robustas operações de detenção por parte da polícia mexicana em sua fronteira sul podem ser consideradas extremamente violentas. Em uma entrevista ao New York Times, Ruben Figueroa, da Mesoamerican Migrant Movement,2020. Randal C. Archibold, “On Southern Border, Mexico Faces a Crisis of Its Own.” The New York Times, 20 jul. 2014, acesso em 10 jan. 2016, http://www.nytimes.com/2014/07/20/world/americas/on-southern-border-mexico-faces-crisis-of-its-own.html?_r=0. uma organização de defesa dos migrantes, considera que esta ampla perseguição por parte das autoridades federais resultou em acidentes nos quais menores migrantes morreram e foram feridos em confrontos entre contrabandistas e a polícia. Isso também levou à prisão, morte e ao desaparecimento dessas crianças desacompanhadas – algumas acabam ficando em lugares razoáveis, tais como abrigos de igrejas, ou são acolhidas por famílias generosas. Outras estão definhando como crianças de rua. E outras desapareceram sem deixar vestígios. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos manifestou recentemente a sua “preocupação com o endurecimento das ações levadas a cabo contra pessoas migrantes” que foram postas em prática após o México iniciar seu plano na fronteira sul no ano passado sob a pressão dos EUA.2121. “IACHR Expresses Concern over Mexico’s Southern Border Plan,” Organization of American States, 10 jun. 2015, acesso em 20 mai. 2016, http://www.oas.org/en/iachr/media_center/PReleases/2015/065.asp.
A fronteira sul do México se tornou o terrível Mediterrâneo para essas crianças desacompanhadas da América Central (e também para os adultos). Elas acabam na cadeia, são agredidas, perdem membros, morrem. Mas algumas, como parece ser o caso em todas essas migrações, conseguem passar. Dados dos EUA mostram que, em junho de 2015, crianças desacompanhadas continuaram chegando aos EUA, ainda que em números muito menores. Algumas entraram sem serem detectadas e descobertas.2222. WOLA, “Mexico Now Detains…”, 11 jun. 2015. Tudo isso sugere que a violência nos seus países de origem continua a ser o motivo para a partida dessas crianças e que nem mesmo a longa viagem de trem, que é chamado de La Bestia (“A Besta”), ou a polícia mexicana são completos impedimentos.
Estamos testemunhando a formação de uma nova fase aguda no Sudeste Asiático, uma região que por muito tempo tem presenciado a escravidão e o tráfico de refugiados desesperados. Os enormes fluxos de refugiados do pós-guerra do Vietnã, na sua maioria, conseguiram se ajeitar – de boas e más maneiras. Esta nova crise emergente surge de uma combinação diferente de condições; ela não é a continuação daquela crise anterior.
Dois fatos bem recentes sinalizam tendências alarmantes. O primeiro está relacionado às diversas comunidades muçulmanas pequenas que fogem dos despejos de suas terras e da perseguição pelo fato de serem muçulmanas. O caso mais visível é dos Rohingya, a quem o governo de Mianmar/Birmânia faz questão de chamar de Bengali, indicando que eles deveriam “voltar” para Bangladesh, “de onde eles pertencem”, apesar de eles estarem em Mianmar/Birmânia há vários séculos.2323. Eleanor Albert, “The Rohingya Migrant Crisis.” CFR Backgrounders, Council on Foreign Relations, 17 jun. 2015, acesso em 10 jan. 2016, http://www.cfr.org/burmamyanmar/rohingya-migrant-crisis/p36651; e Summer Borwick, Mark Brough, Robert D. Schweitzer, Jane Shakespeare-Finch, and Lyn Vromans, “Well-being of Refugees from Burma: A Salutogenic Perspective,” International Migration 51, no. 5 (2013): 92-105.
Neste artigo irei me focar principalmente nos Rohingya. Há cerca de 1,1 milhão de Rohingya vivendo em Mianmar/Birmânia, onde eles não são reconhecidos como cidadãos. De acordo com o Departamento de Estado dos EUA, desde 2012, pelo menos 160 mil Rohingya foram evacuados para países vizinhos.2424. “Atrocities Prevention Report,” U.S. Department of State, 17 mar. 2016, acesso em 30 mai. 2016, http://www.state.gov/j/drl/rls/254807.htm.
Essa perseguição em curso coincide com a abertura de Mianmar/Birmânia e sua reincorporação à comunidade de estados. Em certo sentido limitado, Mianmar/Birmânia está se tornando uma sociedade mais aberta, como foi amplamente divulgado nos meios de comunicação. Mas a desconfiança de longa data dos Rohingya, uma antiga minoria muçulmana que faz parte de Mianmar/Birmânia há séculos, tornou-se desmedida.
Segundo a minha leitura dos fatos, essa raiva aberta, um tanto súbita, contra os Rohingya está ligada, pelo menos em parte, às enormes apropriações de terras para a mineração e agricultura. A abertura do país e a permissão para que ele receba investidores estrangeiros coincidem com uma violenta perseguição, um tanto súbita, dos Rohingya por um grupo específico de monges budistas. O fato de que estes monges budistas específicos tenham liderado este ataque e, além disso, conduzido a reedição de algumas partes da doutrina budista, de modo a justificar a expulsão dos Rohingya de suas terras e, até mesmo, o assassinato de muçulmanos, aponta para interesses econômicos maiores que, provavelmente, vão muito além dos próprios monges.
Isso poderia sinalizar uma ruptura mais profunda? O fato de que os budistas tenham se tornado brutais perseguidores de uma pequena minoria muçulmana pacífica pode ser apenas um dos diversos indicadores que mostram uma luta pela terra. Esta violência poderia indicar algo sobre a perda do habitat? Há evidências consideráveis em várias áreas do Sudeste Asiático sobre grandes despejos de pequenos agricultores de suas terras para dar lugar à mineração, aos latifúndios de monoculturas e edifícios comerciais.2525. Ver principalmente “Southeast Asia Migrant Crisis,” The Citizen, 29 mai. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://citizen.co.za/afp_feed_article/myanmar-bangladesh-to-address-root-causes-of-migrant-crisis/; Vanessa Gorra and Roel R. Ravanera, Commercial Pressures on Land in Asia: An Overview (Rome: International Land Coalition, 2011); and Internal Displacement Monitoring Center (IDMC), 2015, acesso em 10 jan. 2016, http://www.internal-displacement.org/. Desde que Mianmar/Birmânia abriu sua economia ao investimento externo, as empresas estrangeiras estão entre os principais investidores. A líder oposicionista que foi libertada, Aung San Suu Kyi, perdeu, na verdade, apoio considerável entre a população rural, precisamente porque não questionou essas apropriações de terras (pelo menos publicamente) ou apoiou abertamente os movimentos locais contra às apropriações de terras.
O primeiro reconhecimento público fundamental da situação ocorreu por meio de matérias de imprensa no verão de 2015, as quais versavam sobre um número estimado de sete mil pessoas em dezenas de embarcações sobrecarregadas que navegavam sem rumo por até dois meses no vasto mar de Andamão.2626. Joe Cochrine, “Indonesia and Malaysia Agree to Care for Stranded Migrants.” The New York Times, 20 mai. 2015, acesso em 21 mai. 2016, http://www.bbc.com/news/world-asia-32822508. Este mar é delimitado, a leste, por Mianmar/Birmânia e Tailândia, e, ao sul, pela Malásia e Indonésia. Estes governos e, talvez, outros governos da região estavam cientes deste aumento na evasão de pessoas, mas tinham deixado claro que iriam jogá-las de volta ao mar, caso se atrevessem a desembarcar em seus territórios. Foi a imprensa que soou o alerta sobre estes navios com carga humana empilhada uma sobre a outra, sem acesso a água ou comida. Quando os fatos se tornaram públicos, a Indonésia, principalmente, forçada pela comoção internacional, já que os detalhes horripilantes da situação dos migrantes se tornaram virais, aceitou cerca de metade do total estimado dessas pessoas. A luta para que os países as aceitassem não foi fácil. O resgate delas acrescentou ainda mais informações sobre as condições terríveis a que elas estavam expostas. E este resgate ainda deixou um número estimado de três mil pessoas boiando naquele vasto oceano em embarcações precárias. 2727. Scott Neuman, “Malaysia Orders Navy, Coast Guard to Rescue Rohingyas at Sea.” NPR, 21 mai. 2015, acesso em 21 mai. 2016, http://www.npr.org/sections/thetwo-way/2015/05/21/408457733/malaysia-orders-navy-coast-guard-to-rescue-rohingyas-at-sea.
Estas sete mil pessoas são apenas um componente de uma busca desesperada meramente pela vida por parte de um número crescente de homens, mulheres e crianças. Ainda que esses navios tenham sido trazidos para a terra, outros navios repletos de Rohingya e de cidadãos de Bangladesh foram “‘encontrados na costa da Malásia na quarta-feira’, um ativista e uma autoridade disseram, enquanto a comunidade internacional pedia que os governos do Sudeste Asiático abrissem suas fronteiras e intensificassem as operações de busca e resgate. Acredita-se que milhares de migrantes estejam abandonados no mar”.2828. “Another Boat Found At Sea As Rohingya Refugee Crisis Deepens,” Chicago Tribune, 13 mai. 2015, acesso em 30 mai. 2016, http://www.chicagotribune.com/news/nationworld/ct-rohingya-refugees-20150513-story.html. A Malásia recusou, naquela quarta-feira, ao menos um barco carregado com mais de 800 pessoas, outra carga humana boiando sem rumo no mar de Andamão.
Em 29 de maio de 2015, sob a pressão de organismos internacionais, os governos do Sudeste Asiático decidiram em uma reunião em Bangkok criar uma força-tarefa contra o tráfico e intensificar as operações de busca e resgate para ajudar as “pessoas dos barcos” vulneráveis e abandonadas nos mares da região.2929. Esta reunião foi intitulada Reunião Especial sobre Migração Irregular no Oceano Índico e reuniu dezessete países da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) e do resto da Ásia, além de Estados Unidos, Suíça e organismos internacionais, como o ACNUR, a agência de refugiados da ONU e a Organização Internacional para as Migrações (OIM). Esta foi uma decisão sem precedentes.
A Europa emergiu como o destino de uma ampla gama de novos fluxos de refugiados. O Mediterrâneo tem sido, desde longa data, e continua a ser uma rota crucial para o fluxo de migrantes e refugiados. Neste artigo, só me concentrarei em um conjunto de fluxos novos que começou em 2014 e que precisa ser diferenciado dos fluxos mais antigos em curso, majoritariamente, de migrantes. Atualmente, o Mediterrâneo, especialmente sua porção oriental, é o local onde os refugiados, contrabandistas e a União Europeia (UE) implementam cada qual suas próprias lógicas específicas e conjuntamente produziram uma enorme crise multifacetada. Um aspecto desta crise foi o repentino aumento do número de refugiados no final de 2014, uma conjuntura não prevista pelas autoridades competentes da UE, dado que as guerras das quais essas pessoas estavam fugindo vinham acontecendo há vários anos. O segundo aspecto foi que a crise se tornou uma oportunidade de negócios para contrabandistas que iriam expandir suas atividades no ano seguinte, chegando a ter, em meados de 2015, cerca de 2 bilhões de dólares em receitas que, hoje em dia, estima-se que tenham crescido a 5 bilhões de dólares.3030. Rick Gladstone, “Smugglers Made at Least $5 Billion Last Year in Europe Migrant Crisis.” The New York Times, 17 maio 2016, acesso em 30 maio 2016, http://www.nytimes.com/2016/05/18/world/europe/migrants-refugees-smugglers.html. Um fator fomentador desta situação foi que os contrabandistas se beneficiaram de manter os fluxos operando, convencendo seus potenciais clientes/vítimas de que tudo ficaria bem quando eles chegassem à Europa. O terceiro aspecto foi a grande crise na Itália e, especialmente, na Grécia, dois países já sobrecarregados com suas economias em dificuldades, sendo que, no início de 2016, a Grécia foi o destino para mais de um milhão de solicitantes de refúgio, os quais tinham que ser protegidos, alimentados e ter seus pedidos de refúgio processados.
No entanto, todos estamos familiarizados com as condições no terreno na Síria, no Iraque, no Afeganistão, na Somália, na Eritreia e em outros países. Na realidade, a surpresa deveria ter sido que o surto de refugiados não acontecera antes. O ACNUR, entre outros, vinha registrando os números crescentes de deslocados internos e refugiados.3131. “World at War: UNHCR Global Trends 2014 – Forced Displacement in 2014,” UN High Commissioner for Refugees (UNHCR), 2015, acesso em 9 jan. 2016, http://www.unhcr.org/556725e69.html. Os conflitos no Iraque, no Afeganistão e na Síria não acabariam tão cedo. Tampouco aqueles na Somália ou no Sudão do Sul, cada um com seu caráter específico. A brutalidade destes conflitos, com o completo desrespeito pelo direito internacional humanitário, mostrou que mais cedo ou mais tarde as pessoas começariam a fugir da violência.3232. Ver, por exemplo, James Hampshire, “Europe’s Migration Crisis,” Political Insight 6, no. 3 (2015):8-11; IDMC, 2015; Ibrahim Sirkeci, Deniz Eroglu Utku, and Pinar Yazgan, “Syrian Crisis and Migration,” Migration Letters 12, no. 3 (2015): 181-92.
Por três décadas o Afeganistão foi a origem do maior número de refugiados, segundo o ACNUR: 2,7 milhões de refugiados afegãos estão sob o mandato da agência.3333. “World at War,” UNHCR, 2015. De acordo com o governo afegão, 80% do país não é seguro. Isto se dá porque grupos extremistas, como as filiais locais do Taliban e do Estado Islâmico estão promovendo movimentos insurgentes em diversas províncias. No ano passado, a Síria assumiu o lugar do Afeganistão e, em 2015, um entre quatro refugiados novos ao redor do mundo era sírio. A Síria é um caso extremo. Segundo o ACNUR, 7,7 milhões de sírios deixaram o país em setembro de 2015, mas este número continua crescendo.3434. De acordo com uma reportagem do Washington Post (Karam Alhamad, Vera Mironova, and Sam Whitt, “In Two Charts, This Is What Refugees Say about Why They’re Leaving Syria Now.” Washington Post, 28 set. 2015, acesso em 11 jan. 2016, https://www.washingtonpost.com/news/monkey-cage/wp/2015/09/28/in-two-charts-this-is-what-refugees-say-about-why-they-are-leaving-syria-now/), entre aquelas pessoas que deixaram o país, 57% dos cidadãos comuns relatam que o fizeram simplesmente porque é demasiado perigoso ficar. Outros dão versões mais elaboradas para a mesma razão. Alguns deixaram o país porque o governo Assad ocupou suas cidades (43%) ou destruiu suas casas (32%) ou porque foram ameaçados a sofrer violência, caso não fossem embora (35%). Diversas pessoas deixaram o país a pedido de familiares (48%) e amigos (38%) ou seguindo o exemplo de seus vizinhos (32%). Outras pessoas apontam para os custos cada vez mais elevados para se encontrar até mesmo acesso básico à alimentação e outras necessidades básicas (32%) e outras pessoas foram embora, quando, por fim, ficaram sem dinheiro (16%). O Iraque possui 3,4 milhões refugiados.3535. Ver, por exemplo, Patrick Kingsley, “Refugee Crisis: Apart from Syrians, Who Is Traveling to Europe?” Guardian, 10 set. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.theguardian.com/world/2015/sep/10/refugee-crisis-apart-from-syrians-who-else-is-travelling-to-europe. A situação no país se deteriorou ainda mais quando vastas porções de seu território, incluindo a sua segunda maior cidade, Mosul, foi conquistada pelo Isis; a isso se somam os efeitos desastrosos e as divisões religiosas que se tornaram exacerbadas devido à invasão do país em 2003 promovida pelo Ocidente.3636. Patrick Cockburn, “Refugee Crisis: Where Are All These People Coming from and Why?” Independent, 7 set. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.independent.co.uk/news/world/refugee-crisis-where-are-all-these-people-coming-from-and-why-10490425.html. De acordo com a ONU, mais de 1,2 milhão de paquistaneses foram deslocados por movimentos insurgentes no Noroeste do Paquistão.3737. “2015 UNHCR Country Operations Profile-Pakistan,” UN High Commissioner for Refugees (UNHCR), 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.unhcr.org/pages/49e487016.html.Além disso, o Paquistão tem vivenciado, por diversos anos, uma profunda violência terrorista que não tem fim.3838. Ver “Fatalities in Terrorist Violence in Pakistan, 2003-2016,” South Asia Terrorism Portal, 2016, acesso em 11 jan. 2016, http://www.satp.org/satporgtp/countries/pakistan/database/casualties.htm. A Somália continua a ser o terceiro maior país a engendrar refugiados, com 1,1 milhão deles.3939. “World at War,” UNHCR, 2015.
A crise humanitária está aumentando e se espalhando. De acordo com a Human Rights Watch, ao longo dos últimos dois anos, cerca de vinte e cinco milhões de pessoas foram expulsas de suas casas, incluindo quase doze milhões de sírios; 4,2 milhões de iraquianos; 3,6 milhões de afegãos; 2,2 milhões de somalis; e quase meio milhão de eritreus.4040. “Why do People Risk Their Lives to Cross the Mediterranean?,” Human Rights Watch, 28 jul. 2015, acesso em 21 maio 2016, https://www.hrw.org/news/2015/07/28/why-do-people-risk-their-lives-cross-mediterranean. Eritrea is somewhat different (e.g. “Despite Border Crackdown in Ethiopia, Migrants Still Risk Lives to Leave,” Guardian, 25 ago. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.theguardian.com/global-development/2015/aug/25/despite-border-crackdown-ethiopia-migrants-risk-lives; Patrick Kingsley, “It’s Not at War, but Up to 3% of Its People Have Fled. What Is Going On in Eritrea?” Guardian, 22 jul. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.theguardian.com/world/2015/jul/22/eritrea-migrants-child-soldier-fled-what-is-going; and Vittorio Longhi, “Refugees: Ask the EU to Stop Funding the Eritrean Dictatorship!” Change.org, 2014, acesso em 9 jan. 2016, https://www.change.org/p/free-eritrea-support-democracy-prevent-the-exodus-and-further-deaths-at-sea). A guerra entre 1998 e 2000 com a Etiópia continua sendo um problema, embora ela tenha terminado com o Acordo de Argel em 2001. A Etiópia não reconhece a fronteira demarcada nos termos do acordo e a Eritreia considera parte do território que permanece sob o controle da Etiópia como ocupado ilegalmente. O Estado tem usado essa falta de acordo com a Etiópia para justificar o recrutamento militar em massa de seus cidadãos que, muitas vezes, dura a vida inteira. Isso levou quase um milhão de eritreus a deixarem o país (Ver, por exemplo, Zachary Laub, “Authoritarianism in Eritrea and the Migrant Crisis.” CFR Backgrounder, Council on Foreign Relations, 11 nov. 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.cfr.org/eritrea/authoritarianism-eritrea-migrant-crisis/p37239; e, principalmente, “2015 UNHCR Subregional Operations Profile-East and Horn of Africa,” UN High Commissioner for Refugees (UNHCR), 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.unhcr.org/pages/49e4838e6.html). Ademais, o ACNUR descobriu que também há muito mais crianças desacompanhadas nos últimos fluxos em direção à Europa do que se esperava. A estes fluxos devemos somar meio milhão de pessoas que se encontram à espera, em qualquer período nos últimos dois anos, no Norte da Líbia, de navios que as levem à Europa pelo Mediterrâneo. De acordo com o ACNUR, na atualidade,4141. “Facts and Figures about Refugees,” UN High Commissioner for Refugees (UNHCR), 2015, acesso em 11 jan. 2016, http://www.unhcr.ie/about-unhcr/facts-and-figures-about-refugees. o número de refugiados internacionais é maior do que sessenta milhões, com algumas estimativas preliminares chegando a oitenta milhões no início de 2016. Este é o maior número de refugiados desde que o sistema humanitário entrou em operação. Muitos dos deslocados internos e o crescente número de refugiados não declarados ou ainda não computados estão fora deste cálculo. Este pode ser o caso de algumas das pessoas cruzando o Mediterrâneo.
Há várias histórias em curso nos fluxos para a Europa. E, no entanto, quando consideradas em conjunto, há uma lógica nítida que emerge: a expulsão. E esta lógica de expulsão está, sob qualquer análise, se expandindo. A guerra civil no Iêmen, que começou em 2015, a retomada da guerra civil entre turcos e curdos em julho de 2015 (uma guerra que já matou quarenta mil pessoas desde 1984) e a ascensão do Boko Haram, grupo extremista islâmico que trava uma feroz guerra no Norte da Nigéria e Chade.4242. “Southeast Asia Migrant Crisis,” The Citizen, 2015; Monica Mark, “Boko Haram’s ‘Deadliest Massacre’: 2,000 Feared Dead in Nigeria.” Guardian, 10 jan. 2015, acesso em 13 jan. 2016, http://www.theguardian.com/world/2015/jan/09/boko-haram-deadliest-massacre-baga-nigeria. Também é significativo o colapso da ordem política e econômica na Líbia, que produziu um enorme vácuo de segurança. E a apropriação de terras na África Subsaariana está gerando toda uma nova política de alimentos,4343. Ver e.g. Ruth Hall, “Land Grabbing in Africa and the New Politics of Food.” Future Agricultures, Policy Brief 41, jun. de 2011, acesso em 13 abr. 2016, http://www.future-agricultures.org/publications/research-and-analysis/1427-land-grabbing-in-africa-and-the-new-politics-of-food/file; and Sassen, Expulsions, 2014, capítulo 2. com os números de despossuídos crescendo de maneira rápida. Essas circunstâncias representam enormes desafios para os sistemas internacional e europeu.
Os fluxos que descrevi são, principalmente, fluxos de refugiados, ainda que não sejam reconhecidos formalmente pelo sistema internacional. Eles devem ser distinguidos das 250 milhões de pessoas, além dos migrantes regulares no mundo de hoje, que são principalmente de classe média baixa e, cada vez mais, profissionais de alto nível operando na economia global. Os imigrantes da atualidade não são os mais pobres em seus países de origem. Tampouco são originados pelos fatores de pressão extrema que fomentam os três tipos de fluxos descritos aqui. Por sua vez, estes refugiados também não são geralmente os mais pobres em seus países, ainda que ter deixado os seus países de origem os tenha deixado sem recursos; muitos deles têm altos níveis educacionais e começaram com recursos.
Estes novos refugiados são uma parcela de uma população mais ampla de pessoas deslocadas cujo número está se aproximando de oitenta milhões. Eles se destacam por suas cifras de rápido crescimento e pelas condições extremas das áreas de onde são originários. As violentas zonas de guerra, como Síria e Iraque, e a enorme destruição das economias locais são dois fatores principais que explicam esse aumento. As mudanças climáticas poderão ter grandes efeitos em algumas dessas regiões, devido ao que pode ser descrito como má gestão do desenvolvimento – tais como as políticas do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial de 1980 e 1990 que tiveram consequências desastrosas para muitas das economias locais e sociedades no Sul Global. Tudo isso contribui para uma enorme perda de habitat e, dessa forma, as migrações serão uma forma de sobrevivência.