Ensaios

Direito à Terra como Direito Humano

Jérémie Gilbert

Argumentos em prol de um Direito Específico à Terra

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RESUMO

O direito à terra tem atraído certa atenção como uma questão relacionada ao direito à propriedade e tem sido considerado um direito especificamente importante dos povos indígenas e das mulheres, mas o direito à terra está ausente dos instrumentos internacionais de direitos humanos. Este artigo analisa como o direito à terra tem sido abordado desde cinco ângulos diferentes na legislação internacional dos direitos humanos: como uma questão de direito à propriedade, como direito especificamente importante para os povos indígenas; como um aspecto da igualdade de gênero, como um slogan na campanha contra o acesso desigual à alimentos e moradia. Ao analisar estas diferentes abordagens, o artigo propõe identificar o lugar do direito à terra nos instrumentos e jurisprudência internacional de direitos humanos assim como analisar por que não tem sido – e se deveria ser – incluído como direito especifico e independente. 

Palavras-Chave

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1.  Introdução: por que direito à terra?

Em geral o direito à terra não é visto como uma questão de direitos humanos. De maneira ampla, ele engloba o direito a usufruir, controlar e transferir uma porção de terra. Ele inclui direito a: ocupar, desfrutar e utilizar a terra e seus recursos; limitar ou excluir o acesso de outros à terra; transferir, vender, comprar, doar ou emprestar; herdar e legar; desenvolver a terra ou realizar benfeitorias; alugar ou sublocar; e beneficiar-se da valorização da terra ou de seu aluguel (FOOD AND AGRICULTURAL ORGANISATION OF THE UNITED NATIONS, 2002). Do ponto de vista jurídico, o direito à terra, via de regra é visto no âmbito do direito agrário, dos contratos sobre posse de terra, ou das normas de planejamento, mas raramente é associado a normas de direitos humanos. No âmbito internacional, nenhum tratado ou declaração prevê especificamente um direito à terra. Estritamente falando, não há um direito humano à terra perante o direito internacional.

No entanto, por trás dessa fachada, o direito à terra é uma questão central de direitos humanos. Ele constitui a base para o acesso a alimentação, moradia e desenvolvimento, e, sem acesso à terra, muitas pessoas são colocadas em situação de grave insegurança econômica.

Em diversos países, acesso e direito à terra são, muitas vezes, estratificados e baseados em um sistema hierárquico e segregado no qual os mais pobres e menos escolarizados carecem de segurança na posse da terra. Historicamente, o controle sobre o direito à terra tem servido de instrumento de opressão e colonização. Um dos exemplos mais ilustrativos desse aspecto é oapartheid na África do Sul, onde o direito à terra serviu como instrumento chave do regime. Embora sejam um exemplo menos extremo, os vários movimentos sociais de camponeses sem terra, em toda a América Latina e Central, também representam uma reação ao controle sobre as terras por elites ricas e poderosas.

Nos piores cenários, a estratificação no acesso à terra tem alimentado conflitos violentos. A situação nos Territórios Ocupados da Palestina e Israel é um claro exemplo do uso do direito à terra como forma de opressão (HUSSEIN; MCKAY, 2003). Todavia essa não é uma situação peculiar ao Oriente Médio, uma vez que o controle da terra, na maioria das situações de conflito, constitui um elemento nevrálgico do próprio conflito (DAUDELIN, 2003).

Acesso, redistribuição e garantias de direito à terra são também elementos críticos em situações pós-conflito (LECKIE, 2008). Redistribuição de terra continua a ser uma questão controversa em países que passaram recentemente por sérios conflitos, tais como Colômbia, Bangladesh, ou Timor Leste. Nesses cenários pós-conflito, a questão da restituição da terra é um fator que, caso não seja adequadamente enfrentado, pode desencadear novamente violência.

Além de situações de violência e conflito, regulamentos e políticas sobre o direito à terra constituem frequentemente o cerne de qualquer reforma econômica e social ampla. Assim, o direito à terra desempenha um papel catalisador no crescimento econômico, no desenvolvimento social e na redução da pobreza (INTERNATIONAL LAND COALITION, 2003). Dados recentes indicam que cerca de 50% da população rural no mundo não desfruta de direitos de propriedade da terra de maneira segura, e estima-se que até um quarto da população mundial seja de sem-terra, o que faz com que tanto a insegurança da titularidade da terra quanto a falta de acesso constituam fatores claros de pobreza (UNITED NATIONS HUMAN SETTLEMENTS PROGRAMME, 2008).

Nas últimas décadas, diversos países adotaram reformas agrárias drásticas para lidar com questões como pobreza, equidade, restituição por expropriações passadas, investimento, inovação no setor agrícola e sustentabilidade. Há uma grande valorização de terras aráveis, dado o interesse cada vez maior de investidores, mudanças em sistemas de produção agrícola, crescimento populacional, migração e mudança ambiental. Isso inclui grandes investimentos agrícolas estrangeiros em países em desenvolvimento, denominados grilagens de terra. E tem gerado novas questões sobre o respeito ao direito à terra de comunidades locais, por privá-las de terras essenciais para que possam prover seu próprio sustento. O recente foco em medidas de combate a mudanças climáticas, que impulsionam a compra de grandes extensões de terra para plantação de óleo de palma ou outras fontes de biocombustível, tem criado, de maneira semelhante, um modelo de aquisição de terra para ganhos econômicos em detrimento de populações locais, as quais têm perdido suas terras para investidores internacionais.

Em contrapartida, esse fenômeno gerou diversos movimentos que pleiteiam o reconhecimento e a afirmação de um direito fundamental à terra. A reinvindicação de que o direito à terra constitui um direito humano tem sido uma constante em movimentos na Índia, na África do Sul, no Brasil, no México, na Malásia, na Indonésia, nas Filipinas, e em muitos outros países ao redor do mundo. Para tais movimentos, defender esse direito é uma forma de incentivar a proteção e promoção de uma reinvindicação social chave: o reconhecimento de que a população local de fato tem direito a usar, possuir e controlar suas próprias terras. Os direitos referentes à terra não dizem respeito somente aos direitos individuais de propriedade, mas também estão no cerne da justiça social.

Apesar de ser uma questão tão central para a justiça social e a igualdade, o direito à terra é praticamente inexistente na linguagem de direitos humanos. Há várias demandas por seu reconhecimento no âmbito da legislação internacional de direitos humanos (PLANT, 1993). No entanto, apesar dessas iniciativas, nenhum tratado tem reconhecido o direito à terra como uma questão central de direitos humanos. Entre os nove principais tratados internacionais de direitos humanos, o direito à terra é apenas superficialmente mencionado uma única vez, no contexto dos direitos das mulheres em zonas rurais.1 Não obstante, apesar da ausência de uma referência clara nos principais instrumentos internacionais de direitos, tem havido um foco maior na jurisprudência internacional sobre o direito à terra como uma questão de direitos humanos.

Este artigo analisa como o direito à terra tem sido abordado na esfera internacional, apesar de não ter sido formalmente reconhecido pelos principais instrumentos de direitos humanos. Para tanto, sustenta-se que o direito à terra tem sido abordado, no âmbito da legislação internacional de direitos humanos, a partir de cinco ângulos distintos. Como será analisado a seguir, reinvindicações relativas ao direito à terra têm emergido no contexto do direito à propriedade (Seção 1); como um importante direito específico de povos indígenas (Seção 2), como um aspecto da igualdade de gênero (Seção 3); e como um slogan na campanha contra a desigualdade no acesso à alimentação e à moradia (Seções 4 e 5). Ao analisar essas três abordagens, este artigo propõe não apenas identificar o lugar do direito à terra no marco internacional de direitos humanos, mas também revisar por que ainda não tem sido, e se deveria ser incluído em tais instrumentos como um direito à terra especifico e independente (conclusão).

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2.  Direito à terra como direito à propriedade: protegendo o “proprietário”?

Em geral, propriedade diz respeito à posse de alguma coisa ou coisas, mas essa palavra frequentemente é associada à propriedade da terra. O direito à propriedade é um denominador comum da maioria dos sistemas jurídicos do mundo, nos quais esse direito é comumente qualificado como uma das liberdades individuais fundamentais. A maioria das constituições tem uma sólida garantia deste direito (ALLEN, 2007), que tem desempenhado um papel vital no desenvolvimento de normas e valores humanos.

Historicamente, a garantia dos direitos de propriedade sobre a terra foi o fator capaz de impulsionar o avanço de um sistema emergente de direitos humanos. É comum verificar que direitos de propriedade constituem um elemento central, em muitas democracias liberais ocidentais, do reconhecimento de liberdades individuais contra autoridades públicas (WALDRON, 1988). Tanto a Carta de Direitos, nos EUA, quanto a Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, ambas do século XVIII, protegem com a mesma intensidade o direito à propriedade e o direito à vida. Nesse contexto, propriedade privada significa a proteção, garantia e segurança da posse de proprietários de terra, dado que apenas aqueles que possuem o título oficial da terra estariam protegidos. Historicamente, apenas proprietários de terra ricos e poderosos poderiam obter esse título.

A partir dessa perspectiva histórica, por tanto, o direito à propriedade da terra poderia ser vista como um direito deveras conservador, uma vez que protege os direitos de proprietários. Em outras palavras, o direito à propriedade aplica-se apenas a propriedades existentes e, portanto, não trata do direito de adquirir a propriedade da terra. A primazia dos direitos de propriedade, em algumas das primeiras declarações de direitos humanos, no século XVIII, ou até mesmo em documentos anteriores, é explicada pelo anseio dos proprietários de proteger seus direitos de propriedade contra o poder monárquico. A propriedade da terra era vista, portanto, como um dos elementos centrais da liberdade contra o arbítrio governamental.

As raízes ocidentais do direito à propriedade têm exercido grande influência sobre a forma pela qual este mesmo direito tem sido formulado na legislação internacional de direitos humanos. A sua importância está refletida no atual sistema internacional de proteção de direitos humanos, onde o direito à propriedade é, ao mesmo tempo, um dos princípios por excelência do sistema e um tema bastante controverso. O artigo 17 da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) estabelece que:

1. Toda pessoa tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.

2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.
(UNITED NATIONS, 1948, art. 17)

A inclusão desse direito na DUDH foi polêmica e seu processo de conformação deu ensejo a sérios debates e negociações. Vale ressaltar que a polêmica versou sobre se existia a necessidade da inclusão desse artigo e, ainda, sobre em que medida limitações ao direito à propriedade poderiam ser impostas por legislações nacionais (CASSIN, 1972). Embora a questão específica da propriedade da terra não tenha sido foco dessa discussão, o conflito entre duas abordagens da questão da propriedade – uma individual e outra mais social e coletiva –, marcaria mais adiante o debate sobre direito à terra. Os dois Pactos Internacionais, adotados em 1966, não mencionam o direito à propriedade, o que faz com que este seja o único direito humano reconhecido na DUDH que não foi incorporado a nenhum desses Pactos juridicamente vinculantes. Há diversos argumentos que buscam explicar a ausência do direito à propriedade pelos dois Pactos, em especial divergências entre os blocos ocidentais e orientais, o que tornou a definição de um direito à propriedade uma questão deveras complexa e ideologicamente controversa (SCHABAS, 1991).

Além desses debates, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (ICERD, sigla original), aprovada em 1965, estabelece um compromisso geral dos Estados Partes de eliminar a discriminação racial e garantir “direito, tanto individualmente como em conjunto, à propriedade” (UNITED NATIONS, 1965, art. 5, v).

O direito à propriedade também foi visto como uma questão importante na luta para eliminar a discriminação contra as mulheres. A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW, sigla original), afirma em seu artigo 16 que os Estados devem assegurar “os mesmos direitos a ambos os cônjuges em matéria de propriedade, aquisição, gestão, administração, gozo e disposição da propriedade, tanto a título gratuito quanto oneroso” (UNITED NATIONS, 1979, art. 16).

Apesar dessas referências ao direito à propriedade, os principais tratados internacionais de direitos humanos não fazem menção específica a ele. Ademais, quando o direito à propriedade e incorporado à legislação internacional de direitos humanos, isso se dá principalmente no contexto da não discriminação (como é o caso da ICERD e CEDAW). Em última análise, o direito à propriedade recebe forte reconhecimento apenas pela DUDH, e o elo desse direito com o direito à terra permanece tênue, uma vez que essa correlação fora inicialmente concebida.

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3.  Direitos à terra como direitos culturais: povos indígenas

Habitantes dos mais diversos e, muitas vezes, remotos lugares do mundo, desde o Ártico congelado até as florestas tropicais, os povos indígenas têm se queixado de que sua cultura desaparecerá sem uma forte proteção ao seu direito à terra. Embora as comunidades indígenas sejam mais diversas, a maior parte das culturas indígenas compartilha um elo profundo entre identidade cultural e terra. Muitas das comunidades indígenas, como será apresentado adiante, têm enfatizado que seus territórios e terras não servem apenas de base para seu sustento econômico, mas também constituem fonte de sua identidade espiritual, cultural e social.

O elo entre direitos culturais e direito à terra foi reconhecido pelo Comitê de Direitos Humanos (CDH) em sua interpretação do artigo 27 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP). Esse artigo, não faz alusão ao direito à terra, per se, mas faz uma ênfase entre a conexão entre os direitos culturais e direito à terra, mas o CDH concedeu uma proteção específica ao direito à terra de povos indígenas, ao enfatizar o elo entre direitos culturais e direito à terra. Essa proteção baseia-se no fato de que comunidades indígenas associam o seu modo de vida específico ao uso de suas terras. Em um comentário geral a respeito do artigo 27, muitas vezes citado, o CDH afirmou que:

No que diz respeito ao gozo dos direitos culturais protegidos pelo artigo 27, o Comitê nota que a cultura se manifesta sob várias formas, inclusive no que diz respeito a um modo de vida especificamente relacionado ao uso de recursos associados à terra, em especial no caso de povos indígenas. Esse direito pode incluir atividades tradicionais, tais como pesca ou caça, e o direito a viver em reservas protegidas por lei.
(UNITED NATIONS, 1994)

No que diz respeito aos povos indígenas, a relação entre proteção da cultura e direito à terra tem sido reiterada em muitas das observações finais sobre relatórios periódicos, apresentados por Estados Partes, e em comunicações individuais (SCHEININ, 2000). A perspectiva é de que, nos casos em que a terra possui um significado vital para preservar uma cultura, o direito a desfrutar de determinada cultura requer que a terra seja protegida.

Essa abordagem constitui o cerne da jurisprudência recente da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). No caso da comunidade Awas Tingni contra a Nicarágua, decidido em 2001, a Corte declarou:

Grupos indígenas, pelo simples fato de sua própria existência, possuem o direito a viver livremente em seu próprio território; os laços estreitos entre os povos indígenas e a terra devem ser reconhecidos e compreendidos como um dos fundamentos de suas culturas, sua vida espiritual, integridade e sobrevivência econômica. Para comunidades indígenas, as relações que mantêm com a terra não constituem apenas uma questão de posse e produção, mas sim um elemento material e espiritual do qual elas devem desfrutar em sua plenitude, até mesmo para preservar seu legado cultural e transmiti-lo para gerações futuras.
(INTER-AMERICAN COURT OF HUMAN RIGHTS, 2001, par. 149)

Desde então, a Corte IDH desenvolveu uma jurisprudência mais abrangente sobre direito à terra, integrando-o aos direitos à propriedade, à vida e à saúde (ANAYA; WILLIAMS, 2001). Essa abordagem do direito à terra é muitas vezes referida como um direito à integridade cultural que, embora não seja expressamente reconhecido como tal em tratados internacionais de direitos humanos, diz respeito a um conjunto de diferentes direitos humanos, como direito à cultura, subsistência, meios de subsistência, religião e herança, sendo que todos eles endossam a proteção ao direito à terra.

Essa referência à integridade cultural remete a alguns aspectos da recente decisão da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (ACHPR, sigla original) no caso relativo à comunidade Endorois, no Quênia. Esse caso diz respeito ao deslocamento forçado da comunidade Endorois de sua terra ancestral, no coração do Grande Vale do Rift, para dar lugar à criação de uma reserva de vida selvagem, reduzindo uma comunidade tradicional de pastores de gado à pobreza e levando-os à beira da extinção cultural. A comunidade indígena afirmou que o acesso ao seu território ancestral “além de garantir a subsistência e a sobrevivência, é visto como sagrado, estando intrinsecamente relacionado com a integridade cultural da comunidade e seu modo de vida tradicional” (AFRICAN COMMISSION ON HUMAN AND PEOPLES RIGHTS, 2010, par. 16). Em sua decisão, a Comissão Africana concordou com o pedido referente à identidade cultural, reconhecendo que a remoção da comunidade indígena de sua terra ancestral constituiu uma violação do seu direito à integridade cultural com base na liberdade de religião (artigo 8), no direito à cultura (artigo 17), e no acesso aos recursos naturais (artigo 21) presentes na Carta Africana.

O surgimento do direito dos povos indígenas à integridade cultural aponta para o estabelecimento de um elo mais claro entre acesso aos territórios ancestrais e liberdade de religião, direitos culturais e direito de acesso aos recursos naturais. Embora o direito à terra não seja reconhecido como tal, tanto na Convenção Americana quanto na Carta Africana, organismos regionais de direitos humanos têm reconhecido a proteção dos direitos à terra como uma questão de direitos humanos crucial para povos indígenas, parte de um pacote mais amplo de direitos, o qual inclui o direito à propriedade, os direitos culturais e os direitos sociais. Essa abordagem é um dos reconhecimentos mais sólidos do direito à terra como direito humano.

Paralelamente, outra evolução normativa, que culminou com a adoção da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, em 2007, expandiu o desenvolvimento dessa jurisprudência sobre o tema. A Declaração dedica vários de seus artigos ao direito à terra, tornando-o uma questão fundamental de direitos humanos para povos indígenas (GILBERT; DOYLE, 2011). O artigo 25 da Declaração afirma que:

Povos indígenas têm o direito de manter e de fortalecer sua própria relação espiritual com as terras, territórios, águas, mares costeiros e outros recursos que tradicionalmente possuam ou ocupem e utilizem, e de assumir as responsabilidades que a esse respeito incorrem em relação às gerações futuras.
(UNITED NATIONS, 2007, art. 25).

Embora a Declaração não seja um tratado, os direitos articulados nesse documento são um reflexo do direito internacional contemporâneo no que diz respeito aos povos indígenas, pois indicam um claro reconhecimento internacional da importância de uma perspectiva fundada em direitos humanos para povos indígenas.

A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre os Direitos de Povos Indígenas e Tribais também adota uma perspectiva de direitos humanos em relação ao direito à terra. Importante ressaltar que afirma que, ao aplicar seus dispositivos:

Os governos deverão respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a sua relação com as terras ou territórios, ou com ambos, segundo o caso, que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação.
(INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION, 1989, art. 13).

Embora se possa argumentar que apenas um número relativamente pequeno de Estados faz parte da Convenção, esses Estados são, todavia, aqueles onde há o maior número de populações indígenas. Além disso, porque mais e mais Estados têm ratificado esse documento, a Convenção tornou-se um instrumento jurídico importante no que diz respeito ao direito à terra por parte de povos indígenas.

De modo geral, a partir de uma perspectiva mais ampla, fundada em uma abordagem de direitos humanos, reconhecer o direito à terra como uma questão fundamental de direitos humanos revela que uma perspectiva tradicionalmente individualista de direito à propriedade pode ser contestada e que tal perspectiva individualista não permite compreender suficientemente a questão dos povos indígenas, uma vez que não integra o específico elo cultural que esses povos atribuem a seus territórios tradicionais.

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4.  Direito à terra como uma questão de igualdade de gênero

O direito à terra tem sido reconhecido como uma questão central na igualdade de gênero. Muitas vezes, o direito da mulher à terra depende de seu estado civil, o que condiciona a segurança da posse da terra ao seu relacionamento conjugal. Sob legislações nacionais que regulam os direitos de propriedade dentro do ambiente familiar, o direito à terra limita-se muitas vezes aos homens, na condição de líderes da família, detentores exclusivos dos direitos de administração da propriedade familiar. Conforme ressaltado em um relatório do antigo Relator Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Moradia Adequada:

Em quase todos os países, sejam eles ‘desenvolvidos’ ou ‘em desenvolvimento’, a segurança jurídica da posse no caso das mulheres depende quase exclusivamente dos homens com os quais elas mantêm um relacionamento. Mulheres líderes de uma família e mesmo mulheres em geral desfrutam de segurança na posse consideravelmente menor do que homens. Um número extremamente limitado de mulheres possui a titularidade da terra. Uma mulher divorciada ou separada sem terra e sem uma família para cuidar, muitas vezes acaba em um barraco em áreas urbanas, onde sua segurança de posse é, quando muito, questionável.
(UNITED NATIONS, 2003, p. 9)

Com seu foco em ‘mulheres rurais’, o artigo 14 da CEDAW faz menção específica ao direito à terra. Ao convidar os Estados Partes a tomar todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra as mulheres em áreas rurais, o artigo 14 apela aos Estados para garantir que as mulheres “tenham acesso aos créditos e empréstimos agrícolas, aos serviços de comercialização e às tecnologias apropriadas, e igual tratamento nos projetos de reforma agrária e de reassentamento de terra” (FOOD AND AGRICULTURAL ORGANISATION OF THE UNITED NATIONS. 1979). Conforme destacado anteriormente, esse artigo é a única menção específica ao direito à terra entre os nove principais tratados internacionais de direitos humanos. No entanto, a referência ao direito à terra continua sendo marginal, uma vez que o objetivo principal do artigo é o de assegurar que as mulheres não sejam discriminadas em programas de reforma agrária. Esse dispositivo não demanda uma reforma geral de leis fundiárias desiguais.

Já o artigo 16, com foco na eliminação da discriminação no ambiente familiar, convida os Estados Partes a tomar todas as medidas necessárias para assegurar que ambos os cônjuges tenham direitos iguais na “posse, aquisição, gestão, administração, gozo e disposição da propriedade” (FOOD AND AGRICULTURAL ORGANISATION OF THE UNITED NATIONS. 1979). Embora não mencione diretamente o direito à terra, a referência a aquisição e propriedade pode ser vista como um fator implicitamente relevante para propriedade de terras. O Comitê para Eliminação da Discriminação contra a Mulher (daqui em diante, “Comitê CEDAW”) destacou especificamente tal relação em sua Recomendação Geral Nº 21, intitulada “Igualdade no casamento e relações familiares”, com foco principal no artigo 16. A Recomendação estabelece que:

Em países que estejam implementando um programa de reforma agrária ou redistribuição de terras entre grupos de diferentes origens étnicas, deve ser cuidadosamente respeitado o direito de mulheres, independentemente de seu estado civil, de usufruir dessas terras redistribuídas em termos iguais em relação aos homens.
(UNITED NATIONS, 1994, par. 27).

Apesar da referência ao direito à terra tanto no artigo 14 (explicitamente) como no 16 (implicitamente), é evidente que o direito à terra continua a ocupar uma posição secundária no texto da Convenção. Apesar disso, o Comitê CEDAW tem adotado uma abordagem que favorece o direito à terra para mulheres. Particularmente em suas observações finais, o Comitê tem demostrado a centralidade do direito à terra para a implementação dos direitos humanos das mulheres, uma vez que ele figura em quase todas as observações finais emitidas pelo Comitê. Analisando algumas das observações finais recentes do Comitê podem ser identificadas questões-chave quando se trata do direito à terra para mulheres. Um dos focos é a garantia de não discriminação no acesso à terra tanto nos sistemas jurídicos consuetudinários quanto nos formais. Em suas recentes conclusões finais sobre o Zimbábue, por exemplo, o Comitê expressou sua preocupação quanto “à perpetuação de costumes e práticas tradicionais discriminatórias, o que impede em especial que mulheres em áreas rurais possam herdar ou adquirir terras ou outros bens” (UNITED NATIONS, 2012, para. 35).

Isso não é específico da situação do Zimbábue: o Comitê já fez comentários semelhantes aos relatórios recentes da Jordânia, do Chade e da República do Congo. Em todas essas ocasiões, o Comité salientou que os governos têm a obrigação positiva de garantir que os sistemas jurídicos informais e práticas familiares não discriminem as mulheres no acesso ao direito à terra. O Comitê também identificou desigualdade de fato nos sistemas formais de registro de terras, que concedem algum tipo de reconhecimento aos sistemas consuetudinários, e endossam direta ou indiretamente práticas que favorecem os homens e colocam as mulheres em posição de desvantagem, por perpetuarem regimes de posse que tenham como pressuposto unidades familiares e comunitárias.

Outro tema recorrente nas conclusões finais do Comitê CEDAW é a estreita relação entre acesso ao direito à terra e elementos necessários para sobrevivência, como alimentação e água. Por exemplo, no caso do Nepal, o Comitê convocou o governo a “assegurar às mulheres acesso em condições iguais a recursos e alimentação rica em nutrientes, pondo fim a práticas discriminatórias, assegurando às mulheres o direito de adquirir terras e facilitando o acesso de mulheres à água potável segura e a combustível” (UNITED NATIONS, 2011, para. 38). As mulheres, especialmente aquelas em comunidades rurais, têm muitas vezes indicado como o direito à terra deve ser visto como fundamental para o acesso à água, à alimentação e à saúde, e como tais direitos relativos à terra são centrais não somente para a sua sobrevivência, mas também para a sobrevivência de seus filhos e famílias. O trabalho do Comitê exemplifica como o direito à terra e a segurança na posse da terra para as mulheres constituem peças chave para melhores condições de vida e para o empoderamento econômico das mulheres.

A relação entre acesso aos meios de subsistência e o direito à terra também encontra respaldo no Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os Direitos das Mulheres na África, adotado em 2003. O Protocolo faz duas menções ao direito à terra como direitos das mulheres. A primeira referência diz respeito ao acesso à alimentação adequada. O artigo 15 do Protocolo declara que:

Os Estados-Partes devem garantir às mulheres o direito ao acesso a uma alimentação sadia e adequada. Neste sentido, devem adotar medidas apropriadas para assegurar às mulheres o acesso à água potável, às fontes de energia doméstica, à terra e aos meios de produção alimentar.
(AFRICAN COMISSION ON HUMAN AND PEOPLES’ RIGHTS, 2003, para. a).

A segunda menção se dá no contexto do direito a um desenvolvimento sustentável. O artigo 19, dedicado ao direito das mulheres a gozar plenamente do seu direito ao desenvolvimento sustentável, convida Estados a “promover o acesso e a posse pela mulher dos recursos produtivos, tais como a terra, e garantir o seu direito à propriedade” (AFRICAN COMISSION ON HUMAN AND PEOPLES’ RIGHTS, 2003, par. c). A abordagem dos direitos das mulheres ao direito à terra associa o acesso à terra não apenas à não discriminação, mas sim à redução da pobreza e ao empoderamento econômico. Como apontado por um relatório recente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Índia:

Terra, além de ser um recurso produtivo, também propicia um elevado grau de segurança e estabilidade socioeconômica. O controle e propriedade da terra por mulheres, ademais, serve como uma forma de empoderamento e ajuda a equilibrar dinâmicas de gênero, em especial em sociedades historicamente patriarcais
(KOTHARI; KARMALI; CHAUDHRY, 2006, p. 28).

Isso se reflete no trabalho de instituições internacionais e em organizações não-governamentais que têm cada vez mais concentrado seu trabalho no direito à terra como parte de suas estratégias de redução da pobreza e de empoderamento da mulher  (BUDLENDER; ALMA, 2011).

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5.  Direito à terra como direito à moradia

O direito à moradia está inscrito em diversos instrumentos internacionais fundamentais de direitos humanos. Entre eles, pode-se citar o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) (artigo 11, par. 1o), a Convenção sobre os Direitos da Criança (artigo 27, par. 3) e as cláusulas de não discriminação previstas no artigo 14, par. 2 (h) da CEDAW e artigo 5o (e) da ICERD. O artigo 25 da DUDH inclui o direito à moradia como parte do direito mais amplo a um padrão adequado de vida. Portanto, o direito à moradia é, muitas vezes, qualificado como um direito a uma moradia adequada.

O Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (daqui em diante, CDESC) tem dedicado grande parte do seu trabalho ao direito à moradia adequada. No seu Comentário Geral nº 4 sobre a questão, o CDESC destacou que “embora a adequação da moradia seja determinada, em parte, por fatores sociais, econômicos, culturais, climáticos, ecológicos e outros” (UNITED NATIONS, 1991, par. 8), há alguns fatores universais fundamentais para especificar o conteúdo desse direito. O Comitê identificou sete fatores recorrentes, sendo o primeiro deles a segurança jurídica da posse.2 Embora a segurança da posse assuma uma variedade de formas, incluindo locação (pública e privada), moradia conjunta, arrendamento, moradia própria, moradia emergencial, e assentamentos informais, esse termo também se refere à segurança de direitos sobre terras.

Vale notar que o Comitê tem concentrado seu trabalho na situação de pessoas sem terra, com destaque para a forma pela qual a falta de acesso à terra colide fundamentalmente com a implementação do direito à moradia adequada. O CDESC observou que “obrigações governamentais claras precisam ser definidas com o objetivo de fundamentar o direito de todos a um lugar seguro para viver em paz e com dignidade, incluindo o acesso à terra como um direito” (UNITED NATIONS, 1991, para. 8 (e)). O Comitê acrescentou ainda que “(e)m muitos Estados Partes, um aumento do acesso à terra por pessoas dela desprovidas ou por segmentos empobrecidos da sociedade deveria constituir um objetivo político central” (UNITED NATIONS, 1991, para. 8 (e)). Essa perspectiva destaca de que maneira a efetivação do direito à moradia adequada necessariamente implica, por parte dos governos, assegurar tanto o acesso à terra quanto a segurança da posse das pessoas sem-terra.

O foco na segurança da posse e no acesso à terra, como um dos principais componentes do direito à moradia adequada, também constitui um aspecto central no trabalho do Relator Especial da ONU sobre Moradia Adequada. O antigo Relator Especial da ONU, Miloon Kothari, tem enfatizado a importância de se reconhecer a centralidade do direito à terra para o direito à moradia. O Relator Especial identificou uma lacuna normativa referente ao direito à terra nos instrumentos de legislação internacional de direitos humanos na relação com a proteção do direito à moradia adequada. Conforme destacado em seu relatório, em 2007:

Ao longo de seu trabalho, o Relator Especial buscou identificar elementos que positiva ou negativamente afetam a implementação do direito à moradia adequada. Terra como um direito é, muitas vezes, um elemento vital necessário para compreender o grau de violação e o nível de implementação do direito à moradia adequada
(UNITED NATIONS, 2007b, para. 25).

O Relator Especial solicitou que o Conselho de Direitos Humanos reconheça o direito à terra como um direito humano e reforce a proteção deste na legislação internacional de direitos humanos.

O elo entre moradia e direito à terra ocupa um espaço particularmente central no trabalho do Relator Especial, no contexto dos direitos das mulheres à moradia. Após uma resolução adotada pela antiga Comissão de Direitos Humanos, ele realizou um estudo mais amplo sobre o direito das mulheres à propriedade e à moradia adequada. Uma das conclusões centrais do relatório foi que a falta de reconhecimento do direito das mulheres à terra afeta diretamente seu direito à moradia adequada. Ademais, o Relator Especial destacou uma estreita ligação entre violência contra a mulher e o direito à moradia adequada, e como o reconhecimento do direito à terra para as mulheres pode, ao menos potencialmente, desempenhar um papel positivo na luta contra a violência doméstica.

Moradia e direito à terra também estão interligados na abordagem dos direitos humanos à questão da remoção forçada. O Comentário Geral no 7 do Comitê sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais define remoção forçada como:

a retirada definitiva ou temporária de indivíduos, famílias ou comunidades, contra a sua vontade, das casas ou da terra que ocupam, sem que estejam disponíveis ou acessíveis formas adequadas de proteção de seus direitos por vias legais ou outras.
(UNITED NATIONS, 1997, para. 3).

Remoções forçadas estão, muitas vezes, relacionadas à falta de segurança jurídica da posse, o que constitui um componente essencial do direito à moradia adequada. Remoções forçadas constituem prima facie violações do direito humano à moradia adequada. Tanto as Diretrizes Abrangentes da ONU sobre Deslocamento relacionado a Projetos de Desenvolvimento quanto os Princípios e Diretrizes Básicos sobre Remoções e Deslocamento relacionados a Projetos de Desenvolvimento adotam uma definição semelhante de remoção forçada, o que inclui a perda das terras.

A relação ente remoção forçada e violação do direito à terra desempenhou um papel importante na decisão da ACHPR no caso da comunidade Endorois contra o Quênia. A Comissão destacou como o não reconhecimento e o desrespeito ao direito à terra da comunidade indígena levou à sua remoção forçada, violando o artigo 14 da Carta Africana (AFRICAN COMMISSION ON HUMAN AND PEOPLES RIGHTS, 2010, para. 200). Para chegar a essa decisão, a Comissão fez referência direta aos parâmetros estabelecidos pelo CDESC em seu Comentário Geral no 4 sobre direito à moradia e no Comentário Geral no 7 sobre remoções e direito à moradia, destacando, em particular, como o direito à terra está diretamente relacionado ao direito à moradia e à proibição de remoções forçadas. A sociedade civil tem enfatizado a ligação entre moradia e direito à terra com a criação da Housing and Land Rights Network (Rede de Moradia e Direito à Terra).3

De maneira geral, a relação entre moradia e direito à terra parece ser um aspecto consolidado em normas de direitos humanos, e envolve tanto um aspecto positivo quanto um negativo. Possui um lado positivo no sentido de que o direito à terra é considerado um componente essencial para a efetivação do direito à moradia; e um lado negativo, dado que a expropriação de terras pode ser qualificada como remoção forçada em violação direta do direito à moradia. Embora seja claramente lógica, tal abordagem limita-se a um aspecto particular do direito à terra, qual seja, dar sustentação à moradia. Outros aspectos cruciais do direito à terra, em especial seus elementos culturais, sociais e espirituais, estão ausentes aqui.

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6.  Direito à terra como acesso à alimentação adequada

Diferentemente do direito à terra, o direito à alimentação é amplamente reconhecido na legislação internacional de direitos humanos. O artigo 25 da DUDH prevê que toda pessoa tem direito a um padrão de vida adequado, “inclusive alimentação”. O artigo 11 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) faz referência especial ao direito à alimentação ao reconhecer expressamente o direito de toda pessoa a um padrão adequado de vida, “inclusive alimentação adequada”. O artigo 11(2) prevê o “direito fundamental de toda pessoa de estar protegida contra a fome”, ao passo que o artigo 11(2)(a) requer que os Estados “melhorem os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios”, em particular por meio de reformas agrárias, para utilizar de maneira mais eficaz os recursos naturais; e o artigo 11(2)(b) exige a implementação de uma “repartição equitativa dos recursos alimentícios mundiais”.

Provavelmente, a referência mais direta ao direito à terra, no Pacto, é a menção à necessidade de:

melhorar os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios […] pelo aperfeiçoamento ou reforma dos regimes agrários, de maneira que se assegurem a exploração e a utilização mais eficazes dos recursos naturais.
(UNITED NATIONS, 1966, art. 11).

Podem ser encontradas diversas referências ao direito à terra no Comentário Geral no 12 do CDESC sobre o direito à alimentação. Nesse Comentário, o Comitê afirma que: “efetiva-se o direito à alimentação adequada quando todo homem, mulher e criança, isoladamente ou em conjunto com outros, possui acesso físico e econômico a todo tempo à alimentação adequada ou aos meios para obtê-la” (UNITED NATIONS, 1999, art. 11, para. 6).

Ao considerar que a “origem do problema de fome e má-nutrição não é a falta de alimentos, mas sim a falta de acesso aos alimentos disponíveis” (UNITED NATIONS, 1999, art. 11, para. 5), o Comentário Geral no 12 estabelece que a disponibilidade de alimentos “diz respeito às possibilidades de alimentar-se diretamente da terra produtiva ou outros recursos naturais” (UNITED NATIONS, 1999, art. 11, para. 12), ou de sistemas de mercado em funcionamento que tornem os alimentos disponíveis. Ademais, o Comentário Geral estabelece que garantir o acesso à “alimentação ou recursos para alimentação” exige que os Estados implementem o acesso integral e igual aos recursos econômicos, inclusive o direito a herdar e possuir a terra, para todas as pessoas, em particular as mulheres.

A relação entre direito à alimentação e direito à terra também constitui uma parte importante do mandato do Relator Especial da ONU sobre o Direito à Alimentação (tanto o atual quanto o anterior). O ex-Relator Especial, Jean Ziegler, destacou que o “acesso à terra é um dos elementos chaves necessários para acabar com a fome no mundo” (UNITED NATIONS, 2002, 3, par. 22), e ressaltou que “muitas pessoas em zonas rurais passam fome por serem sem-terra, não desfrutarem de segurança na posse ou por suas propriedades serem tão pequenas que não podem produzir alimentos suficientes para subsistência” (UNITED NATIONS, 2002, 3, para. 22). Muitos de seus relatórios têm revelado as maneiras pelas quais a discriminação no acesso à terra pode influenciar diretamente a efetivação do direito à alimentação. Em seu relatório sobre a situação na Índia, Ziegler notou que:

Discriminação generalizada impede que Dalits adquiram terra, uma vez que eles são vistos como ‘classe trabalhadora’, e mesmo se a eles for dado acesso à terra (como resultado de programas de redistribuição e programas de reforma agrária em alguns estados), tal terra é muitas vezes tomada à força por membros de castas superiores na área.
(UNITED NATIONS, 2006c, par. 11).

A condição de sem-terra, entre os Dalits, é um aspecto comum na economia de zonas rurais, uma vez que o controle de terras se concentra nas mãos de membros de castas superiores e ricos proprietários de terras, e isso afeta diretamente a efetivação do direito à alimentação.

Mais recentemente, o elo entre direito à terra e direito à alimentação ficou ainda mais clara no contexto de grandes aquisições de terra, reconhecidas sob o nome de grilagens (TAYLOR, 2009). Após a crise global de alimentos, em 2008, muitos dos principais Estados importadores de alimentos e exportadores de capital perderam a confiança no mercado global como uma fonte estável e confiável de alimentos, acelerando o processo de aquisições em larga escala de terras adequadas para o plantio (COTULA et al., 2009). Em outras palavras, esses governos com “insegurança alimentar”, que dependem de importações de produtos agrícolas, deram início a uma política de aquisição de vastas áreas de terras agrícolas no exterior para a sua própria produção de alimentos, bem como para aumentar os seus investimentos em terras produtivas em outros países, as quais se tornam cada vez mais valiosas. Neste contexto, o direito à terra passou a ser visto por alguns como uma ferramenta chave para garantir o direito de comunidades locais à alimentação. Em relatório recente, o atual Relator Especial da ONU sobre o Direito à Alimentação, Olivier de Schutter, por exemplo, relacionou de maneira direta o direito à alimentação à questão da aquisição de terras em grande escala:

O direito humano à alimentação será violado se as pessoas que dependem da terra para sua subsistência, incluindo pastores, forem proibidas de ter acesso à terra, sem alternativas adequadas; se a renda local for insuficiente para compensar os efeitos nos preços dos alimentos decorrentes da mudança para a produção alimentícia para exportação; ou se as rendas de pequenos agricultores locais caírem após a chegada ao mercado nacional de alimentos a preços baixos, produzidos em plantações em grande escala mais competitivas desenvolvidas graças à chegada de investidores.
(UNITED NATIONS, 2009, par. 4)

Além disso, a análise do Relator Especial insta a todos os interessados (governos, investidores e comunidades locais) a abordar a questão de maneira mais estruturada, colocando os parâmetros de direitos humanos no cerne do debate. O Relator Especial propôs onze princípios mínimos direcionados a investidores, Estados de origem, Estados de destino, comunidades locais, povos indígenas e sociedade civil. Dois dos princípios propostos estão diretamente relacionados ao direito à terra:

Princípio 2. A transferência do uso ou da propriedade da terra somente pode ser realizada com o consentimento livre, prévio e informado de comunidades locais. Isso é particularmente importante no caso de comunidades indígenas, dada a sua experiência histórica com a expropriação de suas terras.

Princípio 3. Os Estados devem adotar legislação destinada a proteger o direito à terra, inclusive títulos individuais ou registros coletivos de uso da terra, com vistas a garantir uma proteção judicial plena.
(UNITED NATIONS, 2009)

Assim, o Relator Especial alegou que em nome da proteção do direito à alimentação dos mais necessitados, os Estados devem garantir a segurança da posse da terra de seus agricultores e comunidades locais, bem como pôr em prática políticas destinadas a assegurar um acesso mais equitativo a ela (DE SCHUTTER, 2011). Embora a interação entre o acesso à terra e o direito à alimentação seja particularmente aguda no âmbito do atual fenômeno de grilagem da terra, esse movimento de investimentos em larga escala em terras agrícolas apenas reforça como o direito à alimentação necessariamente exige a proteção do direito à terra.

Recentemente, referências mais diretas ao direito à terra começaram a surgir no trabalho de outras organizações internacionais preocupadas com a segurança alimentar. Por exemplo, em 2004, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, sigla original) publicou suas Diretrizes Voluntárias em Apoio à Realização Progressiva do Direito à Alimentação Adequada no Contexto da Segurança Alimentar Nacional (FOOD AND AGRICULTURAL ORGANISATION OF THE UNITED NATIONS, 2004). As diretrizes são baseadas em todos os principais instrumentos internacionais relativos ao direito à alimentação, e propõe 19 diretrizes para ajudar os Estados a garantir a efetivação, de maneira progressiva, do direito à alimentação. A diretriz 8 (B) trata especificamente do direito à terra das mulheres e dos povos indígenas como um componente importante para assegurar a realização do direito à alimentação. De modo mais geral, várias organizações que trabalham com questões relativas à segurança alimentar começaram a reconhecer a necessidade de concentrar seu trabalho e suas campanhas na proteção do direito à terra, como parte da implementação do direito à alimentação (MIGGIANO; TAYLOR; MAURO, 2010).

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7.  Conclusão

Uma abordagem fundada em direitos humanos é essencial para lidar com situações de pré-conflito, conflito e pós-conflito. Conforme exemplificado por casos na África do Sul, Uganda, Guatemala e Zimbábue, questões fundiárias e reformas agrárias, muitas vezes, estão no centro de conflitos violentos e, como tal, representam elementos chave na transição do conflito para a paz. Disputas fundiárias têm surgido recentemente na Indonésia, e recentes aquisições de terra em grande escala têm desafiado a estabilidade no Camboja.

De várias formas, essas tensões em torno do direito à terra não constituem uma novidade, a história da humanidade tem evoluído ao redor desses conflitos, já que se pode argumentar que guerras sempre tem envolvido disputas territoriais. Também há uma relação estreita entre uso, acesso e propriedade da terra, de um lado, e desenvolvimento e redução da pobreza, de outro. A crescente crise agrária impulsionada pelo fracasso de programas de reforma agrária, a tomada das terras por empresas privadas, a privatização de serviços básicos, o aumento do deslocamento induzido por projetos de desenvolvimento, e a usurpação da terra agrícola de pequenos agricultores estão gradualmente contribuindo para pôr o direito à terra no centro do debate sobre justiça social e direitos humanos.

Enquanto a terra está sendo cada vez mais mercantilizada, como um bem exclusivamente comercial, a abordagem do direito à terra fundada em direitos humanos traz outra perspectiva para o debate sobre o valor da terra como um componente social e cultural, e, mais importante, como um direito humano fundamental. Como os direitos de acesso e propriedade tradicional da terra, por parte das mulheres, das minorias, dos migrantes e pastores, são ignorados ou reduzidos no contexto atual, esses setores cada vez mais reivindicam que seu direito à terra são parte de seus direitos humanos fundamentais. Sob o lema direito à terra é direito humano, as pessoas reivindicam que que as terras representam não somente um ativo econômico muito valioso, mas também uma fonte de identidade e cultura.

Com as importantes exceções dos direitos das mulheres e dos direitos dos povos indígenas, no entanto, o direito à terra não é reconhecido no texto de tratados de direitos humanos. Como explorado no artigo, o direito à terra é visto como elemento essencial para efetivação de outros direitos humanos. A conexão entre direito à terra e direito à alimentação parece estar ganhando algum destaque, com base em uma visão de que o primeiro é um elemento essencial para a efetivação do segundo. Uma abordagem muito semelhante ao direito à terra se desenvolveu sob a bandeira do direito à moradia. Em ambas as situações, o direito à terra tem sido identificado como um instrumento para a efetivação de outros direitos fundamentais.

Os exemplos prévios certamente representam um desenvolvimento importante no âmbito da legislação internacional dos direitos humanos. Mas é paradoxal, que apesar da percepção cada vez aceita de que a efetivação de dois direitos humanos fundamentais (alimentação e moradia) se baseiam na proteção do direito à terra, este não seja considerado fundamental, sendo que não é encontrado nos tratados internacionais, apesar das reinvindicações dos ativistas, organizações internacionais não-governamentais e outros autores da sociedade civil.4 Pode-se perguntar se a legislação de direitos humanos estaria pondo o carro na frente dos bois caso reconhecesse como fundamental o direito à terra, sem antes incorporá-lo e consolidá-lo dentro da normativa internacional.

Pode-se dizer que, é intrinsicamente um direito constantemente em disputa, por ser a terra uma fonte importante de riqueza, cultura e vida social. A distribuição e o acesso à terra não são neutros do ponto de vista político, e o direito à terra afeta a base econômica e social das sociedades. Também, suas diversas facetas econômicas, sociais e culturais geram tensões entre interesses distintos, em especial entre a necessidade de proteger o proprietário e ao mesmo tempo prover alguns direitos para os sem terra. Por último, o direito à terra constitui um elemento essencial de crescimento econômico e, como tal, envolve uma série de interessados, entre eles investidores estrangeiros poderosos.

Em última análise, o registro e a gestão da terra continuarão sendo de competência da legislação nacional de cada país, mas um instrumento internacional no direito humano à terra influenciaria a legislação fundiária e as reformas agrárias adotadas no âmbito nacional. Uma abordagem de direitos humanos pode ser uma ferramenta pertinente de garantir que tanto o valor cultural como o econômico da terra seja reconhecidos, e que o direito das pessoas sobre a terra seja respeitado como um direito fundamental. Os povos indígenas têm sido bem-sucedidos em reivindicar seus direitos fundamentais à terra, e conseguiram inseri-los na linguagem dos direitos humanos. Esse avanço extremamente positivo pode ser um indicativo de que chegou a hora de a comunidade de direitos humanos reivindicar o direito à terra como um direito humano fundamental para todos, proprietários e sem terra.

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Notas

1. O Artigo 14 da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), dedicado aos direitos de mulheres de regiões rurais, estabelece que as mulheres devem “ter acesso aos créditos e empréstimos agrícolas, aos serviços de comercialização e às tecnologias apropriadas, e receber igual tratamento nos projetos de reforma agrária e de reassentamento.” Os nove principais tratados de direitos humanos são: a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial; o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos; o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres; a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes de Tratamento ou Punição; a Convenção sobre os Direitos da Criança; a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros de suas Famílias; a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

2. Os outros são: disponibilidade de serviços, materiais, unidades e infraestrutura; economicidade, habitabilidade, acessiblidade para grupos desfavorecidos; localização e adequação cultural.

3. Ver: Habitat International Coalition. Housing and land Rights Network. Disponível em: <http://www.hlrn.org/>. Último acesso em: Maio 2013.

4. Ver, por exemplo: Kathmandu Declaration: Securing Rights to Land for Peace and Food Security (2009); Bali Declaration on Human Rights and Agribusiness in Southeast Asia e também: Relatório do Relator Especial sobre moradia adequada como componente do direito a um padrão adequado de vida, Miloon Kothari, UM Doc. A/HRC/4/18 (05 February 2007), no par. 31-33.

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Jurisprudencia

AFRICAN COMMISSION ON HUMAN AND PEOPLES RIGHTS (ACHPR). 2010. Communication 276/2003, Centre for Minority Rights Development (CEMIRIDE) and Minority Rights Group International (MRG) (on behalf of the Endorois) v Kenya (decision of Feb., 2010).

INTER-AMERICAN COURT OF HUMAN RIGHTS (IACtHR). 2001. The Mayagna (Sumo) Awas Tingni Community v. Nicaragua, Inter-Am. Ct. H.R., (Ser. C) No. 79, Judgment of August 31. Disponível em: http://www1.umn.edu/humanrts/iachr/AwasTingnicase.html. Último acesso em: 01 Mar. 2013.

Jérémie Gilbert

Jérémie Gilbert trabalha como professor assistente de Direito na Universidade de East London (Reino Unido). Ele publicou diversos artigos e capítulos de livros sobre direitos de povos indígenas, em especial sobre direitos territoriais. Gilbert tem colaborado regularmente com comunidades indígenas e ONGs emcasos relativos ao direito à terra. É membro do conselho do International Work Group on Indigenous Affairs - IWGIA, e do Conselho Consultivo para o Programa de Litígio do Minority Rights Group International, além de trabalhar regularmente com o Programa de Povos da Floresta e a organização Rainforest Foundation UK. Seu trabalho atual se concentra na proteção de povos nômades sob o direito internacional, no direito dos povos indígenas à terra e na interação entre empresas e normas de direitos humanos.
 
Email: jeremie.gilbert@uel.ac.uk

Original em inglês. Traduzido por Thiago Amparo.

Recebido em fevereiro de 2013. Aceito em maio de 2013.