Considerações sobre as possíveis implicações do Tratado sobre Comércio de Armas e a Agenda 2030 para a segurança humana
Este artigo apresenta uma revisão da confluência dos processos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e o Tratado sobre Comércio de Armas (TCA) na ação pela segurança humana, identificando as possibilidades de feedback mútuo no momento de sua implementação nessa fase inicial de sua existência. Especial atenção é dada ao Objetivo 16 da Agenda, acerca da paz e segurança, com ênfase à meta 16.4.2, sobre o controle do tráfico ilícito de armas, como núcleo de interação de ambos os processos. Do mesmo modo, são levados em conta os escopos humanitários do TCA, e, também, seus limites e as possibilidades para remediá-los no momento de sua implementação.
Ainda existem 15.700 ogivas nucleares em nove países, das quais 1.800 estão em alerta permanente11. “Status of World Nuclear Forces,” Federation of American Scientists, last modified September 28, 2015, acesso em 23 outubro 2015, http://fas.org/issues/nuclear-weapons/status-world-nuclear-forces/. enquanto houver um sistema em expansão e cada vez mais complexo de conflitos armados no Norte da África, no Oriente Médio, no Leste Europeu e na Ásia Central. As relações internacionais entre o Ocidente, a China e a Rússia têm passado por um processo de realinhamento estratégico cujo prognóstico segue reservado enquanto persistirem as “guerras frias” da Península Coreana e do Sul da Ásia, e o conflito Israel-Palestina seguir inacabado, constituindo uma catástrofe humanitária para a população de Gaza. A mudança climática global tem afetado o acesso a alimentos, água, terras agrícolas, habitação e saúde, e o planeta, prejudicando de imediato as pessoas mais vulneráveis. Há 60 milhões de pessoas em movimento intra e interestados.22. “Discurso de Apertura del Alto Comisionado António Guterres en la 66a Sesión del Comité Ejecutivo de la Oficina del Alto Comisionado de Naciones Unidas para los Refugiados (ACNUR), Ginebra, 5 de octubre de 2015,” UNHCR, acesso em 24 outubro 2015, http://www.unhcr.org/5613ac119.html. Mais de 800 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza extrema.33. “Mensaje del Secretario General de Naciones Unidas en el Día Internacional para la Erradicación de la Pobreza, 17 de octubre de 2015,” United Nations Information Centre - Manila, acesso em 24 outubro 2015, http://manila.sites.unicnetwork.org/2015/10/19/secretary-generals-message-on-the-international-day-for-the-eradication-of-poverty-17-october/. Atingimos níveis de desigualdade em que 1% da população mundial detém 65 vezes mais riqueza do que 50% do restante; 7 em cada 10 pessoas vivem em países onde a desigualdade vem crescendo nos últimos 30 anos; e a metade mais pobre da população tem o mesmo nível de riqueza que as 85 pessoas mais ricas do planeta.44. Thomas Pogge, Everyone knows there are rich and poor, but do you realize how big the gap really is?, 3 de octubre de 2014, acesso em 24 novembro 2015, http://thomaspogge.com/thomas-pogge/the-extent-of-economic-inequality/.
Nesse contexto será difícil alcançar a ordem de paz e segurança mundial enquanto não for enfrentado o sério problema da violência armada que atemoriza milhares de homens, mulheres e crianças que vivem sob a ameaça das armas. Entre 2007 e 2012 morreram a cada ano, em média, 508 mil pessoas dentro e fora de conflitos armados.55. Geneva Declaration on Armed Violence and Development, “Global Burden of Armed Violence 2015: Every Body Counts,” Geneva Declaration, acesso em 24 novembro 2015, http://www.genevadeclaration.org/measurability/global-burden-of-armed-violence/global-burden-of-armed-violence-2015.html. A violência armada apresenta consequências sociais e econômicas que vão além da perda de vidas. O custo anual é estimado em centenas de bilhões de dólares.66. Números apresentados em dólares norte-americanos. As situações de conflito têm um custo anual de 400 bilhões de dólares e o custo da violência armada fora dos conflitos armados, medido em termos de perda de produtividade, varia entre 95 e 163 bilhões de dólares.77. “Global Burden of Armed Violence 2015”.
Há um círculo vicioso entre a violência armada e o subdesenvolvimento. Este não só é uma consequência daquela, mas, também, um fator estrutural dela: “Os países afetados por níveis sustentados de violência armada, inclusive os conflitos, são aqueles que se encontram mais longe de alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). De fato, 22 dos 34 países que estão mais longe de alcançá-los encontram-se afetados por, ou saindo de, conflitos armados”.88. UNODA, “The Impact Of Poorly Regulated Arms Transfers On The Work Of The United Nations,” UNODA Occasional Papers 23 (March 2013): 16, acesso em 24 novembro 2015, http://www.un.org/disarmament/HomePage/ODAPublications/OccasionalPapers/PDF/OP23.pdf.
Entre 2014 e 2015, dois processos internacionais deram frutos como meios de resposta, potencialmente complementares, ao Tratado sobre Comércio de Armas – que entrou em vigor em dezembro de 2014,99. “The Arms Trade Treaty,” United Nations A/RES/69/49, acesso em 24 novembro 2015, http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/69/49. cuja primeira conferência foi realizada em agosto de 2015, na Cidade do México – e ao Objetivo 16 da Agenda 2030, adotada em setembro de 2015, na Cúpula para o Desenvolvimento Sustentável, em Nova York. Este Objetivo 16 foi projetado para “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionando acesso à Justiça para todos e a construção de instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”.1010. “Transforming Our World: The 2030 Agenda for Sustainable Development,” United Nations, acesso em 24 novembro 2015, https://docs.google.com/gview?url=http://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/21252030%20Agenda%20for%20Sustainable%20Development%20web.pdf&embedded=true. Este artigo analisa em qual medida estes dois processos podem ser vistos de modo integrado, uma vez que o desenvolvimento sustentável só é possível em um mundo livre da violência imposta diariamente pelas armas.
O Tratado sobre Comércio de Armas (TCA, ou ATT na sigla em inglês) tem por objetivo “a prevenção do tráfico ilícito de armas convencionais e seu envio” por meio do “estabelecimento dos mais altos padrões internacionais comuns que sejam possíveis para a regulamentação ou o aprimoramento da regulamentação do comércio internacional de armas”, com o propósito de contribuir com a paz, segurança e estabilidade internacional e regional; a redução do sofrimento humano; a promoção da cooperação, transparência e ação responsável por parte dos Estados, no comércio internacional de armas convencionais, contribuindo com a geração de confiança entre os Estados-Partes”.1111. “Tratado Sobre el Comercio de Armas - Artículo 1 Objeto y fin,” Naciones Unidas, acesso em 24 novembro 2015, https://unoda-web.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/2013/06/Espa%C3%B1ol1.pdf. O TCA é a mais recente contribuição para o controle de armas, a partir de uma perspectiva humanitária e de direitos humanos, junto com o Programa de Ação das Nações Unidas sobre Armas Pequenas e Leves (PoA)1212. “Programme of Action to Prevent, Combat and Eradicate the Illicit Trade in Small Arms and Light Weapons in All Its Aspects (UN Document A/CONF.192/15),” United Nations, acesso em 8 dezembro 2015, http://www.poa-iss.org/PoA/poahtml.aspx. e o Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas peças e componentes e munições, que complementa a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional,1313. “Convención de las Naciones Unidas Contra la Delincuencia Organizada Transnacional y Sus Protocolos,” Naciones Unidas - Oficina contra la Droga y el Delito, acesso em 24 novembro 2015, https://www.unodc.org/documents/treaties/UNTOC/Publications/TOC%20Convention/TOCebook-s.pdf. ambos de 2001.
A proliferação de armas, sua presença generalizada, seu fácil acesso e uso indevido, junto com a presença de grupos armados não estatais, diminui a capacidade do Estado de atender as necessidades básicas da população, desde o abastecimento de água até a vacinação; do acesso à Justiça à manutenção da infraestrutura pública. E, ainda pior, muitos Estados tornam-se perpetradores de abuso e violência contra sua população.
Nesse contexto ocorrem as transferências internacionais de armas, que, deve-se ter em vista, chegam a constituir um negócio e, ao mesmo tempo, um meio de intervenção nos assuntos internos de outros países, nem sempre prestando atenção aos riscos humanitários que podem ser gerados. Sem os controles adequados, esse mercado desvia recursos indispensáveis para atender as necessidades de desenvolvimento humano dos países.
As transferências de armas, a menos que sejam ilegais desde sua origem, tanto para abastecer grupos terroristas ou grupos criminosos como para violar embargos de armas estabelecidos pelo Conselho de Segurança, só devem chegar ao destinatário final e para o uso postado no certificado de transação. Não é necessariamente o caso em questão o fato de que as armas, suas peças e seus componentes e as munições sejam desviados durante o transporte e acabem nas mãos de destinatários não autorizados ou, ainda, os destinatários registrados sejam governos que têm cometido atos de genocídio, crimes de guerra, torturadores, violadores dos direitos humanos em grande escala, não sujeitos a embargos.
Vale a pena considerar o exemplo do Sudão do Sul, país onde as transferências de armas têm causado devastação humanitária e incapacidade de atender as necessidades de desenvolvimento sustentável de sua população, que tem baixos níveis de renda, e onde apenas 25% da população têm acesso a serviços de saúde e a expectativa de vida é de 55 anos.1414. “Data South Sudan,” The World Bank, acesso em 24 novembro 2015, http://data.worldbank.org/country/south-sudan; “About South Sudan,” UNDP, acesso em 24 novembro 2015, http://www.ss.undp.org/content/south_sudan/en/home/countryinfo/. O país se encontra em conflito desde sua fundação, em 2011, e, de fato, seu território tem sofrido os estragos da guerra como parte de sua luta pela independência ao longo de várias décadas – em diferentes formas: tribal, de fronteira, guerra civil. Isso se traduziu em mais de 50 mil mortes, 1,5 milhão de deslocados internos e 500 mil refugiados.1515. “Informe 2015 del Monitor del Tratado sobre el Comercio de Armas (TCA),” ATT Monitor, acesso em 24 novembro 2015, http://armstreatymonitor.org/wp-content/uploads/captulosenespaol/ATT%20SPANISH%20Monitor%202015_Online.pdf.
Nesse conflito foram cometidas atrocidades com armas que passaram pelos territórios do Quênia, de Uganda e do Sudão, com a autorização e, às vezes, a participação direta de seus governos, apesar da situação mencionada anteriormente.1616. Ibid. A transferência de grande parte dessas armas era destinada originalmente ao Sudão, como o usuário final, mas suas autoridades as retransferiram para o conflito no Sudão do Sul. Os países de origem dessas armas, Rússia, Irã e China – pelo menos até o ano anterior – continuam transferindo todos os tipos de armamento, apesar de ter sido desviado. Isso ocorre apesar do embargo de armas imposto pela União Europeia contra o Sudão e da existência de um Painel de Peritos do Conselho de Segurança para monitorar e relatar as transferências de armas para o Sudão do Sul.1717. Ibid.
O processo do TCA teve lugar em um contexto de avanços em nível internacional, proibições e restrições às armas que violam o Direito Internacional Humanitário (DIH) (por exemplo, minas antipessoais e bombas de fragmentação) e de atividade contínua contra a eliminação de armas de destruição em massa, sempre com ativa participação de Estados com visão progressista nessa matéria e das organizações da sociedade civil. No entanto, a regulamentação das armas convencionais, em especial das armas pequenas e leves, não tinha avançado além de compromissos politicamente vinculantes, como no caso do PoA.
A relação entre o desenvolvimento sustentável e o conflito armado tem sido claramente reconhecida na Agenda, por meio de seu Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 16 (ODS16) focado na promoção de sociedades pacíficas e inclusivas. A estagnação econômica, a pobreza, as crescentes desigualdades, a escassez de recursos básicos para a sobrevivência e a pressão ecológica assumem um papel central na geração de conflitos armados, talvez acima dos fatores estratégicos,1818. Christophe Wasinski and Giulia Prelz Oltramonti, “Vers un Bel Avenir des Conflits Armés?,” Diplomatie, no. 28 (August-September 2015): 76-79. portanto, “a inclusão do Objetivo 16 reflete o crescente reconhecimento de que os temas relacionados com a paz, a segurança e a boa governabilidade devem desempenhar um papel no marco para o desenvolvimento pós-2015”.1919. “Measuring Goal 16 on Peaceful and Inclusive Societies in the SDGs Process,” Geneva Declaration on Armed Violence and Development, acesso em 23 novembro 2015, www.genevadeclaration.org. Talvez este seja o Objetivo mais diverso e heterodoxo da Agenda 2030, uma vez que abrange uma ampla variedade de temas que vão desde a violência armada, inclusive a violência contra as crianças, o terrorismo, a identidade jurídica, a governabilidade, a transparência, o combate à corrupção, o acesso à informação, a tomada de decisões inclusivas, o Estado de direito e o acesso à Justiça, além de medidas contra o tráfico ilícito de armas.
O ODS16 enfatiza a prevenção e redução da violência por meio das metas 16.1,2020. Para a redução significativa da violência em todas as suas formas e dos índices de mortalidade relacionados. 16.22121. Para dar fim ao abuso, à exploração, ao tráfico e a todas as formas de violência e tortura contra as crianças. e 16.3.2222. Para o fortalecimento das instituições nacionais relevantes, inclusive por meio da cooperação internacional, para a construção da capacidade em nível nacional para prevenir a violência e combater o terrorismo e a criminalidade. Em sua meta 16.42323. Para reduzir os fluxos ilegais de (1) finanças e (2) armas, fortalecendo a recuperação e a devolução de ativos financeiros roubados, bem como combater todas as formas de crime organizado. a Agenda busca participar do assunto do fluxo ilícito de armas, dados os seus efeitos nocivos no desenvolvimento sustentável.
Esse objetivo contará com indicadores e ocorrerão os primeiros passos para a construção institucional em torno da Agenda 2030. Teremos, assim, os primeiros indicadores de referência para a meta 16.4.2, que deverão constituir elementos centrais nas ações contra a violência armada nos planos nacionais para o desenvolvimento sustentável.
O TCA contribui com a consolidação de um regime internacional para o controle das transferências de armas, apoiando os passos tomados com antecedência tanto em nível global como regional para lidar com essa problemática. Alguns países têm contado com sistemas nacionais de controle há muitos anos, mas esse não é o caso da maioria. Em 2006,2424. Para obter mais informações sobre a história do processo, consulte: Daniel Mack and Brian Wood, “Civil Society And The Drive Towards An Arms Trade Treaty,” UNIDIR, acesso em 24 agosto 2010, www.unidir.org/files/medias/pdfs/civil-society-and-the-drive-towards-an-arms-trade-treaty-eng-0-418.pdf; y Matthew Bolton et al., “The Arms Trade Treaty From a Global Civil Society Perspective: Introducing Global Policy's Special Section,” Global Policy 5, no. 4 (November 2014), 433-438, acesso em 7 outubro 2014, http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1758-5899.12171/abstract. três anos após o início da campanha mundial para lançar um processo em direção a um instrumento internacional juridicamente vinculante para o controle do comércio de armas, foi apresentada na Primeira Comissão da Assembléia Geral da ONU a Resolução “Rumo a um Tratado sobre o Comércio de Armas”.2525. “Resolución Aprobada por la Asamblea General el 6 de diciembre de 2006,” Naciones Unidas - A/RES/61/89, acesso em 24 novembro 2015, http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/61/89&referer=http://www.un.org/depts/dhl/resguide/r61_resolutions_table_eng.htm&Lang=S. Sete anos depois, o Tratado foi adotado depois que, imediatamente após o final da segunda conferência de negociação terminar sem consenso, 12 governos colocaram sobre a mesa uma resolução2626. “The Arms Trade Treaty B,” United Nations - A/RES/67/234 B, acesso em 24 novembro 2015, https://unoda-web.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/2013/06/A-RES-67-234-B.pdf. que propunha que o texto do Tratado fosse aprovado pela AG na sessão de 2 de abril. Cento e cinquenta e quatro Estados votaram a favor.2727. 3 votos contra e 22 abstenções. “Voting Record, Final United Nations Conference on the Arms Trade Treaty, 2 April 2013 (A/CONF.217/2013/L.3),” Armstreaty, acesso em 24 novembro 2015, http://armstreaty.org/issue/voting-record-aconf-2172013l-3/.
A primeira Conferência de Estados-Partes (CSP) do TCA ocorreu em Cancun, México, em agosto de 2015, após uma série de reuniões preparatórias na Cidade do México, em Berlim, em Porto de Espanha, em Viena e em Genebra. Além disso, o México assumiu o Secretariado Provisório.
Estiveram presentes mais de 130 signatários, entre eles 69 Estados-Partes, bem como 11 observadores – como a Arábia Saudita e a China; 10 órgãos intergovernamentais; representantes da sociedade civil reunidos na Aliança “Control Arms” a indústria e inclusive as ONGs que fazem lobby a favor das armas de fogo, em torno da Associação Nacional do Rifle (National Rifle Association dos EUA).2828. “Arms Trade Treaty First Conference of States Parties Cancun, Mexico, 24-27 August, 2015,” Arms Trade Treaty, acesso em 24 novembro 2015, https://s3.amazonaws.com/unoda-web/wp-content/uploads/2013/06/ATT_CSP1_2015_6.pdf 27 August 2015 ATT/CSP1/2015/6.
Houve acordo sobre as Regras de Procedimento (ATT/CSP1/2015/WP.1/Rev.1), que acabaram por ser incluídas: a garantia da participação da sociedade civil e um processo de tomada de decisões com base no consenso com opção de voto, e reuniões de caráter público. Também foram estabelecidas as Regras Financeiras (ATT/CSP/2015/WP.3/Rev.1), o financiamento com base no sistema de cotas da ONU e contribuições voluntárias; reuniões públicas; sede do Secretariado2929. Tarefas do Secretariado, ATT/CSP/2015/WP.2/Rev.2; Orçamento provisional do Secretariado, ATT/CSP/2015/WP.6/Rev.1/Coor. na Suíça, com o sul-africano Simeon Dumisali Dladla como Secretário interino – permanecendo no cargo até a 2CSP, quando se concluirá o processo de seleção do Secretário permanente. Em relação direta com o Secretariado, foi criado um Comitê Administrativo – de acordo com os Termos de Referência modelados em ATT/CSP/2015/WP.5/Rev.2 – com o propósito de supervisioná-lo nas questões financeiras. Seus membros são Costa do Marfim, República Checa, França e Jamaica. O tema dos relatórios anuais ficou inacabado, de modo que foi estabelecido um grupo de trabalho sobre relatórios.
O Embaixador Emmanuel E. Imohe, da Nigéria, foi eleito para presidir a próxima Conferência, mesmo ainda sem definir o local onde ocorrerá a segunda reunião dos Estados-Partes. Costa Rica, Finlândia, Montenegro e Nova Zelândia foram eleitos como vice-presidentes. Nos primeiros meses de 2016 ocorrerá, em Genebra, a reunião extraordinária de um dia, anunciada em Cancun, para revisar e considerar a adoção da proposta sobre as disposições administrativas do Secretariado e, posteriormente, a revisão de seu orçamento provisório. Além disso, essa Comissão tem cumprido funções administrativas provisórias do Secretariado, a cargo do Sr. Dumisali Dladla. Não foi definido se haverá reuniões preparatórias para a 2CSP – embora informalmente tenha sido mencionada a possibilidade de pelo menos uma, sem descartar que ocorra na Nigéria. De todo modo, foi estabelecida a possibilidade de que, se nenhum outro país se oferecer para sediar a reunião, ela ocorrerá na cidade-sede do Secretariado, Genebra.
A Conferência dos Estados-Partes decidiu considerar,, entre outras ações e atividades de seu Programa de Ação (ATT/CSP1/2015/WP.8.Rev.1), no período entre as duas primeiras CSP, as seguintes: identificar e avaliar os avanços no âmbito das armas convencionais; comparar as boas práticas acerca da implementação e operação do Tratado; promoção da universalização do Tratado; identificar lições aprendidas e a necessidade de ajustes na implementação; cotejar a prática entre Estados designados com base na interpretação do Tratado.
Enquanto isso, poucos dias após a 1CSP, a Agenda 2030 foi adotada na Cúpula para o Desenvolvimento Sustentável de 25 a 27 de setembro de 2015, em Nova York, e, assim, o verdadeiro desafio de proporcionar substância, marco institucional e capacidade de avaliação para o multilateralismo pelo desenvolvimento sustentável nos próximos anos estava apenas começando. O primeiro passo nesse sentido é a geração de indicadores para cada uma das 169 metas, ainda em processo de produção; e só serão definidos na reunião de março de 2016 da Comissão de Estatística das Nações Unidas.3030. Próximos Passos: 29 outubro - 20 novembro. 2015: Consulta para Membros do IEAG sobre indicadores verdes 30 novembro - 7 dezembro 2015: Relatório preliminar circulado para os membros do IEAG 7 dezembro - 16 dezembro 2015: Relatório para Comissão Estatística é finalizado para consideração. O Grupo de Peritos das Agências sobre os ODS, em sua reunião de outubro de 2015 em Bancoque, Tailândia, teve a missão de revisar a lista de possíveis indicadores globais, discutindo seu marco, a inter-relação por meio das diferentes metas, bem como os temas críticos da desagregação dos dados, a reta final do plano de trabalho e os próximos passos. Embora o processo permaneça em aberto, já foram aceitos diversos indicadores, mesmo quando há casos com trabalho pendente para agregar precisão e esquema de desagregação. Estes são os denominados indicadores de categoria verde.3131. “Concerning The Modalities For Consultation On Indicators,” Second Meeting of the IAEG-SDGs, acesso em 23 novembro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting- 02/Outcomes/Meeting%20summary%20and%20work%20plan.pdf.
Esse é o status em que se encontram os indicadores da Meta 16.4.2. Antes da reunião de Bancoque, a proposta de indicador “Porcentagem de armas de fogo apreendidas que foram registradas e rastreadas, de acordo com normas internacionais” já tinha sido apresentada, e durante o evento houve um acordo geral sobre ela. Também foi aceita sem objeções a proposta de indicador introduzida em Bancoque, “Porcentagem de armas pequenas marcadas e registadas no momento da importação, de acordo com normas internacionais”. Assim, essas propostas foram aceitas pelo Grupo Interagências de Especialistas sobre indicadores dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (IAEG na sigla em inglês), embora sujeitas a acréscimo.3232. “Results Of The List Of Indicators Reviewed At The Second IAEG-SDG Meeting,” Second Meeting the IAEG-SDGs, acesso em 23 novembro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting-02/Outcomes/Agenda%20Item%204%20- %20Review%20of%20proposed%20indicators%20-%202%20Nov%202015.pdf. Além disso, o grupo de partes interessadas propôs como indicador adicional a “Porcentagem de armas ilegalmente produzidas ou transferidas que foram apreendidas de acordo com as normas internacionais”.3333. “Stakeholders Statement - 2nd Meeting of the Interagency and Expert Group on SDG Indicators - Bangkok, 26 October 2015 - Global Indicators for: Goal 16 - Promote peaceful and inclusive societies for sustainable development, provide access to justice for all and build effective, accountable and inclusive institutions at all levels,” United Nations Statistics Division, acesso em 23 novembro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting-02/Statements/Stakeholders%20Statement%20-%20Goal%2016.pdf.
Enquanto as propostas de indicador para a Meta 16.4.2 já na categoria verde mencionadas contam com a aprovação do Serviço de Estatística da ONU,3434. “Statement by the UN Chief Statisticians,” United Nations Statistics Division, acesso em 24 novembro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting- 02/Statements/UNSSO%20statement_Goal%2016%20-%20Oct%202015.pdf. a Unidade sobre o Estado de Direito do Gabinete do Secretário-Geral das Nações Unidas, por sua vez, observou que, com estes indicadores, ficam fora outros tipos de armas, e portanto deve haver um arranjo para um único indicador acerca de armas de fogo.3535. “United Nations Development Programme Peacebuilding Support Office Executive Office of the Secretary-General / Rule of Law Unit Guidance on Goal 16 at Second Meeting of the Inter-Agency and Experts Group on SDG Indicators,” United Nations Statistics Division, acesso em 26-28 outubro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting- 02/Statements/UNDP%20PBSO%20EXO%20RoLU%20guidance%20Goal%2016.pdf.
O processo da IAEG SDG não ficou isento de críticas. De acordo com as organizações da sociedade civil participantes, o ODS16 tem tido limitado escopo em relação ao propósito da Agenda, enfatizando que o processo de elaboração de indicadores “não é simplesmente um processo tecnocrático”,3636. “Closing Civil Society Statement, 2nd Meeting off the Interagency and Expert Group on SDG Indicators, Bangkok, 28 October, 2015,” United Nations Statistics Division, acesso em 24 novembro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting-02/Statements/Closing%20Civil%20Society%20Statement.pdf.e afirmando que este objetivo tem recebido pouca atenção, uma vez que, na reunião de Bancoque, o debate acerca dele se mesclou com o do ODS17. Por fim, solicitaram que se conte com indicadores vivos que possam ser atualizados à medida que a Agenda seja implementada.3737. Ibid.
Parece que nos aproximamos da cristalização do jogo de indicadores do 16.4.2. No entanto, infelizmente, corremos o risco de ir contra a intenção de universalidade da Agenda ao nos depararmos com uma falta de indicadores para todos, não apenas para importadores de armas ou países afetados pela violência armada. Faltam indicadores para países envolvidos nas outras fases das transferências de armas e um escopo que cubra todos os tipos de armas convencionais. É nesse sentido que o TCA, que se refere à Unidade sobre o Estado de Direito em sua nota conceitual acerca do ODS16,3838. “United Nations Development Programme Peacebuilding Support Office Executive Office of the Secretary-General / Rule of Law Unit Guidance on Goal 16 at Second Meeting of the Inter-Agency and Experts Group on SDG Indicators,” United Nations Statistics Division, acesso em 26-28 outubro 2015, http://unstats.un.org/sdgs/files/meetings/iaeg-sdgs-meeting- 02/Statements/UNDP%20PBSO%20EXO%20RoLU%20guidance%20Goal%2016.pdf. é uma fonte relevante para a construção de indicadores complementares que preencham tal lacuna.
Assim, vale levar em conta os artigos do TCA: 12, sobre Registro; 13, sobre Apresentação de relatórios; e 14, sobre Execução, enquanto base de referência para propostas de indicadores sobre criação, manutenção e atualização de registos nacionais de autorizações de transferências – pelo menos de exportações – de todos os tipos de armas convencionais – ou, alternativamente, de armas pequenas e leves; apresentação de relatórios mínimos de medidas de regulamentação de transferências; relatórios anuais de transferências; medidas de apoio à implementação, como leis e regulamentos.
A Meta 16.4.2 e o TCA têm o potencial de ser ferramentas para a construção de uma paz positiva, entendida como “a presença de atitudes, instituições e estruturas que criam e mantêm sociedades pacíficas”, e representam “a capacidade que uma sociedade tem para satisfazer as necessidades de seus cidadãos, ao reduzir o número de agravos que podem resultar e resolver conflitos sem recorrer à violência”.3939. Institute for Economics and Peace, “Positive Peace Report 2015: Conceptualizing and Measuring The Attitudes, Institutions And Structures That Build A More Peaceful Society,” (Sidney: IEP, 2015), 7, acesso em 24 novembro 2015, www.visionofhumanity.org.Ambos os processos decorrem do reconhecimento de que pobreza e desigualdade, violência armada e transferência de armas fora de controle fazem parte de um círculo vicioso, tendo, assim, o potencial de preencher as lacunas na segurança humana. “Deve-se combinar os benefícios da promoção da norma de transferências responsáveis de armas à realização dos ODM ou dos ODS, principalmente em termos da potencial contribuição para a redução da violência armada”.4040. Elli Kyotömäki, “How Joining the Arms Trade Treaty Can Help Advance Development Goals,” (London: Chatham House, 2014), 24, acesso em 24 novembro 2015, https://www.chathamhouse.org/sites/files/chathamhouse/field/field_document/20141215ArmsTradeTreatyDevelopmentKytomakiUpdate.pdf.
A cooperação para a implementação será essencial. O ODS17 sobre o fortalecimento dos meios de implementação e a revitalização da associação global para o desenvolvimento sustentável proporciona um espaço para a assistência na construção de capacidades; o financiamento para o desenvolvimento; a produção e o aperfeiçoamento de estratégias e políticas públicas consistentes em nível nacional. Esse é outro ponto de encontro importante com o TCA. Deve-se explorar a sinergia que pode ser gerada com seus artigos 15, sobre cooperação internacional, e 16, sobre assistência internacional.
As bases foram assentadas, sim, mas quando ambos os processos forem tinta sobre o papel será exigida a demonstração contínua de compromisso por parte dos Estados-Membros das Nações Unidas e das outras partes responsáveis no momento de implementá-las. Caso contrário, não serão nada mais do que um conjunto de boas intenções.
Há possibilidades para uma ação concertada decorrentes de décadas do trabalho internacional de governos, organizações e sociedade civil, da produção e geração de conhecimento para fazer frente aos graves desafios existenciais globais que enfrentamos, pondo fim às suas profundas consequências sociopolíticas, econômicas, militares e ambientais.