Ensaios

Comparação esquemática dos sistemas regionais de direitos humanos11. Publicado pela primeira vez no African Human Rights Law Journal, vol. 5, págs. 308-320, 2005.

Christof Heyns, David Padilla e Leo Zwaak

Uma atualização

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RESUMO

Existem três sistemas regionais para a proteção dos direitos humanos: o africano, o interamericano e o europeu. Esta contribuição oferece uma visão geral comparativa de suas principais características e focaliza aspectos-chave, institucionais e de procedimentos desses sistemas.

Palavras-Chave

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Como é sabido, os direitos humanos podem ser protegidos por lei no âmbito doméstico ou no internacional. As leis internacionais de direitos humanos têm, por sua vez, diferentes níveis. Incluem o sistema global, no qual as Nações Unidas (ONU) são o ator principal. O sistema global é potencialmente aplicável de uma forma ou outra a qualquer pessoa. Inclui ainda os sistemas regionais, que cobrem três partes do mundo – a África, as Américas e a Europa. Se os direitos de alguém não são protegidos no âmbito doméstico, o sistema internacional entra em ação, e a proteção pode ser oferecida pelo sistema global ou regional (naquelas partes do mundo em que existem tais sistemas).

Os três sistemas regionais de direitos humanos acima mencionados fazem parte de sistemas de integração regional com uma atribuição bem mais ampla do que apenas a dos direitos humanos – no caso da África, a organização matriz é a União Africana (UA); nas Américas é a Organização dos Estados Americanos (OEA); e na Europa é o Conselho da Europa (CE). Em outras partes do mundo há organismos de integração regional, mas sem uma atribuição similar de direitos humanos.

Embora tenha havido questionamentos iniciais contra a instauração de sistemas regionais de direitos humanos, especialmente por parte das Nações Unidas com sua ênfase na universalidade, os benefícios de se contar com tais sistemas são hoje em dia amplamente aceitos. Países de uma determinada região freqüentemente têm um interesse compartilhado em proteger os direitos humanos naquela parte do mundo, e existe a vantagem da proximidade no sentido de influenciar reciprocamente seu comportamento e de assegurar a concordância com padrões comuns, coisa que o sistema global não oferece.

Sistemas regionais também abrem a possibilidade de os valores regionais serem levados em conta ao se definirem as normas de direitos humanos – obviamente, com o risco, se isso for levado muito longe, de se comprometer a idéia da universalidade dos direitos humanos. A existência de sistemas regionais de direitos humanos permite adotar mecanismos de cumprimento que se coadunam melhor com as condições locais do que o sistema de proteção global, universal. Uma abordagem mais judicial do cumprimento pode ser apropriada, por exemplo, a uma região como a Europa, enquanto uma abordagem que abra espaço também para mecanismos não judiciais, como comissões e revisão de pares, pode ser mais apropriada a uma região como a África. O sistema global não tem essa flexibilidade.

Os tratados que compõem os sistemas regionais de direitos humanos seguem o mesmo formato. Eles implementam certas normas – direitos individuais, principalmente, mas em alguns casos também direitos e deveres de povos – que têm validade nos Estados que adotaram o sistema; e criam um sistema de monitoramento para assegurar o cumprimento dessas normas nos Estados que o adotaram. O formato clássico de um sistema de monitoramento como esse foi definido pela Convenção Européia de Direitos Humanos de 1950. Nos termos desse sistema, uma vez que uma pessoa tenha percorrido todos os caminhos para ter seus direitos defendidos pelo sistema legal do país onde ela se encontra, ela pode se dirigir a uma comissão de direitos humanos criada pelo sistema regional. A comissão dará ao Estado uma oportunidade de responder, e então decidirá se houve ou não uma violação. No entanto, essa decisão não terá por si só força de lei. Para obter tal resultado, o caso tem que ser encaminhado à corte regional de direitos humanos, onde decisões com valor jurídico vinculante são expedidas para se concluir se houve violação do tratado por parte do Estado-membro.

Desde que o padrão foi definido, os europeus, por meio de um Protocolo de 1998, aboliram sua Comissão e deixaram a supervisão nas mãos da Corte Européia de Direitos Humanos. O sistema interamericano continua funcionando com base numa Comissão e também numa Corte. O sistema africano tinha inicialmente apenas uma Comissão, mas a decisão de complementar a Comissão com uma Corte Africana de Direitos Humanos foi tomada por meio de um Protocolo em 1998.

Os três sistemas regionais de direitos humanos em operação atualmente compartilham várias características, mas também mostram diferenças. A exposição esquemática que apresentamos aqui dá uma visão geral de como alguns dos mais importantes aspectos desses sistemas podem ser comparados entre si, com atenção para a maneira pela qual esses mecanismos de cumprimento são constituídos e operam, e para os procedimentos adotados.1  Exceto quando indicado de outra forma, essa exposição mostra a situação dos sistemas africano, interamericano e europeu da maneira como se apresentavam no final de 2005. A ordem usual pela qual tais sistemas são apresentados foi invertida, para enfatizar que nenhum desses sistemas define necessariamente a norma.

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Notas

1. Esta é uma versão atualizada de C. Heyns, W. Strasser & D. Padilla, ”A schematic comparison of regional human rights systems”, African Human Rights Law Journal, vol. 3, 2003, pág.76. Gostaríamos de prestar homenagem a Wolfgang Strasser, recentemente falecido.

Christof Heyns

É diretor e professor de Legislação de Direitos Humanos do Centro de Direitos Humanos da Universidade de Pretória. É responsável pela estrutura, compilação de informações e pela parte relativa ao sistema africano. (Agradecimentos especiais à assistência de Magnus Killander e Yonas Gebreselassie.)

Original em inglês. Traduzido por Luís Reyes Gil.

David Padilla

É ex-assistente do secretário-executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e professor Fulbright do Centro de Direitos Humanos da Universidade de Pretória. É responsável pela informação sobre o sistema interamericano. (Agradecimentos especiais à assistência de Lilly Ching.)

Original em inglês. Traduzido por Luís Reyes Gil.

Leo Zwaak

É pesquisador sênior e professor na Universidade de Utrecht e do Netherlands Institute of Human Rights (SIM). É responsável pela informação sobre o sistema europeu. (Agradecimentos especiais à assistência de Desislava Stoitchkova.)

Original em inglês. Traduzido por Luís Reyes Gil.