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A crescente influência da China no Conselho de Direitos Humanos da ONU

Raphael Viana David

Quais são as implicações para a América Latina e para o Sul Global?

fabonthemoon

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RESUMO

A recente votação contra a primeira resolução do Conselho de Direitos Humanos da ONU que analisa a situação do povo uigur em Xinjiang gerou discussões e preocupações sobre o crescente controle da China sobre os órgãos de direitos humanos da ONU. Em meio às tensões entre a China e o Ocidente, a crescente influência da China no sistema de direitos humanos da ONU representa um desafio para os governos progressistas do Sul Global, que buscam cooperar com Pequim sobre comércio e desenvolvimento, ao mesmo tempo em que partilham divergências sobre as prioridades no campo de direitos humanos. Este artigo tem como objetivo apresentar os objetivos e táticas por trás da crescente presença da China no Conselho de Direitos Humanos da ONU e propor algumas reflexões sobre seu impacto para os governos progressistas da América Latina e de outros países do Sul Global.

Palavras-Chave

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Introdução

Em 6 de outubro de 2022, o Conselho de Direitos Humanos (CDH), o principal órgão de decisão sobre direitos humanos das Nações Unidas (ONU), considerou sua primeira resolução sobre a situação dos direitos humanos na China, que solicitava um debate sobre as violações de direitos humanos na Região Autônoma Uigur de Xinjiang (Região Uigur) depois que a ONU divulgou um duro relatório alegando possíveis crimes contra a humanidade. A resolução foi rejeitada por uma pequena margem de três votos e essa situação chamou atenção para a falta de apoio dos governos do Sul Global que historicamente têm um forte compromisso com os direitos humanos, como Argentina, México, Brasil, Namíbia e Senegal.

Embora a China tenha sido diversas vezes membro do CDH desde a sua criação11. O Conselho de Direitos Humanos da ONU é composto por 47 Estados-Membros eleitos pela maioria da Assembleia Geral da ONU para um mandato de três anos. Os Estados não são elegíveis ao CDH por um ano após cumprirem dois mandatos consecutivos. Os Estados-Membros do CDH são obrigados por uma resolução da Assembleia Geral a “defender os mais altos padrões de direitos humanos”. Ver “Membership of the Human Rights Council for the 17th cycle, 1 January - 31 December 2023,” OHCHR, 2023, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/hr-bodies/hrc/current-members., sua presença e a influência no sistema de direitos humanos da ONU sofreram uma reviravolta desde 2018, quando o Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial (CERD, no original em inglês) da ONU soou o alarme22. “CERD/C/CHN/CO/14-17: Concluding observations on the combined fourteenth to seventeenth periodic reports of China (including Hong Kong, China and Macao, China),” OHCHR, 19 de setembro de 2018, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/documents/concluding-observations/cerdcchnco14-17-concluding-observations-combined-fourteenth. pela primeira vez sobre a detenção em massa de uigures e outras minorias muçulmanas na Região Autônoma Uigur. Logo em seguida, sérias preocupações foram expressas pela então Alta Comissária Michelle Bachelet em seu primeiro discurso ao CDH,33. “39th session of the Human Rights Council,” OHCHR, 10 de setembro de 2018, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/statements/2018/09/39th-session-human-rights-council?LangID=E&NewsID=23518. e por diversos governos, já que a situação dos direitos humanos na China foi revisada no contexto da Revisão Periódica Universal (RPU).44. Durante a terceira RPU da China em 2018, o governo chinês rejeitou todas as 17 recomendações que suscitavam preocupações sobre os direitos humanos do povo uigur e todas as sete recomendações para conceder acesso irrestrito a todas as regiões do país aos especialistas da ONU. “China | UPR recommendations for access to Xinjiang bluntly rejected,” ISHR, 6 de março de 2019, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/latest-updates/china-upr-recommendations-access-xinjiang-bluntly-rejected/.

Pequim reagiu de modo veemente, de forma célere fez investidas em espaços multilaterais para contestar as críticas crescentes e defendeu uma posição implacável sobre suas políticas assimilacionistas em relação às minorias. A retirada dos Estados Unidos do CDH em junho de 2018 também deu a Pequim a oportunidade de se afirmar como um “ator construtivo” no CDH, da mesma forma como a China buscou fazer em outros espaços multilaterais.

A presença chinesa representou um grande desafio para os governos latino-americanos e outros governos progressistas do Sul Global: como evitar desagradar um importante, às vezes, o principal, parceiro comercial e de desenvolvimento, e manter uma posição crível a favor da proteção dos direitos humanos internacionalmente? Em particular, as democracias latino-americanas estavam sendo puxadas para direções opostas por seus dois principais parceiros, China e Estados Unidos, no que consideravam como um conflito exclusivamente geopolítico. Em âmbito nacional, os debates sobre direitos humanos e outras questões delicadas na China também polarizam as opiniões públicas. No entanto, os governos têm evitado reconhecer e abordar a complexidade dessas questões com a China na elaboração de suas posições de política externa, que convergem em alguns tópicos, ao mesmo tempo em que divergem substancialmente sobre algumas prioridades de direitos humanos.

Como uma potência global, a China tem assento nas mesas da ONU e é um interlocutor incontornável em uma série de questões. As preocupações não deveriam se concentrar na presença da China em si, mas na agenda que ela traz consigo, que este artigo busca analisar. Ele buscará, portanto, entender os objetivos e as táticas por trás da crescente influência da China no CDH da ONU, e propor algumas reflexões sobre seu impacto para os governos progressistas da América Latina e de outros países do Sul Global. Para tanto, serão analisadas as negociações e votações de resoluções, declarações e outras ações lideradas ou acompanhadas pela Missão Permanente da China em Genebra, conforme documentado publicamente, ou em privado pelo International Service for Human Rights (Serviço Internacional para os Direitos Humanos – ISHR, no original em inglês).55. A ONU em Genebra é um espaço privilegiado para entender melhor o posicionamento da China nas discussões internacionais sobre os direitos humanos, dado seu compromisso declarado com o multilateralismo e a ausência de foros dentro da China para que ativistas documentem, exponham e busquem justiça para as graves violações de direitos. No entanto, este artigo não pode captar todo o escopo do engajamento da China no CDH e, de forma alternativa aborda tendências relevantes para a posição dos governos do Sul Global.

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I) Evitar críticas a todo custo

Os objetivos da China no CDH foram orientados principalmente pela intenção de conter e responder às crescentes críticas internacionais. Desde as conclusões do CERD em 2018, os órgãos de direitos humanos da ONU66. “China: analysis against the ’objective criteria’ for Human Rights Council action,” ISHR, 23 de setembro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/defenders-toolbox/resources/china-analysis-against-the-objective-criteria-for-human-rights-council-action/. reuniram um conjunto cada vez mais extenso de evidências que expõem violações generalizadas e sistemáticas de direitos humanos cometidas pelo governo chinês, seja contra uigures, tibetanos, cidadãos de Hong Kong ou ativistas e advogados na China continental. Em resposta, o governo chinês mirou nesses órgãos publicamente, questionando abertamente sua autoridade, legitimidade, independência e, em algumas ocasiões, direcionando ataques ad hominem a especialistas independentes.

Ataques a especialistas e órgãos da ONU

Desde 2018, Relatores Especiais e Grupos de Trabalho da ONU, conhecidos como ‘Procedimentos Especiais’, enviaram um total de 83 cartas ao governo chinês e emitiram 28 declarações públicas sobre uma ampla gama de questões. Em três ocasiões, em junho de 2020, junho e setembro de 202277. “UN experts call for decisive measures to protect fundamental freedoms in China,” OHCHR, 26 de junho de 2020, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/press-releases/2020/06/un-experts-call-decisive-measures-protect-fundamental-freedoms-china; “China must address grave human rights concerns and enable credible international investigation: UN experts,” OHCHR, 10 de junho de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/press-releases/2022/06/china-must-address-grave-human-rights-concerns-and-enable-credible; e “Xinjiang report: China must address grave human rights violations and the world must not turn a blind eye, say UN experts,” OHCHR, 7 de setembro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/press-releases/2022/09/xinjiang-report-china-must-address-grave-human-rights-violations-and-world., mais de quarenta deles denunciaram conjuntamente graves violações, instando o CDH a “estabelecer um mecanismo imparcial e independente na ONU para monitorar de perto, analisar e reportar anualmente a situação dos direitos humanos na China”.

O governo chinês contestou sistematicamente todas as alegações, acusando recentemente os especialistas de “atuar como ferramenta política das forças anti-China”88. “Chinese Mission Spokesperson Refutes the Smears by Certain Special Procedure Mandate Holders,” Permanent Mission of the People’s Republic of China to the United Nations Office at Geneva and Other International Organizations in Switzerland, 25 de julho de 2020, acesso em 25 de janeiro de 2023, http://geneva.china-mission.gov.cn/eng/dbtxx/dbtjs/202007/t20200725_8299565.htm. e declarando que eles pretendiam “sequestrar o Conselho de Direitos Humanos para servir à estratégia dos EUA de contenção da China”. Em outra ocasião, a Missão chinesa em Genebra questionou se os especialistas eram “legítimos enquanto especialistas em direitos humanos”, afirmando que eles apenas “defenderam terroristas violentos”.

A China foi ainda além ao apresentar uma resolução na sessão do CDH de setembro de 2019 que buscava revisar os documentos que definiam os métodos de trabalho dos especialistas da ONU, buscando limitar sua capacidade de falar publicamente ou de trabalhar sem interferência externa. Essa iniciativa circulou algumas horas depois de uma declaração conjunta dos Procedimentos Especiais condenando a repressão do governo contra os manifestantes em Hong Kong. Embora, por fim, a resolução não tenha sido submetida para adoção pelo CDH, ela continua sendo uma ameaça à independência do trabalho dos especialistas da ONU, pairando sobre o CDH em todas as sessões.99. Desde então, a Rússia impulsionou, com forte apoio chinês, versões semelhantes da resolução durante outras sessões do CDH.

Os Procedimentos Especiais desempenham um papel decisivo na garantia do monitoramento independente e documentação das violações de direitos humanos em todo o mundo, alertando a comunidade internacional quando as crises são iminentes ou estão se desenrolando, bem como na promoção dos direitos de grupos vulneráveis. Eles são fundamentais para o trabalho da sociedade civil e das pessoas defensoras de direitos humanos, e seu enfraquecimento representa riscos significativos para a proteção dos direitos humanos globalmente. Os governos latino-americanos encabeçaram, e ainda lideram, resoluções criando um número importante de mandatos de Procedimentos Especiais, incluindo o primeiro especialista em direitos LGBT em 2016, bem como especialistas sobre o direito à saúde, discriminação contra mulheres e meninas e direitos dos povos indígenas, dos migrantes e dos idosos.

A China emitiu comentários semelhantes contra outros órgãos de direitos humanos da ONU. Depois que o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) divulgou seu tão esperado relatório1010. “OHCHR Assessment of human rights concerns in the Xinjiang Uyghur Autonomous Region, People’s Republic of China,” OHCHR, 31 de agosto de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/sites/default/files/documents/countries/2022-08-31/22-08-31-final-assesment.pdf. sobre as violações dos direitos humanos na região do povo uigur, um porta-voz da missão chinesa o chamou de “apenas uma farsa tramada por alguns países ocidentais e forças anti-China [que] difamam e caluniam a China e interferem nos assuntos internos do país”.1111. “Chinese Mission spokesperson Liu Yuyin’s remarks on the so-called “assessment” on Xinjiang issued by the OHCHR,” Permanent Mission of the People’s Republic of China to the United Nations Office at Geneva and Other International Organizations in Switzerland, 1 de setembro 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, http://geneva.china-mission.gov.cn/eng/ryrbt/202209/t20220901_10758786.htm.

Mais recentemente, o CERD emitiu uma decisão incomum1212. “China must release Uyghurs, end grave violations, rules UN committee,” ISHR, 25 de novembro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/latest-updates/china-must-release-uyghurs-end-grave-violations-rules-un-committee/. sobre as graves violações contra o povo uigur e as minorias muçulmanas, emitindo uma série de recomendações importantes para a China e lembrando o dever de todos os governos de cooperar para acabar com a discriminação racial e outras graves violações ao direito internacional. Em resposta, a Missão Chinesa declarou que o CERD “era guiado por certas forças” e que não operava “de maneira imparcial e objetiva”.

Moldando narrativas no Conselho de Direitos Humanos

À medida que a China possui uma influência relativamente limitada sobre os órgãos técnicos especializados em direitos humanos, ela busca exercer uma influência muito maior nos órgãos políticos como o CDH. Nesses espaços intergovernamentais, ela faz uso de seu peso diplomático para moldar narrativas a seu favor e atacar quem critica a situação de direitos humanos no país.

Desde junho de 2019, um grupo de governos, em sua maioria ocidentais, começou a denunciar violações contra o povo uigur e contra manifestantes em Hong Kong por meio de declarações conjuntas no CDH e na Assembleia Geral da ONU (AGNU). Com o passar dos anos, o apoio a essas declarações cresceu de 25 para 50 países. Logo em seguida, a China pressionou um grande número de aliados a expressar apoio inabalável às ações de Pequim e denunciar a “interferência nos assuntos da China”, por meio de declarações conjuntas que foram apoiadas por até 69 países.1313. A lista de países tem mudado ao longo do tempo, mas invariavelmente inclui a maioria dos governos africanos e árabes, e aliados próximos da China que também estão sob escrutínio por violações de direitos, incluindo países da América Latina, como Cuba, Venezuela, Bolívia, Nicarágua e El Salvador. Ver “Joint Statement Delivered by Pakistan on Behalf of a Group of Countries at the 51st session of the Human Rights Council,” Permanent Mission of the People’s Republic of China to the United Nations Office at Geneva and Other International Organizations in Switzerland, 26 de setembro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, http://geneva.china-mission.gov.cn/eng/dbdt/202209/t20220927_10772151.htm; e “UNGA77 3C – General Discussion on Agenda Items 66, 67 - Elimination of racism, racial discrimination, xenophobia and related intolerance; Right of peoples to self-determination - Transcript – Cuba (On Behalf of a Group of 66 Countries),” ISHR, 31 de outubro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/wp-content/uploads/2023/01/UNGA77-3C_Cuba-JST.pdf.

Supostamente a China exerceu uma pressão significativa sobre os governos do Sul Global para que eles aderissem a tais declarações e os impediu de endossar as atividades críticas. Em diversas ocasiões, as autoridades chinesas negligenciaram os protocolos diplomáticos tradicionais, ignorando seus interlocutores imediatos em Genebra para buscar apoio de alto nível nos ministérios das relações exteriores nas capitais. No auge da “diplomacia da vacina” em 2021, quando os governos do Sul Global buscaram vacinas chinesas na ausência de suficiente cooperação ocidental, a pressão chinesa levou a Ucrânia a retirar seu apoio a uma declaração crítica à China1414. Jamey Keaten, “AP Exclusive: Diplomats say China puts squeeze on Ukraine.” Associated Press, 25 de junho de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://apnews.com/article/united-nations-china-europe-ukraine-health-a0a5ae8f735b92e39c623e453529cbb9. e a declarações pouco comuns de governos latino-americanos moderados que elogiavam a China por seus esforços na redução da pobreza1515. Colômbia, Equador e República Dominicana elogiaram as conquistas da China no campo de direitos humanos logo após assinarem acordos de entrega de vacinas em 20 de fevereiro, 24 de fevereiro e 17 de março, respectivamente. Ver “Colombia ya cuenta con 192 mil dosis de vacunas de Sinovac,” Ministerio de Salud y Protección Social, 20 de fevereiro de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.minsalud.gov.co/Paginas/Colombia-ya-cuenta-con-192-mil-dosis-de-vacunas-de-Sinovac.aspx; “Laboratorio chino Sinovac firma acuerdo para producir vacunas en Ecuador,” France 24, 24 de fevereiro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.france24.com/es/minuto-a-minuto/20220224-laboratorio-chino-sinovac-firma-acuerdo-para-producir-vacunas-en-ecuador; e “Desde China a RD: Más de un 1 millón de vacunas para combatir el COVID-19,” Presidencia de la República Dominicana, 17 de março de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://presidencia.gob.do/noticias/desde-china-rd-mas-de-un-1-millon-de-vacunas-para-combatir-el-covid-19. ou pediam de modo genérico respeito à soberania nacional.

A pressão chinesa sobre os membros do CDH atingiu outro patamar com a consideração de um projeto de resolução sobre a situação dos direitos humanos em Xinjiang na sessão de setembro de 2022, algumas semanas depois que o Escritório do Alto Comissariado divulgou seu relatório que documentaram, prima facie, provas de crimes contra a humanidade contra o povo uigur e minorias muçulmanas. O muito modesto texto da resolução1616. “Debate on the situation of human rights in the Xinjiang Uyghur Autonomous Region, China,” A/HRC/51/L.6, ISHR, 28 de setembro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/wp-content/uploads/2022/10/L.6-as-received-1.pdf. quase não fazia alusão ao relatório e solicitava que o CDH realizasse um debate sobre a situação em Xinjiang, apesar da extensão e gravidade das evidências documentadas nos órgãos da ONU. Ainda assim, a moção foi rejeitada por 19 votos contra, 17 a favor e 11 abstenções, tornando-se a segunda resolução por país a ser rejeitada pelo CDH.1717. A primeira resolução por país rejeitada foi apresentada em setembro de 2021 e buscava criar um mandato para uma investigação independente sobre a crise no Iêmen “Despite States’ failure, Uyghurs and rights groups won’t give up efforts to hold China accountable at the UN,” ISHR, 6 de outubro de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/latest-updates/despite-states-failure-uyghurs-and-rights-groups-wont-give-up-efforts-to-hold-china-accountable-at-the-un/. Em qualquer outra situação por país com o mesmo grau de documentação da ONU teria ocorrido a adoção de uma resolução proporcionalmente forte. No entanto, o mero pedido de uma discussão sobre Xinjiang e, portanto, sobre a China, foi uma exceção. Enquanto Honduras, Paraguai e Somália estavam entre os poucos países não ocidentais a apoiar a moção, Argentina, Brasil e México lamentavelmente se abstiveram.1818. Durante as negociações, o Brasil manifestou sua oposição ao texto da resolução por considerar que essa apenas “polarizaria” ainda mais o CDH. Durante a votação, México e Argentina mencionaram seu suposto inquebrantável compromisso com o diálogo, antes de declarar que iriam se abster de apoiar a resolução.

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II) Rumo a um sistema de direitos humanos “soberanista”

Apesar da oposição implacável de diversos países, o sistema de direitos humanos da ONU tem se mostrado resiliente e capaz de monitorar graves violações de direitos humanos que ocorrem nas grandes potências,1919. Após o assassinato de George Floyd em 2020, o CDH convocou um debate urgente e adotou uma resolução que citou os Estados Unidos, estabelecendo uma comissão global de inquérito sobre o racismo sistêmico. bem como em contextos onde as instâncias nacionais de reparação estão fechadas: de modo destacado os governos latino-americanos propuseram resoluções para investigar graves violações na Venezuela e na Nicarágua. No entanto, isso também levou a China a desafiar mais abertamente os princípios que sustentam a independência e a eficácia desse sistema.

Protagonismo crescente: uma liderança do Sul Global?

A China alavancou as alianças diplomáticas e intensificou sua liderança entre países que buscam enfraquecer a capacidade dos órgãos de direitos humanos da ONU de monitorar violações em contextos nacionais. A China tornou-se, ao lado da Rússia, um dos principais membros de grupos políticos existentes, como o Grupo “Like-Minded” e o “Movimento dos Não-Alinhados” (NAM, no original em inglês), ou constituiu novos grupos, como o “Grupo de Amigos em Defesa da Carta das Nações Unidas”2020. Estabelecido em 2021, o Grupo de Amigos reúne Argélia, Angola, Bielo-Rússia, Bolívia, Camboja, China, Cuba, Coréia do Norte, Guiné Equatorial, Eritreia, Irã, Laos, Nicarágua, Palestina, Rússia, São Vicente e Granadinas, Síria e Venezuela. Ver “Concept Note for the “Group Of Friends in Defense of the Charter Of The United Nations,” AWS, 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://s3-eu-west-1.amazonaws.com/upload.teamup.com/908040/YXSDbMUTlqryfUrT6Env_Concept-20Note-20GoF-20Defense-20UN-20Charter.pdf. em 2021, que busca promover uma interpretação da Carta da ONU na qual o respeito absoluto pela soberania nacional dos Estados e a “não interferência em assuntos internos” têm primazia perante o escrutínio internacional sobre as violações domésticas de direitos humanos.

A China também se movimentou para retaliar os Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e outros governos que impulsionam iniciativas ocidentais para denunciar as violações de direitos no país, inclusive por meio de declarações conjuntas que dão destaque às violações dos direitos dos povos indígenas, migrantes e outras violações que ocorrem nesses países.

Essa coordenação mais sólida também prejudicou a capacidade do CDH em lidar com situações urgentes nos países. A China e outros membros desses grupos votam sistematicamente contra e tentam enfraquecer o conteúdo2121. Ao longo de 2022, a China, sozinha ou em conjunto com a Rússia e a Bielo-Rússia, tentou em três ocasiões aprovar emendas “hostis” que teriam enfraquecido os textos já discutidos de resoluções sobre o Afeganistão e a Etiópia, uma tática tradicionalmente muito usada pela Rússia. das resoluções que denunciam ou exigem investigações sobre abusos de direitos em países específicos. A China vota contra todas as resoluções por país, incluindo aquelas apresentadas a pedido do país em questão (Geórgia e Ucrânia), com exceção das resoluções sobre a Palestina, as quais são consistentemente endossadas pela China.

Em junho de 2022, a China liderou uma declaração conjunta apoiada por 35 países2222. Bahrein, Bangladesh, Belarus, Bolívia, Burundi, Camboja, Camarões, China, Comores, Congo, Cuba, Egito, Irã, Kuwait, Laos, Malásia, Nicarágua, Coréia do Norte, Omã, Catar, Rússia, Arábia Saudita, Senegal, Somália, Serra Leoa, África do Sul, Sri Lanka, Sudão, Síria, Tadjiquistão, Turcomenistão, Emirados Árabes Unidos, Venezuela, Iêmen e Zimbábue. que critica o CDH por se tornar “cada vez mais politizado e agressivo” e solicita que “os mecanismos multilaterais de direitos humanos cumpram os propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas [e] oponham-se à politização e instrumentalização das questões de direitos humanos, dois pesos e duas medidas, bem como à interferência nos assuntos internos dos Estados-Membros sob o pretexto dos direitos humanos”. O grupo de países liderado pela China também denunciou o que denominou como uma “desinformação desenfreada” – frequentemente usado para tirar a legitimidade de relatórios de ONGs independentes – e pediu aos mecanismos multilaterais que “trabalhem com base em informações autênticas e objetivas, e respeitem a soberania dos Estados”.

Lógica “ganha-ganha”: repensando os princípios da cooperação e do multilateralismo

Além de iniciativas conjuntas com aliados afins, a China também tentou sozinha promover seu próprio entendimento sobre quais deveriam ser os princípios que sustentam o sistema multilateral de direitos humanos.

Em março de 2018, a China apresentou sua primeira resolução sobre “cooperação mutuamente benéfica no campo dos direitos humanos” (conhecida como resolução “ganha-ganha”).2323. “Promoting mutually beneficial cooperation in the field of human rights,” A/HRC/RES/37/23, OHCHR, 6 de abril de 2018, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ap.ohchr.org/documents/dpage_e.aspx?si=A/HRC/RES/37/23. O país apresentou a resolução como uma forma de fortalecer o multilateralismo – esse conceito propõe ressignificar a cooperação no campo dos direitos humanos rumo a um diálogo não conflituoso no qual os governos são os principais beneficiários ao invés dos detentores de direitos. Segundo essa abordagem centrada no Estado, a cooperação se limita a áreas temáticas consensuais onde as melhores práticas podem ser compartilhadas, longe do escrutínio público ou debate sobre questões sensíveis.

A resolução criou um mandato para que o think tank do CDH, o Comitê Consultivo,2424. O grupo de elaboração do relatório foi presidido pelo membro do Comitê Consultivo indicado pela China, Liu Xinsheng, ex-embaixador e alto funcionário do Ministério das Relações Exteriores. produzisse um relatório sobre esse tópico que serviu de base para as resoluções subsequentes em março de 2020 e março de 2021.2525. Março de 2020: “Resolution adopted by the Human Rights Council on 22 June 2020,” A/HRC/RES/43/21, UN Docs, 2 de julho de 2020, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://undocs.org/Home/Mobile?FinalSymbol=A%2FHRC%2FRES%2F43%2F21&Language=E&DeviceType=Tablet&LangRequested=False; Março de 2021: “Resolution adopted by the Human Rights Council on 23 March 2021,” A/HRC/RES/46/13, UN Docs, 31 de março de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G21/076/60/PDF/G2107660.pdf?OpenElement. Embora o termo “cooperação mutuamente benéfica” tenha sido saudado internamente pelo governo e pelo Partido Comunista Chinês (PCC) como um importante slogan político, ele não tem fundamento no direito internacional. Contudo, podemos inferir da submissão chinesa para o relatório do Comitê Consultivo que a iniciativa busca promover “a construção de um novo tipo de relações internacionais”.

A cooperação “ganha-ganha” postula a cooperação intergovernamental amistosa como um objetivo em si, ao invés de um meio para proteger os direitos humanos, desconsiderando os casos nos quais as violações de direitos são o resultado de ação intencional do Estado e/ou falta de vontade política para repará-los. Décadas de negociações sobre o mandato dos órgãos de direitos humanos da ONU gradualmente moldaram um frágil equilíbrio entre garantir diálogo e cooperação construtivos, investigar violações graves e criar mecanismos de responsabilização, com consentimento ou não do governo responsável pelas violações, com vistas ao cumprimento do mandato central do CDH: prevenir e tratar de graves e sistemáticas violações de direitos humanos onde quer que elas ocorram. Embora as três resoluções tenham sido adotadas pelo CDH, um número importante de delegações do Sul Global expressou desconforto ou oposição ao votar contra o texto, abster-se na votação ou reiterar apreensões2626. Votaram contra o texto Índia, Ilhas Marshall, Ucrânia e todos os membros da CDH do Leste Europeu; se abstiveram na votação: Bahamas, Chile, Peru, Fiji, Armênia, Malawi, Líbia, Uzbequistão, Afeganistão, República Democrática do Congo, Ruanda, Tunísia e Geórgia; e México, Uruguai e Panamá reiteraram algumas apreensões. com a falta de clareza conceitual sobre os termos domésticos chineses incluídos e a falta de menção ao papel de monitoramento do CDH como complementar à cooperação.

Fechando espaços para a sociedade civil

Em seus esforços para promover um CDH voltado aos Estados, a China trabalhou ativamente para restringir o espaço da sociedade civil independente, tanto da China quanto do exterior, nos fóruns da ONU.

A China está entre os cinco principais perpetradores de represálias contra atores da sociedade civil que cooperam ou buscam cooperar com a ONU, seus órgãos e representantes, de acordo com informações do “relatório anual de represálias” do secretário-geral da ONU.2727. Em seu relatório anual sobre atos de represálias contra atores da sociedade civil que cooperam ou buscam cooperar com a ONU, o secretário-geral relatou 43 casos de represálias contra ativistas por parte da China até o momento presente. Ver “UN Action on Reprisals: Towards Greater Impact,” ISHR, 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/wp-content/uploads/2021/05/ISHR_Reprisals-Report_Web_20210503.pdf. Juntamente com a Arábia Saudita, é o país citado com mais frequência desde 2010 (em 11 dos 13 relatórios anuais existentes) e figura entre os 11 países onde o secretário-geral identificou “padrões de represálias”. Para abordar essa questão, a Missão Chinesa adotou uma abordagem negacionista, enquadrando ativistas como “criminosos”, criticando os relatórios da ONU como “tendenciosos” e denunciando a interferência em sua “soberania judicial”. Exemplos dignos de destaque incluem o caso de Cao Shunli,2828. “Cao Shunli (曹顺利),” Chinese Human Rights Defenders, 1 de março de 2019, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.nchrd.org/2019/03/cao-shunli/. defensora que pressionou o governo a dialogar com a sociedade civil chinesa antes da RPU chinesa e que morreu sob custódia após ser detida no aeroporto a caminho de participar da revisão da RPU chinesa de 2014 em Genebra. Bem como o caso de Jiang Tianyong,2929. “Jiang Tianyong (江天勇),” Chinese Human Rights Defenders, 20 de fevereiro de 2017, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.nchrd.org/2017/02/jiang-tianyong/. um advogado de direitos humanos que desapareceu após se encontrar com o relator especial sobre pobreza extrema e direitos humanos durante sua visita à China em 2016. Posteriormente, Jiang foi detido por três anos sob a acusação de “incitar a subversão do poder do Estado”, e segue sendo vigiado até hoje.

Ativistas e vítimas uigures sempre sofreram o impacto dos esforços da China para minar o espaço para a sociedade civil. Duas importantes ONGs uigures, World Uyghur Congress (Congresso Mundial Uigur, na tradução livre ao português) e Uyghur Human Rights Projects (Projetos de Direitos Humanos Uigures, na tradução livre ao português) foram constantemente interrompidas pela delegação chinesa enquanto falavam no CDH, que solicitava ao presidente do CDH que não desse a palavra a “organizações terroristas”. Essas ONGs também tiveram seus relatórios aos comitês da ONU retirados da internet e, em algumas ocasiões, foram expulsas das instalações da ONU.

Em abril de 2017, o presidente do World Uyghur Congress, Dolkun Isa, foi expulso3030. “Uyghur Human Rights Activist Expelled from UNPFII,” UNPO, 08 de maio de 2017, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://unpo.org/article/20072., sem nenhuma explicação dada pelos seguranças da ONU, do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas realizado na sede da ONU em Nova Iorque, apesar de ser um participante de uma ONG credenciada pela ONU. No ano seguinte, uma tentativa semelhante3131. “UNPO Vice President Finally Admitted To UN Indigenous Forum,” UNPO, 26 de abril de 2018, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://unpo.org/article/20769. foi feita para impedir sua participação no Fórum, negando a Isa uma autorização de acesso, que acabou sendo concedida após supostas pressões feitas pela Alemanha e Estados Unidos. O ex-chefe do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU (UNDESA, no original em inglês) Wu Hongbo chegou a admitir, em uma entrevista à televisão pública chinesa um ano depois, que deu a ordem de expulsar Isa por ele ser um “separatista” e um “criminoso”. Wu Hongbo também declarou que “quando se trata da soberania e segurança nacional chinesa, (as autoridades chinesas na ONU), sem dúvida, defenderão os interesses de nosso país”.3232. “CCTV Interview with Wu Hongbo,” World Uyghur Congress, Página do Facebook, 25 de abril de 2019, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.facebook.com/watch/?v=649658305496919.

A Missão Permanente da China em Genebra também pressiona de modo regular3333. “The Permanent Mission of the People’s Republic of China to the United Nations Office at Geneva and Other International Organizations in Switzerland,” HRW, 7 de março de 2019, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.hrw.org/sites/default/files/supporting_resources/hrcletterchina20190329.pdf. outras delegações a não se encontrarem com ativistas uigures ou comparecerem a seus eventos. Os membros da Missão fizeram comentários acusatórios contra palestrantes uigures quando compareceram a tais eventos. Ao mesmo tempo, um número crescente de GONGOs chinesas (“ONGs” filiadas ao partido ou ao governo”) ocupou os foros em Genebra, superlotando os espaços de fala da sociedade civil, vigiando e intimidando as ONGs independentes em risco que buscam participar de reuniões formais da ONU: durante a adoção da RPU da China em março de 2019, seis das dez ONGs autorizadas a falar eram GONGOs.

A China e diversos países3434. Outros membros do Comitê das ONGs que regularmente postergam os pedidos de ONGs incluem Cuba, Rússia, Israel, Nicarágua, Paquistão, Índia, Turquia, Bahrein e Grécia. com assento entre os 19 membros do Comitê das ONGs em Nova Iorque bloqueiam e repetidamente postergam, por meio de táticas processuais anuais, as solicitações de ONGs para o status do ECOSOC, um pré-requisito para que as ONGs acessem certos foros na ONU. Somente na última sessão do Comitê (setembro de 2022), a China foi responsável por 83 dos 418 diferimentos de candidaturas de ONGs da Rússia, Egito, Coreia do Norte, Estados Unidos, Índia e outros países, incluindo ONGs bem estabelecidas, como Uyghur Human Rights Project, Urgent Action Fund for Women’s Human Rights (Fundo de Ação Urgente pelos Direitos Humanos das Mulheres, na tradução livre ao português) e a ONG do Camboja Khmers-Kampuchea-Krom Federation (“Federação Khmers-Kampuchea-Krom”, na tradução livre ao português), cuja inscrição vem sendo postergada continuamente nos últimos dez anos. Como as solicitações de ONGs e GONGOs também foram postergadas pelos EUA e por alguns países ocidentais do Comitê, a sociedade civil há muito pede uma ampla reforma do Comitê das ONG, a fim de fortalecer o acesso da sociedade civil à ONU.

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III) Reformulando os padrões internacionais de direitos humanos

O governo chinês também busca desenvolver normas de direito internacional no campo de direitos humanos, incorporando gradualmente conceitos domésticos em textos e narrativas, como “ganha-ganha” ou uma “comunidade de futuro compartilhado para a humanidade”.3535. Para maiores detalhes: “What China Says, What China Means: And What This Means For Human Rights,” Amnesty International and Urgewald, 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://whatchinasays.org. A China redobrou seus esforços desde 2017 para introduzir resoluções e fazer declarações que buscam infundir gradualmente essa terminologia em textos e narrativas internacionais de direitos humanos. Ao fazer isso, o governo chinês forja sua imagem como um contribuinte ativo para o desenvolvimento normativo dos direitos humanos, buscando exibir apoio internacional para seus slogans políticos.

A agenda do desenvolvimento

Em junho de 2017, a China apresentou sua primeira resolução ao CDH sobre as “contribuições do desenvolvimento para a efetivação dos direitos humanos”.3636. “Resolution adopted by the Human Rights Council on 22 June 2017,” A/HRC/RES/35/21, UN Docs, 7 de julho de 2017, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G17/184/81/PDF/G1718481.pdf?OpenElement. A breve resolução fracassou em trazer um valor agregado substancial para as discussões sobre desenvolvimento; ao invés disso, convocou todos os países a “efetivar o desenvolvimento centrado nas pessoas” e promover “resultados ganha-ganha e desenvolvimento comum” sem definir tais termos nem fornecer seus fundamentos no direito internacional. A resolução também solicitava que o Comitê Consultivo do CDH elaborasse um estudo sobre o tema.3737. O relatório foi mais uma vez produzido por um grupo de redação presidido pelo especialista chinês do comitê e ex-embaixador, Liu Xinsheng. A China utilizou a linguagem do relatório, que se baseou em grande medida na submissão da própria China, para apresentar duas resoluções adicionais sobre o assunto em junho de 2019 e junho de 2021. As três resoluções (2017, 2019 e 2021) foram amplamente adotadas pelo CDH, com poucas abstenções (Geórgia, Panamá, Paraguai, Armênia, Bahamas) e oposições vindas principalmente de Estados da Europa Ocidental e Oriental, Japão, Coréia do Sul e Ilhas Marshall.

O relatório do Comitê e a negociação da resolução de 20193838. “Resolution adopted by the Human Rights Council on 12 July 2019,” A/HRC/RES/41/19, UN Docs, 17 de julho de 2019, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G19/218/41/PDF/G1921841.pdf?OpenElement. deram espaço para narrativas que sugeriam uma abordagem sequencial na qual o desenvolvimento aparece não apenas como um processo ou resultado, mas também como uma pré-condição para a efetivação dos direitos humanos. No entanto, as agências da ONU3939. Ver UNSDG (Grupo das Nações Unidas para o Desenvolvimento, na denominação em português): a abordagem baseada em direitos humanos (HRBA, na sigla em inglês) é um dos seis Princípios Orientadores do Quadro de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável da ONU. Ver “Principle One: Human Rights-Based Approach,” UNSDG, (s.d.), acesso em 25 de janeiro de 2023, https://unsdg.un.org/2030-agenda/universal-values/human-rights-based-approach. e a sociedade civil há muito apoiam uma “abordagem baseada em direitos humanos” para o desenvolvimento, um conceito que não aparece no texto e que a delegação chinesa busca excluir sistematicamente de qualquer resolução negociada pelo CDH. Essa “abordagem baseada em direitos humanos” garante que o desenvolvimento não seja simplesmente uma provisão de crescimento econômico conduzida pelo governo de cima para baixo, mas um processo transparente e inclusivo que considera os beneficiários como detentores de direitos empoderados e não gera violações de direitos humanos. Está bem estabelecido que os direitos humanos e o desenvolvimento são interdependentes, e que o compromisso de “não deixar ninguém para trás” só pode ser alcançado através de uma abordagem baseada em direitos.

Reivindicando direitos econômicos, sociais e culturais

A China também promoveu iniciativas que parecem contestar padrões bem estabelecidos no campo dos direitos econômicos, sociais e culturais, ao mesmo tempo em que impulsionou conceitos nacionais elusivos em uma linguagem consensual de direitos humanos.

Em setembro de 2020 e 2021, a China propôs duas resoluções sobre uma “abordagem para os direitos humanos centrada nas pessoas” e “a realização de uma vida melhor para todos”, respectivamente.4040. “Draft resolutions, decisions and President’s statements,” OHCHR, 2020, accessed January 25, 2023, https://hrcmeetings.ohchr.org/HRCSessions/RegularSessions/45session/Pages/resolutions.aspx; and “Draft resolutions, decisions and President’s statements,” OHCHR, 2021, accessed January 25, 2023, https://hrcmeetings.ohchr.org/HRCSessions/RegularSessions/48session/Pages/resolutions.aspx. Repetidas solicitações de países de todas as regiões4141. Incluindo México, Uruguai, Argentina, Panamá, Brasil, Índia, Botswana, Ucrânia e Coréia do Sul. por mais clareza conceitual não foram substancialmente atendidas pela delegação chinesa, incapaz de definir sucintamente qualquer um dos conceitos e, ao invés disso, baseava-se “entendimento comum” dos diplomatas. Um informe oficial de 2021 aponta como esses e outros slogans políticos estão no centro do trabalho ideológico do PCC.4242. O mesmo informe oficial de 2021 apresentou uma abordagem para os direitos humanos centrada nas pessoas da seguinte forma: “O PCC vem do povo e tem suas raízes no povo. Ele serve o povo e busca melhorar seu bem-estar. Colocar as pessoas em primeiro lugar e garantir a sua importância central sempre foi o cerne da visão do PCC sobre direitos humanos. Em sua carta ao seminário sobre o 70º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o presidente Xi Jinping propôs que viver uma vida feliz é o direito humano primário, dando um novo significado para os avanços da China no campo de direitos humanos na nova era.” Ver “The Communist Party of China and Human Rights Protection -A 100-Year Quest,” Embassy of the People’s Republic of China in United Arab Emirates, 5 de julho de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, http://ae.china-embassy.gov.cn/eng/xwdt/202107/t20210705_8909901.htm. Ambos os projetos de resolução diluíram a linguagem baseada em direitos humanos consagrada em tratados internacionais, mudando o foco dos indivíduos como detentores de direitos econômicos, sociais e culturais para destinatários do desenvolvimento socioeconômico. Isso representa um risco importante de alterar padrões normativos e obrigações do Estado nesse campo: falando em nome de mais de 50 países em uma declaração conjunta de setembro de 20214343. “Joint Statement Delivered at the Interactive Dialogue with the Expert Mechanism on the Right to Development at the 48th Session of the Human Rights Council,” ISHR, 16 de setembro de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://ishr.ch/wp-content/uploads/2023/01/China-JST-on-Right-to-Development.pdf. sobre o direito ao desenvolvimento, a China enfatizou que “devemos buscar o desenvolvimento centrado nas pessoas e atender as aspirações das pessoas para uma vida melhor”. Apesar do lobby significativo, a China retirou ambas resoluções algumas horas antes de suas respectivas votações pelos membros do CDH em 2020 e 2021, uma conduta raramente vista no CDH, por falta de apoio suficiente do Sul Global, em particular da América Latina.

Ao mesmo tempo, a China reivindicou a liderança em uma série de outras agendas. Em setembro de 2021, o país apresentou uma resolução histórica sobre o impacto dos legados do colonialismo nos direitos humanos, embora não tenha conseguido incluir países africanos, latino-americanos e de outras regiões anteriormente colonizadas entre os promotores da iniciativa.4444. A resolução foi aprovada com o apoio de 27 membros do CDH, enquanto 20 países se abstiveram, incluindo Mauritânia, Togo, Senegal, Uzbequistão, Líbia, Ilhas Marshall, Bahrein, Europa Oriental e governos ocidentais. Ver “Resolution adopted by the Human Rights Council on 8 October 2021,” A/HRC/RES/48/7, UN Docs, 14 de outubro de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G21/286/52/PDF/G2128652.pdf?OpenElement. Ainda assim, a moção gerou a primeira discussão do CDH sobre o impacto do colonialismo nos direitos humanos inteiramente conduzida por um painel de especialistas da ONU sobre racismo, direitos indígenas e justiça de transição e abriu um importante espaço para ativistas de povos originários americanos, palestinos e outros para se dirigirem diretamente à ONU. Em março de 2022, a China trabalhou com Bolívia, Egito, Paquistão, África do Sul, Venezuela e Iêmen para apresentar uma resolução sobre a promoção dos direitos econômicos, sociais e culturais na recuperação da Covid-19.4545. A resolução foi aprovada com o apoio de 31 membros do CDH, enquanto México e Ucrânia se abstiveram, Honduras, Coreia do Sul, Japão, Ilhas Marshall e Estados da Europa Ocidental e Oriental votaram contra. Ver “Resolution adopted by the Human Rights Council on 1 April 2022,” A/HRC/RES/49/19, UN Docs, 8 de abril de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G22/303/98/PDF/G2230398.pdf?OpenElement. Também encabeçou uma série de declarações em nome de um grande grupo de países do Sul Global denunciando a desigualdade de vacinas e pedindo maior solidariedade internacional nos esforços de recuperação da Covid-19.

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IV) Quais as implicações para a América Latina e para o Sul Global?

Os esforços diplomáticos da China para promover uma agenda conservadora, centrada no estado e soberanista de direitos humanos apresentam desafios significativos para os governos progressistas do Sul Global. À medida que as tensões geopolíticas entre as grandes potências se intensificam, eles contam com um sistema multilateral de direitos humanos robusto, justo e independente, capaz de promover uma cooperação significativa e responsabilizar os violadores de forma equânime. Com a ascensão do conservadorismo e do autoritarismo, o CDH em Genebra aparece como um foro indispensável para proteger e promover os direitos dos grupos oprimidos em todo o mundo. Uma agenda robusta e crescente de direitos humanos também é condição sine qua non para promover um desenvolvimento sustentável e inclusivo, enfrentar desigualdades profundas e combater as mudanças climáticas.

No entanto, as tensões entre a China e os países progressistas do Sul Global em relação aos direitos humanos tornaram-se palpáveis. As negociações que se encontram principalmente nas mãos do grupo G77+China4646. O grupo G77 + China foi estabelecido em 1964 por 77 países em desenvolvimento (atualmente, foi expandido para 134 países) para aumentar a capacidade de negociação coletiva sobre interesses econômicos e outros interesses comuns. Embora a China apoie o grupo política e financeiramente, ela não se considera um membro oficial dele. sobre o orçamento da ONU são um exemplo indicativo: dentro do grupo, os direitos humanos aparecem como uma fonte de atrito dominante entre a China e países latino-americanos como Uruguai e México, que dedicam esforços consideráveis para limitar as restrições ao pilar de direitos humanos da ONU, que é, em grande medida, subfinanciado.4747. Os Direitos Humanos são um dos três pilares principais da ONU (juntamente com Paz e Segurança, e Desenvolvimento), mas recebem apenas 2,8% do orçamento regular da ONU.

Os esforços da China para contestar os padrões de direitos humanos, enfraquecer a independência e o trabalho dos órgãos de direitos humanos da ONU na responsabilização de governos, restringir o espaço da sociedade civil na ONU e promover uma abordagem do multilateralismo de direitos humanos na qual a cooperação intergovernamental “ganha-ganha” se sobrepõe aos detentores de direitos e vítimas, aponta para três desafios para os países latino-americanos progressistas.

Em primeiro lugar, a tentativa da China de liderar os países do Sul Global em questões de importância histórica para eles, incluindo o desenvolvimento, direitos econômicos, sociais e culturais e cooperação internacional, não leva em consideração as enormes diferenças na cultura política, nos sistemas políticos e nas sociedades entre os países do Sul Global. Enquanto os países latino-americanos são protagonistas no desenvolvimento normativo de temas como os direitos das pessoas LGBTQIA+, mulheres, povos indígenas ou na luta contra a mudança climática, na maioria das vezes em contraste com a China, os atritos sobre direitos econômicos, sociais e culturais são claros. Ao instrumentalizar as discussões bastante necessárias sobre o caráter centrado no Ocidente do sistema de direitos humanos, a China jogou a carta da oposição ao Norte Global para afirmar sua liderança sobre diversas agendas do Sul Global. Essa narrativa desconsidera o papel central desempenhado pelas ativistas e diplomatas feministas da América Latina e de outros países do Sul Global na decolonização e defesa da igualdade de gênero no emergente arcabouço internacional de direitos humanos. A decolonização de um sistema de direitos humanos centrado no Ocidente é indispensável, mas a imposição chinesa de suas prioridades nas agendas do Sul Global não contribui para a construção de um sistema multilateral mais justo. Os países progressistas do Sul Global devem reconhecer suas diferenças e reivindicar sua liderança em áreas-chave dos direitos humanos, ao mesmo tempo em que concebem um sistema que responsabilize todos os países de modo igualitário, sem exceções.

Fazer isso aponta para um segundo desafio: a ausência de uma posição suficientemente forte e coordenada entre os países do Sul Global que possa efetivamente liderar uma agenda progressista de direitos humanos, para além de áreas específicas, independentemente tanto do Norte Global quanto da China e de outros aliados soberanistas. Apesar de seu peso econômico limitado, a América Latina desempenhou um papel historicamente decisivo na construção do atual sistema multilateral. No entanto, após uma década de erosão do regionalismo, a região aparentemente luta para se afirmar como um ator diplomático influente capaz de liderar uma agenda de direitos humanos coletiva, autônoma e do Sul Global, contra as potências grandes e hegemônicas.

Além de recuperar a liderança sobre um conjunto de temas, os países progressistas do Sul Global devem trabalhar juntos para enfrentar o desafio “soberanista” colocado pela China e por autocracias com ideias semelhantes, de uma forma robusta e coordenada. O que inclui não somente estar na vanguarda do desenvolvimento normativo dos direitos humanos, como também se esforçar para fortalecer a arquitetura multilateral de direitos humanos da ONU para garantir que ela seja amplamente respaldada, com recursos adequados e capaz de trabalhar de forma independente, com a sociedade civil, vítimas e pessoas defensoras de direitos humanos em seu cerne. Desde proteger as mulheres e os direitos LGBTQ+, alcançar a equidade de acesso às vacinas e defender a responsabilidade corporativa transnacional, até reformar o Comitê das ONGs, há muito o que ser feito: unir forças é, portanto, imperativo.

O terceiro desafio é dar uma resposta baseada em princípios à situação dos direitos humanos na China. Em uma declaração pública4848. “China must address grave human rights concerns and enable credible international investigation: UN experts,” OHCHR, 10 de junho de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.ohchr.org/en/press-releases/2022/06/china-must-address-grave-human-rights-concerns-and-enable-credible. de junho de 2022 sobre a crise de direitos humanos na China, mais de 40 especialistas da ONU lançaram um raro alerta ressaltando que “assegurar os mesmos padrões e sua aplicação equânime a todos os Estados grandes e pequenos é importante para manter a integridade, a credibilidade e autoridade moral do CDH e [do sistema de direitos humanos] da ONU”. A China pode ser sem dúvida um dos testes mais difíceis da capacidade do CDH de cumprir seu mandato e de dar respostas às crises mais graves, independentemente do poder do perpetrador: no entanto, o Conselho falhou em fazer isso, em setembro de 2022, rejeitando uma moção para debater o tratamento dado pela China ao povo uigur. Num futuro próximo, qualquer iniciativa semelhante enviará um sinal crucial a outros perpetradores, isto é, se a comunidade internacional está disposta a tolerar ou até mesmo aceitar tal comportamento. O que exigirá que governos como o da Argentina e México, que se abstiveram em setembro de 2022, mantenham consistência com suas posições em relação às situações de outros países, ajam de forma consistente com seu suposto compromisso com uma política externa feminista sem negligenciar as mulheres das comunidades-alvo e garantam que a China não seja uma exceção.

Os dissidentes perseguidos fora das fronteiras da China, as pessoas que buscavam refúgio e foram devolvidas à China e sujeitas à tortura e desaparecimentos, as tecnologias de vigilância exportadas para o mundo todo, o impacto dos direitos humanos sobre os negócios chineses no exterior: embora a repressão dentro da China possa ter anteriormente limitado as implicações dentro das fronteiras dos países do Sul Global, o cenário agora mudou. Para os governos progressistas do Sul Global, responder de forma adequada à crise de direitos humanos na China não é somente um dever moral, mas também uma necessidade pragmática e um (difícil) teste da sua própria credibilidade na proteção dos direitos humanos.

Dar respostas adequadas a essa situação demanda coragem política, bem como percepção e compreensão do impacto de longo prazo de (não) fazê-lo. De modo concreto, as chancelarias precisam moldar uma posição de política externa em relação à China que considere adequadamente os direitos humanos entre outras prioridades existentes, como negócios ou cooperação ambiental. Os governos devem aumentar suas capacidades diplomáticas, consultar de forma regular e considerável, e ter relações com os defensores de direitos humanos independentes, com a sociedade civil e com acadêmicos chineses com experiência relevante, a fim de elaborar uma posição que seja informada adequadamente.

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Conclusão: construindo uma solidariedade transnacional com o movimento de direitos humanos da China

O movimento de direitos humanos da China permanece isolado e raramente se beneficia de ações de solidariedade da sociedade civil no Sul Global. Embora as barreiras culturais e linguísticas constituam um obstáculo evidente, a estratégia do governo de “dividir e conquistar” a sociedade civil dentro do país e de promover internacionalmente uma narrativa que desqualifica a defesa dos direitos humanos na China como meramente uma contenção impulsionada pelo Ocidente ampliou muito esse isolamento. Na América Latina, as preocupações com os direitos humanos na China são frequentemente instrumentalizadas por forças anticomunistas ou descartadas em nome do “anti-imperialismo”. Isso impede debates objetivos sobre as evidências documentadas pela ONU e pela sociedade civil, e afasta as vozes daqueles que deveriam conduzir o debate: as vítimas e as pessoas defensoras de direitos humanos.

Em sistemas democráticos onde a sociedade civil é capaz de fazer os governos prestarem contas por suas decisões políticas, a elaboração da política externa não pode ignorar a opinião pública. No entanto, relatos sobre detenções em massa, desaparecimentos e outros graves violações de direitos humanos na China, mesmo quando documentados pela ONU, bem como ações de solidariedade com uigures, tibetanos, habitantes de Hong Kong ou ativistas chineses são, na melhor das hipóteses, raras, ou na maioria das vezes inexistentes no Global Sul.

A solidariedade transnacional no Sul Global com o movimento de direitos humanos da China é indispensável. Desenvolvê-la exigirá que a sociedade civil se informe ativamente sobre a situação no terreno, analise a extensa gama de documentação do ACNUDH e de todos os especialistas e mecanismos de direitos humanos da ONU e, acima de tudo, ouça em primeira mão as pessoas defensoras de direitos humanos e vítimas de violações do Uigur, Tibete, Hong Kong e da China.4949. Exemplos positivos incluem entrevistas com as defensoras chinesas de direitos humanos Xu Yan: João Paulo Charleaux, “O estado dos direitos humanos na China, segundo esta ativista.” NEXO, 26 de fevereiro de 2021, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2021/02/26/O-estado-dos-direitos-humanos-na-China-segundo-esta-ativista; Sophie Luo e Mindy Shi in Macarena Vidal Liy, “Hostigadas en China por defender a sus maridos.” El País, 27 de junho de 2022, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://elpais.com/internacional/2022-06-27/hostigadas-en-china-por-defender-a-sus-maridos.html; e Li Wenzu et al., “No 5º aniversário da ’repressão de 709’, na China, apresentamos nosso lado da história.” Folha de S.Paulo, 9 de julho de 2020, acesso em 25 de janeiro de 2023, https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/07/no-5o-aniversario-da-repressao-de-709-na-china-apresentamos-nosso-lado-da-historia.shtml. Ela também exigirá que as entidades de direitos humanos recuperem as discussões nacionais sobre os direitos humanos na China, afastando essas discussões de posições partidárias, interesses econômicos e superando a narrativa predominante de “Ocidente versus China”.

Em 2023, Chile e Costa Rica estarão entre os 47 membros do CDH, ao lado de Argentina, México, Honduras e Paraguai. Um novo alinhamento regional entre governos progressistas recém-eleitos na América Latina oferece uma chance única para a tomada de posições coordenadas, informadas e baseadas em princípios capazes de lidar com as violações de direitos humanos da China e sua agenda soberanista em espaços multilaterais de direitos humanos. A América Latina progressista estará à altura do desafio?

Raphael Viana David - Brasil

Raphael Viana David trabalha no International Service for Human Rights (Serviço Internacional para os Direitos Humanos - ISHR, no original em inglês) em Genebra (Suíça), onde presta apoio e advoga a favor das pessoas defensoras de direitos humanos na China e na América Latina no âmbito da ONU. Raphael tem nacionalidade brasileira e francesa, estudou direitos humanos, estudos chineses e política latino-americana, na França e na China.

Recebido em Janeiro de 2023.

Original em inglês. Traduzido por Fernando Sciré.