Desafios à maior crise humanitária da América do Sul
O objetivo deste artigo é compreender a interação entre o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e o governo colombiano nos esforços de mitigação do deslocamento interno forçado, bem como os principais desafios enfrentados na abordagem do problema. Este artigo privilegia a leitura adotada pelos atores mencionados acima, a qual vincula o deslocamento ao conflito armado vivenciado pelo país há mais de quarenta anos. Embora se trate de um problema observado há décadas, as formulações políticas nacionais com vistas à sua mitigação surgiram tardiamente, mais precisamente, em meados da década de 1990. Da mesma forma, a atenção do ACNUR ao problema somente foi intensificada em finais dessa mesma década. O artigo conclui que existe uma grande assimetria entre o desenvolvimento normativo de atenção aos deslocados observado na Colômbia e a execução de tais normas. Por exemplo, falta coordenação entre entidades nacionais e sub-nacionais, assim como entre as nacionais e as internacionais. No que diz respeito à prevenção do deslocamento interno e avaliação do impacto das políticas, o desafio é ainda maior, na medida em que são embrionários os esforços neste sentido. Sustenta-se que o ACNUR tem empregado os mesmos critérios que o governo na execução de suas tarefas, quando estes poderiam ser repensados e redefinidos à luz da experiência do Alto Comissariado.
Existem cerca de 13,5 milhões de deslocados internos no mundo atualmente (ACNUR, 2007). Destes, 3 milhões encontram-se na Colômbia. Ainda que as fontes divirjam quanto ao número de deslocados colombianos, coincidem na conclusão de que se trata de uma tendência crescente e preocupante. Além de ter seus direitos políticos, econômicos, sociais e civis violados, os deslocados internos têm suas redes sociais de apoio desarticuladas, o que afeta sua capacidade de construir e sustentar a vida em comunidade.
Existem diversas explicações para o deslocamento interno na Colômbia. Para alguns autores, a violência propagada pelo conflito armado – entendido como o embate entre guerrilhas e paramilitares, e guerrilhas e governo nacional – explica somente parte desses fluxos. Com efeito, os deslocamentos já podiam ser observados no século XIX, quando as guerras de independência, as disputas pelo poder entre os dois tradicionais partidos colombianos e os movimentos de colonização de novas terras responderam por grande parte do deslocamento massivo de indivíduos.
Apesar de reconhecer a pertinência das múltiplas vertentes explicativas para o deslocamento forçado na Colômbia, este artigo privilegiará a leitura que vincula diretamente a evolução do deslocamento forçado ao conflito armado vivenciado pelo país. Esta é a interpretação aplicada nas políticas de atenção à população deslocada levadas a cabo pelo governo nacional e pelas agências internacionais, atores que constituirão foco de análise do presente artigo.
Cabe ressaltar que o deslocamento massivo de indivíduos tardou a figurar entre as prioridades políticas durante grande parte da história do país, o que fez com que este problema se prolongasse ao longo das décadas e o número de populações nessas condições aumentasse significativamente. Os primeiros delineamentos normativos sobre o tema ocorreram somente a partir de 1997, ano de promulgação da Lei 387, referencial sobre a matéria. A relevância do debate sobre o deslocamento forçado na Colômbia reside justamente no caráter tardio das respostas governamentais, o que permitiu que o fenômeno adquirisse dimensões preocupantes.
A degeneração do quadro humanitário na Colômbia despertou, em finais da década de 1990, a atenção do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), que, a pedido do governo colombiano, instalou um escritório de representação em Bogotá. A atuação do ACNUR ocorre em duas frentes: de um lado, a capacitação de agências governamentais; de outro, o trabalho junto às vítimas do deslocamento forçado.
O presente artigo busca analisar as principais iniciativas nacionais e internacionais – destacadamente, do ACNUR – de atenção à população deslocada. Para tal, será apresentada uma breve análise sobre as características do deslocamento interno na Colômbia, por meio da qual se pretende identificar, na seção relativa às políticas governamentais e do ACNUR, se os desafios relacionados a esse problema foram incorporados aos esforços de sua superação. Espera-se oferecer um instrumental capaz de auxiliar na reflexão crítica acerca das políticas de atenção à população deslocada no que diz respeito à superação e prevenção deste fenômeno.
O estudo do fenômeno do deslocamento interno na Colômbia tem privilegiado a abordagem que o vincula diretamente às hostilidades, ameaças e violações aos direitos humanos decorrentes do conflito armado. Esse quadro é questionado por autores que consideram essa interpretação distante da complexidade do fenômeno, na medida em que este apresenta motivações e manifestações distintas ao longo do território colombiano. Apontam, ao invés disso, quatro fatores condicionantes do deslocamento interno na Colômbia: conflito armado; disputa por territórios de importância geoestratégica; disputa por terras, em um processo de reordenamento artificial; e motivações sociais.
Antes de tudo, cabe destacar que não se sustenta o argumento de que o conflito armado não reflete a complexidade do fenômeno do deslocamento interno. Longe de constituir mero embate ideológico ou de propostas políticas entre guerrilhas e governo nacional, o conflito apresenta um pano de fundo social, político e econômico consideravelmente complexo, com incidência aguda sobre a questão agrária. Ou seja, a dinâmica do conflito armado colombiano acaba por englobar muitos dos fatores considerados isoladamente por esses autores, tais como as disputas por territórios de importância geoestratégica e parte das motivações sociais.
Embora apresente boas fundamentações empíricas, a crítica à relação direta e unilateral entre deslocamento interno e conflito armado ignora o fato de que, quando se trata de deslocamentoforçado, o emprego da violência desempenha papel preponderante. Os números apresentados pela Consultoria para os Direitos Humanos e o Deslocamento (CODHES) corroboram esse argumento: no período 2002-2003, as ameaças respondiam por 47,5% dos motivos mais evocados para a ocorrência do deslocamento; os enfrentamentos armados, 19,9%; e os assassinatos e massacres, 13%.
A defesa de uma abordagem mais ampla do deslocamento interno chama atenção, no entanto, para alguns pontos interessantes. Um deles diz respeito à participação do Estado e de grupos econômicos sobre a dinâmica do deslocamento. Com efeito, os estudos e debates acadêmicos têm evoluído no sentido de explorar a responsabilidade do Estado na trajetória do conflito armado, seja pela falta de planejamento de suas operações, cujos bombardeios, muitas vezes, atingem não-combatentes1; ou por sua omissão em garantir proteção física e institucional a essas pessoas.
A participação do Estado na produção de deslocados internos é ainda mais notória e direta no caso das fumigações. Com efeito, somente no primeiro semestre de 2008, registrou-se o deslocamento massivo de 13.134 indivíduos devido às fumigações nos departamentos de Antioquia e Vichada (CODHES, 2008). Desde o governo César Turbay Ayala (1978-1982), o governo utiliza as fumigações como principal meio de combate aos cultivos ilícitos. Essa opção ignorou o conhecimento difundido por estudos técnicos que demonstravam os efeitos nocivos dos componentes químicos utilizados nas fumigações (paraquat e glifosato) à saúde humana e ao meio-ambiente. Ainda, é importante ressaltar que as fumigações continuaram a ser realizadas mesmo na ausência de resultados duradouros na redução da área cultivada com folha de coca. Se, em 1995, o cultivo dessa matéria-prima ocupava pouco mais de 50.000 hectares, no período compreendido entre 1997 e 2008, a menor área registrada foi de 78.000 hectares2 (OFICINA DE LAS NACIONES UNIDAS CONTRA LA DROGA Y EL CRIMEN [UNODC], 2009a, b). O aumento da militarização e fumigação têm contribuído para um quadro de crescente insegurança e, conseqüentemente, para o deslocamento de populações em diversas regiões do país.
O deslocamento pode, ainda, ocorrer por influência de grupos econômicos. Carentes de um planejamento e debate capazes de identificar e avaliar os impactos sobre a população e o meio-ambiente locais, os interesses relacionados à agricultura comercial e a implementação de mega-projetos contribuem para deslocamentos populacionais massivos. O caso dos oleodutos construídos em Antioquia, Urabá chochoano, Nariño, Cundinamarca, Norte de Santander e Arauca constituem exemplos emblemáticos dessa prática. O deslocamento interno é, assim, agravado pela lógica com que setores econômicos vinculados à pecuária extensiva, à agroindústria, à exploração de recursos naturais e ao narcotráfico cooperam ou financiam grupos paramilitares que enxergam no deslocamento forçado o mecanismo mais ágil e barato de levar à cabo um reordenamento territorial.
Além disso, as regiões latifundiárias são atrativas para grupos narcotraficantes para a expansão de seus cultivos, instalação de laboratórios, construção de pistas de aterrissagem ou mesmo para canais de comercialização. Outros grupos armados também possuem interesse em ocupar ou disputar determinados territórios, com vistas à continuidade e ao fortalecimento de suas ações armadas, na medida em que o controle sobre o território implica no controle sobre os recursos geoestratégicos de grande importância para o financiamento da guerra.
O departamento3 de Chocó, onde observou-se uma dinâmica bastante intensa de deslocamento nos últimos anos, constitui um exemplo emblemático: embora seja uma das regiões mais pobres do país, sua posição estratégica para o tráfico de drogas e armas – próximo do Pacífico e do Mar do Caribe – e sua riqueza em recursos minerais despertam interesses econômicos dos atores armados. O mesmo ocorreu com a região do Baixo Putumayo, próxima à fronteira com o Equador, palco de confrontos entre Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e grupos paramilitares, em disputa por recursos para o desenvolvimento de negócios ilícitos.
De modo geral, as populações mais afetadas pelo fenômeno do deslocamento interno são os campesinos: de acordo com a Defensoria do Povo, a expulsão de indivíduos que habitam as zonas rurais do país responde por 63% do deslocamento individual (Defensoría del Pueblo, 2003, pp., 25-6). No entanto, em meio a essa população vulnerável, existem dois grupos considerados particularmente mais sensíveis ao fenômeno do deslocamento: as comunidades afro-colombianas e indígenas4. Entre janeiro de 2000 e junho de 2002, 17,72% da população deslocada correspondia à população negra (Defensoría del Pueblo, 2003, p. 26) e 3,75% à indígena. Em termos proporcionais5, a incidência do deslocamento forçado sobre essas populações chega a ser dez vezes mais forte que no restante dos grupos populacionais.
A lógica de expulsão dessas comunidades envolve o assassinato de seus líderes e o recrutamento forçado de jovens e encontra-se diretamente relacionada com a existência de recursos estratégicos em seus territórios6. Cabe destacar que, “devido à sua cosmovisão particular e às suas práticas cotidianas de relação com a terra, […] o deslocamento gera perda e ausência tanto de lugar, autonomia em seu território e alimentos, como de identidade, história, espiritualidade e suas formas de organização social como povos etc.” (JACANAMIJOY, 2004, p. 206)7. Isso porque a terra constitui olocus dedicado à realização dos ritos sociais ou religiosos da comunidade, de modo que a dispersão decorrente do deslocamento forçado afeta o coletivo em torno do qual esses usos e costumes são transmitidos. Devido aos motivos acima expostos, muitas vezes, esses grupos optam pela resistência, ao invés de abandonar suas terras.
Aqui, é interessante registrar que, embora se espere que as cidades representem para as famílias deslocadas maior proteção ou, pelo menos, anonimato – o que faz com que se sintam seguras de ameaças – e mais informações e serviços sociais em comparação às áreas de onde foram expulsas, os deslocados desconhecem esse sistema de informações e serviços e não conseguem ter acesso às oportunidades de progresso individual oferecidas pela cidade. Ainda, se considerarmos que apenas 20% da população deslocada se insere em um quadro de “deslocamento massivo” – mais de dez lares8 ou 50 pessoas –, sendo 80% correspondentes a deslocamentos individuais ou unifamiliares, temos que esses deslocados que chegam às cidades dispõem de poucas redes sociais de apoio ou nenhuma. Ou seja, mesmo que os dados apontem para um fluxo de deslocamento interno do campo para as cidades, mais especificamente, das regiões com menor desenvolvimento relativo para grandes cidades, essa melhoria não é incorporada à vida dos deslocados.
Há, ainda, duas características para as quais vale a pena atentar: o número elevado de municípios afetados pelo deslocamento forçado e os índices decrescentes de retorno. Em 2008, 785 – dos 1.140 municípios que compõem o território colombiano (isto é, 68,86%) – foram afetados pela expulsão ou recepção de deslocados internos (CODHES, 2008), número consideravelmente superior aos 480 municípios afetados em 2000 (DEFENSORÍA DEL PUEBLO, 2003, p. 36).
No que diz respeito à taxa de retorno, em 2000, esse índice correspondia a 37%, ao passo que, em 2002, caiu para 11% da população total deslocada. Tendo em vista que o retorno depende fundamentalmente das garantias oferecidas pelo Estado para a proteção permanente da população ameaçada pelos diferentes grupos armados, a tendência decrescente da taxa de retorno, associada à expansão territorial do fenômeno do deslocamento interno, pode contribuir, primeiramente, para a saturação das cidades, principal destino dessas populações; e, em segundo lugar, para a degeneração do quadro humanitário – já avaliado como muito grave – na Colômbia.
É interessante observar que uma mesma ameaça se expressa de diferentes formas em territórios distintos, ou seja, a mesma ameaça produz quantidades diferentes de deslocados. Essa diferença pode ser atribuída, entre outras coisas, à distância do município do qual partiu a ameaça em relação à capital do departamento; ao nível relativo de pobreza e miséria na zona rural do município onde se reportou o evento, em relação ao nível de pobreza da capital do departamento correspondente, um dos destinos mais comuns; diferenças na qualidade de vida entre municípios expulsores e receptores; menor a maior presença institucional9 (os municípios que estão gerando cerca de 97% dos deslocados possuem um nível de presença institucional inferior ou próximo da média nacional; ao passo que os 20 municípios que recebem 66% de todos os deslocados apresentam um nível de presença institucional substancialmente superior à media nacional); capital social10 perdido e buscado pelos deslocados.
Nesses lugares onde a presença do Estado é mais frágil, as necessidades são buscadas em gestões pré-institucionais, as quais, normalmente, estão associadas a alguma forma de associação informal que articula os poucos recursos de que dispõe (mão-de-obra, terras baldias, bosques livres, etc.). Com o deslocamento forçado, essas comunidades perdem os vínculos de cooperação dos quais dependiam criticamente suas oportunidades de progresso, processo que corresponde ao que os analistas chamam de “rompimento do tecido social”.
Como já foi dito, grande parte da discussão ocorrerá nos termos da interpretação das agências governamentais e internacionais, as quais restringem a relação do deslocamento forçado à violência do conflito armado. Não constitui, entretanto, pretensão deste artigo cerrar as portas para um tratamento mais amplo do problema, afinal, “o desajuste das relações sociais e políticas durante o período recente foi demasiado profundo para que se possa acreditar que a violência possa desaparecer pela mera decisão dos atores organizados” (PÉCAUT, 2006). Pelo contrário: no horizonte das preocupações aqui apresentadas, reside a necessidade do desenvolvimento de um corpo normativo que aborde o deslocamento interno em sua perspectiva mais completa, envolvendo políticas de desenvolvimento humano e econômico nas regiões que têm se configurado como “expulsoras” de colombianos em direção às cidades.
O deslocamento interno tem aumentado de forma aguda na Colômbia: em 2002, devido ao recrudescimento do conflito armado, o deslocamento chegou a afetar 411.779 pessoas, 20% a mais do que em 2001. Embora números dessa magnitude não tenham se repetido nos anos seguintes, a tendência tem sido de aumento no período entre 2003 e 2007, passando de 207.607 a 305.966 o número de indivíduos afetados (CODHES, 2003; 2007). O quadro, considerado grave por muitas agências nacionais e internacionais, fere direitos fundamentais, sociais, econômicos e culturais previstos na Constituição colombiana. Um dos mais evidentes é o direito à proteção física, que deve ser oferecida igualmente a todos os cidadãos pelo Estado (Artigo 13)11.
Ainda que o deslocamento interno em decorrência da violência do conflito armado tenha sido observado como um fenômeno sistemático desde a década de 1980, foi somente em meados da década de 1990 que o Estado colombiano deu início à formulação de um corpo normativo voltado ao tratamento do problema12.
O CONPES13 2804, aprovado em 1995, buscou definir o conceito de deslocado interno com o qual o Estado passaria a trabalhar, além de dispor sobre ações de prevenção, proteção e atenção humanitária de emergência e acesso aos programas do governo. Em 1997, o governo aprovou o CONPES 2924, responsável pela definição de uma nova estrutura institucional, envolvendo todas as organizações públicas e privadas encarregadas de atender à população deslocada pela violência. Além disso, este último documento propôs a criação do Sistema Nacional de Atenção Integral à População Deslocada pela Violência (SNAIPDV), do Plano Nacional, do Fundo Nacional para a Atenção à População Deslocada e da Rede Nacional de Informação.
Nesse mesmo ano, foi aprovada a Lei 387, um dos instrumentos normativos referenciais para a questão do deslocamento interno na Colômbia. Sua importância deriva do fato de ter sido responsável pela inserção do deslocamento interno no marco normativo colombiano. De acordo com a Lei 387, o Estado colombiano entende como deslocado interno
toda pessoa forçada a migrar dentro do território nacional, abandonando o local de sua residência ou atividades econômicas habituais, porque sua vida, integridade física, segurança ou liberdade pessoais foram vulnerabilizadas ou se encontram diretamente ameaçadas, por ocasião de qualquer das seguintes situações: conflito armado interno, distúrbios e tensões interiores, violência generalizada, violações massivas de Direitos Humanos, infrações ao Direito Internacional Humanitário ou outras circunstâncias emanadas das situações anteriores que possam alterar ou alterem drasticamente a ordem pública. (Lei 387, Artigo 1).
A Lei 387 de 1997 reconhece expressamente os direitos da população deslocada e aponta, pela primeira vez, para a responsabilidade do Estado na formulação de políticas e na adoção de medidas para a prevenção14, atenção, proteção, consolidação e estabilização sócio-econômica da população deslocada. O deslocado interno passa a gozar, a partir da promulgação da Lei, dos direitos dispostos no artigo 2, dentre eles: ao acesso a soluções definitivas à sua situação; ao retorno a seu lugar de origem; a não ser deslocado forçosamente; e a que sua liberdade de movimento não esteja sujeita a mais restrições que as previstas em lei.
Para tal, atendendo às recomendações do CONPES 2924, cria o SNAIPDV e o Conselho Nacional para a Atenção Integral à População Deslocada pela Violência (CNAIPDV). Criado pela Lei 387 (Artigo 6), o Conselho surge como a instituição responsável pela formulação de políticas e pela organização orçamentária dos programas voltados à população deslocada. Esses programas, por sua vez, são implementados no âmbito do SNAIPDV (criado pela mesma Lei, artigo 5), instituição responsável pelaexecução das políticas de atenção à população deslocada.
Em 12 de dezembro de 2000, é aprovado o Decreto 2569, que regulamenta a Lei 387 e determina que a Red de Solidaridad (RSS) – atualmente incorporada à Acción Social –, entidade do governo vinculada diretamente à Presidência da República e com capacidade de ação em todo o país, passe a coordenar o SNAIPDV (Artigo 1) e, como tal, propicie a concertação entre as autoridades de nível nacional, departamental e municipal para a execução das medidas sociais, econômicas, jurídicas, políticas e de segurança adotadas pelo governo nacional para a superação e prevenção do deslocamento interno. Cabe destacar que o referido Decreto marca, ainda, a criação do Sistema Único de Registro da População Deslocada (SUR), o qual será discutido mais à frente.
O Decreto 2569 também especifica os critérios para o fim da condição de deslocado. De acordo com o Artigo 3º, o Estado colombiano deixa de reconhecer um indivíduo como deslocado face a uma das seguintes condições: retorno15, reassentamento ou realocação da pessoa, acompanhado de acesso a uma atividade econômica (“estabilização sócio-econômica”, prevista na Lei 387); exclusão do SUR, em conformidade com as causas previstas no artigo 14 do Decreto, ou por solicitação do interessado.
Há um tipo específico de política formulada pelo governo colombiano que merece especial atenção. Trata-se da ajuda humanitária de emergência: ajuda temporária e imediata destinada a ações de socorro, assistência e apoio à população deslocada, a fim de oferecer condições básicas em alimentação, saúde, atenção psicológica, alojamento e transporte de emergência. Os deslocados têm direito à atenção humanitária de emergência por, no máximo, três meses, prorrogáveis pelo mesmo período. O investimento para alojamento transitório, assistência alimentar e elementos de limpeza pessoal é de, no máximo, 1,5 salário mínimo (Artigos 20 à 24).
Uma instituição que tem desempenhado papel de relevância crescente na defesa dos direitos dos deslocados internos é a Defensoria do Povo, que possui um escritório dedicado exclusivamente à população deslocada. Com o apoio do ACNUR, a Defensoria implementa o projeto “Defensores comunitários,” especialmente em regiões com assentamentos indígenas (como Bajo Atrato, Medio Atrato, costa do Cacarica, costa Vallecaucana, costa Nariñense, Tierralta, Sierra Nevada de Santa Marta, Catatumbo e nordeste Antioqueño). O objetivo do projeto é, de um lado, fortalecer a presença da Defensoria nessas regiões e, de outro, prevenir o deslocamento forçado por meio de sua presença e implementação de uma política de prevenção in locus.
Órgão máximo de controle do exercício da função pública, a Procuradoria Geral da Nação objetiva salvaguardar os direitos humanos e intervir em defesa do patrimônio público. A representante da Procuradoria para a Prevenção em matéria de Direitos Humanos e Assuntos Étnicos, por meio da Coordenação de Atenção ao Deslocamento Forçado, conta com um Modelo de Monitoramento e Avaliação das entidades do SNAIPDV. A própria Procuradoria dispõe de um software capaz de auxiliar na tarefa de controle preventivo e de monitoramento das atividades dos atores diretamente envolvidos com as políticas de atenção à população deslocada.
Na avaliação da Defensoria e do ACNUR, o corpo normativo implementado em meados da década de 1990 na Colômbia com vistas à mitigação e à prevenção do deslocamento forçado é consideravelmente completo. Além disso, a legislação adotada está em conformidade com os princípios de direito internacional humanitário e dos refugiados, promovidos por entidades como o ACNUR e o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). No entanto, o corpo normativo apresenta falhas estruturais em seu processo de implementação16. Particularmente, o desempenho do país na execução do desenho institucional e programático tem sido mal avaliado pela Defensoria e pelo ACNUR. É justamente essa assimetria entre o avanço no corpo normativo e as deficiências observadas na implementação da política de atenção à população deslocada que motivou uma manifestação mais contundente da Corte Constitucional em 22 de janeiro de 2004. Por meio da sentença T-025, a Corte sustentou que diversas inconsistências observadas na política de atenção integral à população deslocada configuravam o que a corporação chamou de “estado inconstitucional das coisas” (COLÔMBIA, 2004).
Entre 1997 e 2004, a Corte Constitucional emitira 17 sentenças com ordens específicas às entidades responsáveis pela política de atenção à população deslocada17, ordens que não conduziram à correção das vulnerabilidades dos direitos da população deslocada. A Corte fundamenta seu parecer na identificação de níveis insatisfatórios de proteção aos deslocados, haja vista: i) a vulnerabilidade extrema em que se encontra a população deslocada e, especificamente, a grave deterioração de sua situação de alimentação e saúde; ii) a omissão quanto à proteção oportuna e efetiva por parte das distintas autoridades encarregadas de atenção à população deslocada18; e iii) a insuficiência dos resultados quanto à cobertura das políticas de saúde da população deslocada e de acesso à educação por parte de menores de idade deslocados (COLÔMBIA, 2004, pp. 24-6). No entendimento da Corte esse quadro resulta, principalmente, da insuficiência de recursos, cujo montante não acompanhou o agravamento do fenômeno e da incapacidade institucional do Estado colombiano para responder de maneira eficaz à necessidade da população deslocada, pontos sobre os quais incidem as exigências da Corte frente às autoridades responsáveis. Nesse sentido, a Corte ordenou que as autoridades nacionais e territoriais encarregadas de atender à população deslocada assegurassem a coerência entre suas obrigações e o volume de recursos efetivamente destinados a proteger os direitos dos deslocados (COLÔMBIA, 2004, p. 89).
Em agosto de 2006, a Corte Constitucional concluiu que,
apesar de que avanços importantes tenham sido informados à Corte em áreas críticas da política de atenção à população deslocada, não se demonstrou que o estado inconstitucional das coisas – declarado na sentença T/025 de 2004 – tenha sido superado, e tampouco que se esteja avançando de forma acelerada e sustentada na direção da superação. (COLÔMBIA, 2006, p. 3).
– posição esta mantida no Auto No. 008 de 26 de janeiro de 2009 (COLÔMBIA, 2009). Além de criticar com veemência o conteúdo dos informes19 enviados à Corte Constitucional pelas entidades responsáveis, em resposta à Sentença T-025, a corporação identifica proteção insatisfatória à população deslocada em dez áreas em particular, dentre as quais se destacam: i) falta de coordenação do sistema de atenção aos deslocados; ii) problemas nas atividades de registro e na caracterização da população deslocada; iii) insuficiência orçamentária da política de atenção à população deslocada em seu processo de formulação e execução material; iv) falta de especificidade na política de atenção à população deslocada, em suas diferentes manifestações; v) desproteção dos grupos indígenas e afro-colombianos, especialmente afetados pelo deslocamento interno nos últimos meses; vi) escassa segurança para os processos de retorno da população deslocada de suas terras durante a movimentação física e a permanência na localidade de retorno; e vii) ausência de um enfoque de prevenção na política de atenção à população deslocada, particularmente nas operações de segurança conduzidas pelo Estado. A seguir, direcionaremos atenção a alguns destes pontos em particular.
A descentralização – certamente um dos pilares centrais da política de atenção à população deslocada – está diretamente relacionada a grande parte dos itens acima mencionados. Isso porque a descentralização permite responder à complexidade do deslocamento forçado, em suas diferentes manifestações no território colombiano e nas comunidades. Além disso, a descentralização da política pública em questão permitiria que autoridades locais e departamentais colaborassem com o governo nacional por meio de maior proteção às populações mais afetadas pelo deslocamento forçado e informações técnicas de maior precisão.
No entanto, conforme observado pela Corte Constitucional, a forma desordenada com que a descentralização tem sido executada compõe um quadro de fragmentação política, o qual dificulta sua implementação consistente e a avaliação dos resultados de tais políticas, impedindo, conseqüentemente, o desenvolvimento destas. Em grande medida, isso decorre da i) falta de vontade política por parte das administrações locais e departamentais para atender à população deslocada, o que se torna ainda mais grave face ao caráter de urgência da matéria; ii) escassez, no âmbito sub-nacional, de programas específicos de atenção e de recursos suficientes para fazer frente ao problema; iii) esquema hierárquico que opera nas entidades nacionais descentralizadas, cujas funções dependem mais de mandatos institucionais e, portanto, da administração central, do que das necessidades regionais; iv) exclusão da população do processo de formulação e avaliação de políticas de atenção; e v) falta de conhecimento técnico sobre a problemática, bem como de clareza sobre as funções de cada uma das entidades por parte dos funcionários dos comitês locais e departamentais (Defensoría del Pueblo, 2003, pp. 112-3).
Um dos efeitos das falhas encontradas no processo de descentralização das políticas de atenção à população deslocada é a inexistência de programas com vistas ao fortalecimento da auto-gestão comunitária. Assim, as debilidades acima mencionadas conduzem ao fracasso dos programas voltados à produção de capital social e acabam por alimentar a dependência dessas comunidades de programas sociais formulados pelo Estado.
A situação de vulnerabilidade excepcional em que se encontram os deslocados internos já foi reconhecida pela Lei 387 e pelas sentenças da Corte Constitucional. Ainda que estas recomendem a formulação de políticas especiais e a destinação específica de recursos para a população deslocada, o governo ainda adota uma postura reticente à idéia. De acordo com a Defensoria do Povo, o Programa Especial é reduzido à atenção humanitária coordenada pela Red de Solidaridad e à regulamentação de moradia e terras para deslocados – nenhuma das quais se encontra em processo de implementação (Defensoría del Pueblo, 2003, p. 104).
Tal conduta caminha no sentido contrário à mitigação do problema, na medida em que os deslocados internos passam a ser incorporados ao sistema de atendimento dos programas sociais do governo. Como foi dito na seção anterior, os deslocados internos que chegam às cidades (cerca de 80%, segundo a Defensoria do Povo), destituídos das redes sociais de apoio de que dispunham em seu local de origem – alguns sem documentação –, desconhecem o sistema de informações e serviços que opera nas cidades e não conseguem competir por recursos com a população carente nos centros urbanos.
Ainda, a reincorporação à vida produtiva – uma das condições básicas para o retorno ou a re-alocação do deslocado – torna-se mais difícil à medida que aumenta o período dentro do qual o deslocado permanece distante de seu local de origem. Mais do que isso, o deslocado tem o direito de escolher para onde deseja ir e, caso queira retornar a seu local de origem, é dever do Estado oferecer informações sobre a situação de segurança no local, bem como a devida proteção ao deslocado.
Contudo, ainda que existam dispositivos legais que determinem a responsabilidade das entidades nacionais e locais no processo de restabelecimento da população deslocada20, estas ainda não contam com programas claros e regulares dentro de suas instituições para tratar do problema. Claro exemplo disso é o vazio normativo quanto à reparação dos direitos violados, ponto diretamente relacionado às condições e possibilidades do retorno da população deslocada. Não existe na Colômbia legislação específica para a punição dos atores causadores do deslocamento forçado, tampouco jurisprudência relacionada ao tema da reparação material e moral21 às pessoas deslocadas pela violência.
Para além das falhas apontadas acima, são inexistentes os mecanismos de avaliação do impacto dos programas de atenção à população deslocada. Nas palavras da Defensoria do Povo, “muita preocupação com os produtos, e pouca com os impactos” (2003, p. 113). No tocante a este ponto, a Corte Constitucional expressa preocupação com relação à existência de conjuntos de indicadores diversos em cada uma das entidades que integram o SNAIPDV. Acredita-se que tal deficiência poderia ser superada por meio de maior participação das agências locais e departamentais em seu desenvolvimento, condição que esbarra na já mencionada deficiência do processo de descentralização da política de atenção à população deslocada.
É igualmente preocupante a falta de atenção política ao desenvolvimento de programas de prevenção ao deslocamento, o que garantiria a real mitigação do fenômeno e do sofrimento e trauma que dele decorrem. A Corte Constitucional destaca que sequer as operações de segurança ou fumigação empreendidas pelo governo colombiano são acompanhadas de análises prévias acerca de seus possíveis impactos sobre a população local. Até período recente, o Sistema de Alertas Antecipados (Sistema de Alertas Tempranas), projeto da Defensoria do Povo que permite detectar com antecedência casos de potencial deslocamento populacional, tampouco apresentava funcionamento adequado, muito por conta de sua dependência do sucesso da descentralização e coordenação da política de atenção à população deslocada. De acordo com a Defensoria do Povo, o país necessita de um grupo técnico em gestão de crise, capaz de antecipar e avaliar cotidianamente as implicações das incursões armadas – incluídas aqui as das Forças Armadas – sobre a população civil.
No que diz respeito ao registro da população deslocada existem, atualmente, dois subsistemas de organização das informações, ambos circunscritos à Rede Nacional de Informação: o SUR e o Sistema de Estimativa por Fontes Contrastadas (SEFC). O SUR permite quantificar, em termos territoriais e populacionais, a demanda pelas políticas do Estado colombiano de atenção aos deslocados. Isso porque contabiliza como deslocado interno apenasaquele que se registra no SUR dentro de um ano após o evento que o forçou a abandonar seu lar. Este constitui o único canal mediante o qual o deslocado pode ter acesso aos programas de atenção formulados pelo governo.
O SEFC, por outro lado, constitui um modelo de estimativa global do deslocamento, que registra informações relativas a eventos de expulsão, chegada, retorno e reassentamento a nível nacional, nas 35 unidades territoriais em que está presente a RSS. O SEFC visa à identificação do volume total de pessoas e famílias que se deslocam devido à violência, independentemente de que se registrem ou solicitem ajuda do Estado.
As cifras divulgadas por meio desses sistemas do governo nacional – segundo os quais existiam 2.649.139 milhões de deslocados colombianos até agosto de 2008 – divergem, em grande medida, dos números do ACNUR, que registrou 3 milhões de deslocados até dezembro de 2007, e de organizações não-governamentais como a CODHES, segundo a qual existiam, até junho de 2008, 4.361.355 deslocados colombianos. Entre os fatores que explicam essa divergência, destaca-se o fato de que as cifras divulgadas pelo governo são cumulativas desde 1999 – ao contrário dos dados da CODHES, cumulativos desde 1985 –, além de não incluírem deslocamento intra-urbano e deslocamentos decorrentes de fumigações. Ainda, como os deslocados têm um ano após o deslocamento para se registrarem, este período constitui uma lacuna nos dados divulgados pelo governo. Mais do que divergências entre referenciais para a base de cálculo, é particularmente problemática a existência de sistemas de registro de natureza não-governamental cujas cifras de deslocados internos ultrapassam aquelas divulgadas pelo governo em centenas de milhares de indivíduos. Ora, trata-se de um indicador de que o SUR subdimensiona a crise humanitária vivida pela Colômbia, o que projeta efeitos diretos sobre as formulações políticas do governo nacional ao problema. A respeito, afirma a Corte Constitucional: “Como conseqüência, a totalidade da política pública para a atenção ao deslocamento interno se encontra formulada sobre pressupostos que não correspondem à dimensão real do problema que se pretende atender” (COLÔMBIA, 2006, p. 9).
A proteção às vítimas de conflitos armados internacionais constitui preocupação do Direito Internacional Humanitário desde a década de 1970, quando foi aprovado o Protocolo II adicional aos Convênios de Genebra (1977). Com vistas a proteger a população não-combatente, seu artigo 13 determina que “nem a população civil, nem os civis serão objeto de ataques militares” e que são “proibidos os atos ou ameaças de violência cuja finalidade principal seja aterrorizar a população civil”. Ora, não é difícil constatar que o deslocamento forçado de populações na Colômbia viola claramente este e outros princípios do Direito Internacional Humanitário.
Embora já nessa época se reconhecesse a gravidade do problema do deslocamento interno, isso ocorreu na ausência de tratado ou convenção de direitos humanos que garantisse explicitamente os direitos dos deslocados internos. Como destaca Kälin, “logicamente que, como seres humanos, os deslocados internos não perdem seus direitos quando deslocados, mas não estava claro o que significariam esses direitos especificamente no contexto do deslocamento” (REVISTA MIGRACIONES FORZADAS, 2005, p. 4).
No início da década de 1990, essa preocupação surge com uma abordagem mais específica. Em 1992, a Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) criou o cargo de representante do Secretário Geral da ONU para Pessoas Internamente Deslocadas22 e nomeou Francis Deng como responsável.
Uma de suas primeiras tarefas consistiu na elaboração de um estudo sobre as causas e conseqüências do deslocamento interno no mundo, o estatuto das pessoas internamente deslocadas de acordo com o Direito Internacional, os arranjos institucionais voltados ao tratamento do problema e a forma de melhorar a proteção e assistência oferecidas a esse grupo.
A partir dessa análise, Deng buscou elaborar marcos normativos e institucionais adequados e aplicáveis para a proteção e assistência dos deslocados internos. Desse trabalho, resultou o documento intitulado Principios Rectores de los Desplazamientos Internos, que constitui “uma ferramenta de caráter persuasivo que proporcione uma orientação prática e seja, ao mesmo tempo, um instrumento de política educativa e de conscientização”23 (Consejo Económico y Social de Las Naciones Unidas, 1998).
À primeira vista, a promoção dos Princípios Rectores del Desplazamiento Interno tem na Colômbia um de seus casos de sucesso. A difusão dos Princípios ocorreu não somente entre entidades do governo nacional, mas também de administrações locais e departamentais, além de ONGs e organizações coordenadas pela população deslocada. Reflexo disso pode ser encontrado em algumas decisões recentes da Corte Constitucional da Colômbia, que consideram tais princípios parte integrante do corpo normativo que confere constitucionalidade ao caso dos deslocados internos. A decisão T-327 de 2001, por exemplo, é clara a respeito disso:
A interpretação mais favorável à proteção dos direitos humanos dos deslocados torna necessária a aplicação dos Principios Rectores del Desplazamiento Interno […], os quais são parte do corpo normativo supranacional que integra o bloco de constitucionalidade deste caso. Em conseqüência, todos os funcionários envolvidos na atenção aos deslocados […] deveriam ajustar sua conduta, além das normas constitucionais, ao que está previsto nos referidos Principios. (COLÔMBIA, 2001, p. 17).
É pertinente destacar, entretanto, que o sucesso da implementação de tais normas depende da estrutura de coordenação do Estado. Ocorre que, muitas vezes, esses problemas emergem devido à fragilidade institucional deste, como vimos no caso da Colômbia. Além disso, o Estado colombiano desempenha papel condicionante – em alguns casos por seu protagonismo, em outros, por sua omissão – no surgimento e agravamento desse quadro. Assim, para além da formulação de tais princípios, em muitos casos é patente a necessidade de cooperação internacional nos esforços de superar o fenômeno do deslocamento interno forçado.
Nesse sentido, o Estado colombiano buscou, em 1997, a assistência técnica e humanitária do ACNUR. Com o consentimento do Secretário Geral da ONU, foi instalado o escritório do ACNUR em Bogotá em junho de 199824, o qual passou a ser responsável pela capacitação das agências do Estado e organizações não-governamentais e pela cooperação técnica em relação às fases do deslocamento, incluindo as políticas de prevenção. Ainda, de acordo com o mandato do ACNUR, este “colocará à disposição do governo a experiência e o conhecimento em matéria de proteção, atenção humanitária e processos de soluções duradouras que se mostraram efetivos em outras situações de deslocamento forçado” (ACNUR, 1999, p. 2).
Em termos mais específicos, o ACNUR trabalha com quatro linhas de ação: i) promoção e atualização do marco legal de proteção; ii) promoção do fortalecimento institucional e de políticas públicas; iii) promoção da organização social, capacitação e participação da população deslocada na defesa de seus direitos; e iv) promoção e fortalecimento dos mecanismos nacionais de controle. Mais recentemente, o ACNUR desenvolveu o “enfoque integral” (cluster approach), abordagem que envolve a coordenação de diversas agências especializadas em temas como água, alimentação, saúde e logística25. Ao Alto Comissariado, cabe o papel de supervisionar as necessidades de proteção e alojamento dos deslocados internos, assim como coordenar alguns campos já estabelecidos.
As atividades compreendidas pelas linhas de ação acima destacadas são empreendidas em cooperação com outros atores, nacionais e internacionais. No âmbito nacional, os principais interlocutores do ACNUR são: a Agência Presidencial para a Cooperação Internacional (Acción Social), a Defensoria do Povo e a Procuradoria Geral da Nação. Em termos gerais, a cooperação do ACNUR com esses interlocutores é mediada pela Unidade Técnica Conjunta (UTEC), criada em 1999, pelo Memorando de Entendimento assinado entre o ACNUR e a Acción Social. A função principal da UTEC é fornecer apoio a essas entidades governamentais na sistematização, análise, monitoramento e divulgação das políticas públicas de atenção à população deslocada. Além disso, prevê-se, dentre as atribuições da UTEC, o trabalho junto às organizações da própria população deslocada, com vistas ao fortalecimento de sua participação no CNAIPDV e à formulação de sistemas de representação a nível local.
No que toca à cooperação do ACNUR com a Acción Social, cabe destacar o projeto “Proteção de Terras e Patrimônio”, financiado pelo Fundo Pós-conflito do Banco Mundial, pela Agência Sueca de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, a Organização Internacional para as Migrações e os governos dos departamentos do Norte de Santander, Bolívar, Antioquia e Valle. Tal projeto busca promover a proteção dos direitos sobre as terras de camponeses e colonos, bem como territórios étnicos de populações sob risco de deslocamento, com o objetivo de implementar efetivamente as medidas de proteção previstas nos Decretos 2007/01 e 250/05.
O ACNUR possui um interessante projeto, denominado “Implementação”, com vistas à capacitação da Defensoria do Povo na defesa dos direitos da população sob risco de deslocamento em nível nacional, regional e local. Neste projeto são aplicados sistemas e instrumentos de mensuração, monitoramento e avaliação das oficinas regionais da Defensoria, com o objetivo de avaliar a efetividade de seu papel na promoção e proteção dos direitos das populações consideradas em situação de maior vulnerabilidade ou exclusão dos programas de atenção à população deslocada, tais como mulheres, crianças, indígenas e afro-colombianos.
Ainda, o ACNUR auxilia a Procuradoria na divulgação do uso do software de implementação dos Modelos de Monitoramento e Avaliação, que se encontram em fase de implementação nos dez departamentos com maior índice de expulsão e recepção da população deslocada. Esse programa de acompanhamento permite o desenvolvimento de análises acerca da evolução das políticas de prevenção e atenção a essas populações.
As constantes transformações pelas quais passa o problema das populações deslocadas fazem do monitoramento permanente um ponto crucial para que as políticas produzam resultados positivos. Algumas características novas do deslocamento forçado, nesse sentido, merecem maior atenção. Um caso emblemático é o cruzamento temporário de fronteiras em busca de proteção. Recentemente, observou-se que muitos colombianos que habitam as regiões próximas à fronteira venezuelana trabalham, durante o dia, em sua plantação na Colômbia e, à noite, cruzam a fronteira em busca de maior tranqüilidade. Que caráter jurídico atribuir a esses indivíduos? A resposta mais adequada a tal dinâmica, que combina mecanismos de atenção à população deslocada com princípios internacionais relativos a refugiados, parece residir nas chamadas “convenções tripartites”, formadas pelos países envolvidos no fluxo de pessoas mencionado e pelo ACNUR. De acordo com a Defensoria do Povo, “ainda que a consolidação e o desenvolvimento desse mecanismo tenha apresentado muitos altos e baixos […], constitui o instrumento ideal – e quase único – para atender ao drama dos movimentos populacionais fronteiriços” (Defensoria DEL PUEBLO, 2003, pp. 40-1).
Note-se, pois, que a ação do ACNUR na Colômbia incide sobre alguns pontos de debilidade da política de atenção à população deslocada do governo nacional. O apoio à Defensoria do Povo e a escritórios locais e regionais no âmbito do SNAIPDV, por exemplo, visa ao fortalecimento do aspecto relativo à descentralização dessas políticas. Com o aumento de sua presença territorial na Colômbia, o ACNUR espera contribuir para a inclusão das populações deslocadas nos processos de consulta e de formulação de políticas de atenção e prevenção ao deslocamento interno.
A experiência do ACNUR também tem sido utilizada para o desenvolvimento, em parceria com entidades governamentais e não-governamentais, de mecanismos de monitoramento do governo colombiano. Como foi visto, este tem sido um aspecto central da crítica ao processo de formulação e implementação de políticas de atenção à população deslocada, críticas estas que têm como porta-voz principal a Defensoria do Povo.
Em resposta à sentença T-025 de 2004, o ACNUR identificou no orçamento o centro das dificuldades enfrentadas pelo Alto Comissariado e pelo governo nacional na execução da política de atenção à população deslocada (ACNUR, 2005). Em seu Balanço da Política Pública de Prevenção, Proteção e Atenção ao Deslocamento Forçado na Colômbia (agosto de 2002 – agosto de 2004), o ACNUR (2005, p. 2) declara que os avanços jurisprudenciais desenvolvidos pela Corte Constitucional e, em particular, pela Sentença T-025 de 2004, constituíram elementos fundamentais para a elaboração de parâmetros de avaliação dos resultados da política pública. Para além disso, segundo o ACNUR (2005, p. 3-13), a sentença T-025 produziu uma série de impactos positivos na política de proteção à população deslocada, entre eles, motivou o re-enquadramento do tema do deslocamento nas prioridades estatais e o maior compromisso por parte do governo em direção à crise humanitária, além de ter propiciado avanços iniciais com autoridades locais.
Uma vez que a presença do ACNUR na Colômbia é recente, torna-se difícil avaliar criticamente o impacto de suas linhas de cooperação. De qualquer forma, a ausência de uma política de avaliação constitui uma falha estrutural no desenho das políticas do governo, a qual tem sido tratada sem a devida urgência. Logicamente, a gravidade do quadro humanitário na Colômbia exige respostas eficientes, o que nos leva a crer que os desafios relacionados ao deslocamento interno passam necessariamente pela questão da coordenação.
Coordenação, descentralização, monitoramento, prevenção, captação e destinação de recursos. Estas parecem ser as palavras que aglutinam grande parte das reflexões voltadas à formulação e revisão das políticas de atenção à população deslocada na Colômbia.
Ainda que o debate tenha sido iniciado há pouco mais de dez anos no país, o levantamento de questões e o constante monitoramento e revisão dos programas voltados ao problema permanecem práticas pertinentes. Como se buscou mostrar neste artigo, trata-se de um fenômeno resultante de processos históricos de longa duração. No entanto, o caráter tardio com que tem emergido as respostas do governo colombiano faz com que as populações deslocadas busquem, cada vez mais, soluções próprias. Daí a constante transformação dos fluxos migratórios em suas características, destinos e vítimas.
Para além disso, muitas das abordagens aqui destacadas apresentam a conduta do Estado colombiano frente à resolução do conflito armado como problemática, além de determinante para a piora observada no quadro do deslocamento interno. A crescente militarização e o aumento desmedido das fumigações, associados à falta de planejamento, têm relegado a segundo plano o que se convencionou chamar de segurança humana. Com efeito, é por ação do Estado que, muitas vezes, o direito à neutralidade da população não-combatente é violado. E isso ocorre distante da possibilidade de que o Estado ofereça proteção física e institucional a esses indivíduos, esta entendida como o resguardo de seus direitos e acesso a serviços básicos assegurados pela Constituição.
A leitura aqui privilegiada acerca do deslocamento interno esteve atrelada à interpretação diretamente associada às políticas nacionais de atenção ao fenômeno, ou seja, o deslocamento forçado em decorrência da violência. De modo algum, entretanto, essa opção implica na negação da necessidade de um tratamento mais amplo ao problema. Defende-se, pelo contrário, o desenvolvimento de políticas que abordem o deslocamento interno em sua complexidade.
Não é necessário muito esforço para concluir que a situação atual do deslocamento interno na Colômbia e a forma com que vem sendo tratado pelo governo colombiano se encontram distantes da proposta de incorporação dos Princípios Rectores e da linha de cooperação com o ACNUR. Embora o desenvolvimento normativo para tratar do problema tenha sido elogiado por atores nacionais e internacionais, o mesmo não ocorreu com a avaliação da execução das políticas de atenção à população deslocada.
Se, por um lado, a formulação e implementação de programas de atenção à população deslocada, bem como a cooperação com o ACNUR, são recentes; por outro, há alguns pontos estruturaisproblemáticos, o que compromete todo o desenvolvimento de políticas nesse sentido. Este é o caso da debilidade da descentralização de tais programas, que tem sido objeto de preocupação do ACNUR. A descentralização constitui característica essencial para o tratamento do deslocamento forçado, haja vista a heterogeneidade com que se manifesta o conflito armado e o deslocamento em diferentes regiões do país. A descentralização foi pensada, ainda, como ferramenta para uma maior aproximação em relação às populações consideradas mais vulneráveis, por exemplo, comunidades indígenas e afro-colombianas, especialmente sensíveis à crise humanitária. As particularidades inerentes a esses grupos poderiam estar refletidas em políticas específicas se existisse um processo efetivo de consulta a essas populações. Ainda que o ACNUR e a Defensoria, principalmente, tenham se dedicado ao fortalecimento da descentralização, isso ocorreu somente nos últimos anos, de forma que ainda é cedo para qualquer avaliação mais crítica.
Certamente, a participação de agências internacionais no tratamento do problema do deslocamento interno constituiu aporte de fundamental importância na medida em que complementou os esforços do governo colombiano com experiência e recursos. De acordo com a Defensoria do Povo, entretanto, o ACNUR tem empregado os mesmos critérios que o governo na execução de suas tarefas, quando estes critérios poderiam ser repensados e redefinidos à luz da experiência do Alto Comissariado.
Nesse sentido, acredita-se que a bagagem técnica e humanitária do ACNUR poderia ser melhor aproveitada pelo governo colombiano em alguns pontos, por exemplo, no desenho de um mecanismo de avaliação dos impactos das políticas de atenção aos deslocados. Como abordado em seções anteriores, o ACNUR parece desenvolver algo nessa linha junto à Procuradoria da Nação e à Defensoria do Povo. No entanto, é importante que essa lógica de monitoramento e avaliação seja também praticada pelas agências no âmbito do SNAIPDV.
Diretamente relacionada ao bom funcionamento dos mecanismos de avaliação, a descentralização deve também ser incorporada a esse processo, a fim de permitir uma observação mais próxima, bem como a consulta junto à população deslocada, pontos essenciais para avaliar de forma mais abrangente o impacto dessas políticas. Para além disso, é necessário que os principais atores envolvidos no processo de formulação e implementação das políticas de atenção à população deslocada direcionem seus esforços ao aprimoramento dos canais e das práticas de coordenação.
As políticas de prevenção, por sua vez, encontram-se em estado incipiente, sendo prematura qualquer avaliação. É importante destacar, entretanto, que trata-se de uma necessidade urgente, na medida em que o fenômeno, longe de ser mitigado, tem demonstrado uma tendência de aumento no número de deslocados internos no período 2003-2007. A política de prevenção parece depender diretamente da ampliação do espectro de análise do problema do deslocamento interno por parte das lideranças políticas colombianas. A partir do momento em que se passar a considerar tal fenômeno como resultante de uma complexidade de variáveis de distintas naturezas – e não somente aquelas derivadas do conflito armado – a segurança humana poderá ser lida nas entrelinhas das formulações políticas.
1. No período compreendido entre 1984 e 1994, as Forças Armadas (incluindo a polícia) chegaram a figurar como responsáveis por 25% dos deslocamentos internos. Para mais informações, ver PRADA (2007, p. 131).
2. Nessas observações cabe ressaltar dois momentos importantes: o primeiro deles, o período crítico compreendido entre 1999 e 2001, quando a área cultivada por folha de coca girava em torno de 150.000 hectares. O segundo momento diz respeito ao relatório publicado pelo Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC, sigla em inglês) em 2009, o qual, pela primeira vez, afirma que, em 2008, a superfície mundial dedicada ao cultivo da coca diminuiu 8% devido a uma redução significativa na Colômbia, de 18%. Para mais informações, ver UNODC (2009).
3. Os departamentos constituem unidades federativas análogas aos estados no Brasil.
4. De 2002 a 2008, registrou-se o deslocamento de 52.000 indígenas. Em julho de 2008, a Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC) alertou sobre a possibilidade de extinção de 32 povos indígenas em decorrência do conflito armado (CODHES, 2008, p. 3).
5. De acordo com o Censo de 1993, essas populações correspondiam a 3,34% da população colombiana
6. Para citar alguns exemplos: Corebajú (Caquetá), Puinaves (Guaviare), Emberás (Alto Sinú, Chocó e Antioquia), Paeces, Yanaconas, Guambianos, entre outros em Cauca, Tules (Chocó), Kankuamos (Sierra Nevada), diferentes povos em Putumayo, awás (Nariño).
7. No caso das comunidades indígenas, esse excerto também revela alguns dos direitos garantidos não somente pela Constituição colombiana, como também pela Declaração Universal de Direitos Humanos. Assim, o deslocamento forçado de comunidades indígenas implica diretamente a violação de direitos coletivos reconhecidos nacional e internacionalmente, por exemplo: i) direito ao território; ii) direito à autonomia; iii) direito à identidade cultural; e iv) direito à segurança e proteção por parte do Estado (JACANAMIJOY, 2004, p. 206).
8. O Artigo 12 do Decreto 2569 de 2000 entende por lar o grupo de pessoas (parentes ou não) que vive sob um mesmo teto, compartilhando alimentos e que afetados pelo deslocamento forçado pela violência. O conceito está, portanto, intimamente relacionado com aquele de “redes de apoio social” do indivíduo.
9. Mais do que a ausência do Estado, é a inoperância das instituições estatais (vazios do Estado), o que deixa espaço para que agentes privados defendam seus interesses sem que enfrentem qualquer resistência das instituições que são afirmadas como representativas dos interesses coletivos da região. Daí a importância de associar aos índices de presença institucional, o índice de impunidade: os municípios receptores apresentam, em média, 59% a mais de presença institucional do que os municípios expulsores. Além disso, apresentam índices médios de impunidade em torno de 33%. Ver MURCIA (2003, p. 71).
10. O capital social pode ser definido, grosso modo, como a medida combinada da disposição subjetiva a relacionar-se produtivamente com os demais.
11. Para citar outros: Artigo 24, sobre o direito à livre circulação; Artigo 40, sobre o direito à participação política, afetado pelo abandono de documentos de identidade no momento da fuga; Artigo 44, que trata dos direitos da criança (48% dos deslocados são menores de idade); Artigo 49, relativo ao dever do Estado de oferecer acesso à saúde e saneamento; Artigo 51, sobre o direito à moradia digna; Artigos 58 e 59, que garantem a propriedade privada; e o Artigo 64, sobre a propriedade da terra (estes três últimos serão abordados em maior profundidade a seguir).
12. É interessante observar que, na academia, esse interesse pelo deslocamento interno também surgiu tardiamente. O primeiro seminário de alcance nacional sobre o tema ocorreu somente em 1991. Essa iniciativa permitiu identificar as principais correntes teóricas interpretativas das origens e dos fluxos de deslocamento. É somente o seminário de 1997, entretanto, que marca uma evolução significativa na interpretação do deslocamento interno. De acordo com Murcia, “A partir desse e outros esforços, como o encontro organizado por CISP em Antioquia, o seminário de deslocamento, migrações internas e restruturações territoriais (1999), a compilação de boletins CODHES Informa (1999) e o seminário internacional [sobre] deslocamento, conflito, paz e desenvolvimento, realizado em Bogotá, em maio de 2000, teve início um processo de construção de hipóteses que permitiu reconhecer no deslocamento uma estratégia de guerra dos atores armados que tem referentes políticos e econômicos” (2003, p. 29).
13. CONPES é a sigla que designa os documentos produzidos pela instituição de nome correspondente: Conselho Nacional de Política Econômica e Social.
14. Para consultar os elementos que devem ser apresentados pelos programas de prevenção, consultar os artigos 20 a 24 do Decreto 2569/2000.
15. Os Artigo 25, 27 e 28 definem os termos dentro dos quais se desenvolvem as políticas de retorno da população deslocada.
16. Trata-se de uma explicação parcial, uma vez que o conflito armado atravessa, em finais da década de 1990, um período de recrudescimento, o que repercute diretamente sobre o problema do deslocamento forçado.
17. Com destaque para o Conselho Nacional, para o CNAIPDV – composto, entre outros, pela Presidência da República, Ministério da Fazenda e a Red de Solidaridad Social – e para governos locais nos níveis municipal e departamental.
18. Segundo os informes anexados à Sentença, 57% dos indivíduos registrados como deslocados não recebiam ajuda humanitária de emergência; e 80,5% não possuía acesso a programas de geração de renda que permitam sua subsistência digna e autônoma.
19. No tocante aos informes, a principal crítica da Corte Constitucional é de que estes reportam como avanços no processo de implementação das políticas o que, na realidade, constituem propósitos, planos e programas que ainda não foram desenvolvidos, além de corresponderem ao cumprimento parcial das obrigações legais e constitucionais destacadas na Sentença T-025.
20. Ver Lei 387, Decreto 2569 e algumas sentenças de tutela, como SU-1150/00, T-1635/00, ACU-1662/01, AC-4279/01.
21. Outra debilidade da política de atenção à população deslocada diz respeito ao tratamento psico-social oferecido à ela.
22. Walter Kälin assumiu a posição de Deng em setembro de 2004. Nessa época, o nome do cargo havia sido modificado para Representante do Secretário Geral das Nações Unidas para os Direitos Humanos dos Deslocados Internos. Em entrevista à Revista Migraciones Forzadas, Kälin afirma que “[A] mudança no título de meu mandato sugere que o conceito de direitos humanos dos deslocados internos é, ao menos em princípio, aceito pela comunidade internacional e indica um certo re-direcionamento do mandato, já que põe maior ênfase na proteção dos direitos humanos desse grupo.” Ver Revista Migraciones Forzadas (2005, p. 4).
23. É importante ressaltar que o documento não possui capacidade vinculante, de modo que deixa para os Estados a decisão de adotar ou não suas recomendações. Ver: Consejo Económico y Social de Las Naciones Unidas, 1998.
24. Como parte de sua linha de favorecer a descentralização territorial das políticas e a inclusão das populações mais vulneráveis nos processos de formulação e consulta acerca das políticas voltadas aos deslocados, o ACNUR abriu escritórios de representação também em Apartadó, Barrancabermeja, Barranquilla, Bucaramanga, Cúcuta, Quibdó, Mocoa, Pasto e Soacha.
25. Nesse sentido, foi reativado o Grupo Temático sobre o Deslocamento (TGD, sigle em inglês), o qual, sob a liderança ACNUR, visa à coordenação das agências da ONU para oferecer propostas de abordagem do tema do deslocamento interno em maior sintonia com as necessidades dessa população.
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