Ensaios

Reconhecimento jurídico dos direitos sexuais

Laura Davis Mattar

uma análise comparativa com os direitos reprodutivos

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RESUMO

Este artigo sistematiza as razões que levaram a um descompasso entre o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos, por meio da análise de três perspectivas: a da História, a da moral religiosa, especialmente a Católica Romana e, por fim, a do Direito. O artigo conclui apresentando os ganhos para a democracia e a cidadania pública de homossexuais (gays e lésbicas) e mulheres heterossexuais caso haja o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais.

Palavras-Chave

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I. Introdução

Este artigo demonstra a importância do reconhecimento jurídico dos direitos sexuais para homossexuais (gays e lésbicas), bissexuais e para mulheres. Para tanto, sistematiza e discute as razões pelas quais os direitos reprodutivos são mais reconhecidos do ponto de vista do direito positivo do que os direitos sexuais. As razões e a relevância dessa comparação centram-se na freqüente confusão conceitual envolvendo esses direitos e seus desdobramentos, confusão essa que decorre de uma implicação entre sexo e reprodução que vigorou por muito tempo.1 Os direitos reprodutivos referem-se, resumidamente, ao direito de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos, bem como o direito a ter acesso à informação e aos meios para a tomada desta decisão. Já os direitos sexuais dizem respeito ao direito de exercer a sexualidade e a reprodução livre de discriminação, coerção ou violência. Se por um lado esses direitos estão inter-relacionados – dado que, como se verá adiante, o exercício da sexualidade de forma livre e segura só é possível se a prática sexual estiver desvinculada da reprodução – por outro lado, sua distinção por tratamento jurídico diferenciado é o que assegura o exercício pleno da cidadania pelas mulheres e homossexuais.

A importância deste estudo deve-se, principalmente, ao reconhecimento de que a positivação de direitos,2 levando-se em conta a forma como as ordens jurídicas nacionais e a internacional estão atualmente estruturadas, afeta políticas públicas e, assim, a vida de muitas pessoas, na sua maioria mulheres, incluindo as mulheres lésbicas, e gays. Ressalte-se, entretanto, que a positivação dos direitos não significa, necessariamente, sua eficácia plena e imediata, sendo somente considerada um avanço nesta direção.

O enfoque será dado ao direito internacional dos direitos humanos. Isso porque a constituição dos direitos reprodutivos e a sinalização3 para os direitos sexuais deram-se no âmbito internacional, ou seja, nos espaços cada vez mais democráticos das conferências internacionais das Nações Unidas. Mulheres de todos os países, desenvolvidos ou não, trabalhando em delegações ou em organizações não governamentais, levaram para o cenário internacional, de forma bastante articulada e provocativa, questionamentos fundamentais sobre a cidadania feminina no mundo e suas conseqüências.

É verdade que as Declarações e os Programas e Plataformas de Ação de Conferências Internacionais, quaisquer que sejam – entre outros, de População e Desenvolvimento ou da Mulher – são considerados soft law, ou seja, não têm caráter vinculante como os tratados e convenções de direitos humanos. São, de fato, compromissos morais dos Estados signatários, que não implicam uma tradução automática para as legislações domésticas.4 Estes compromissos resultam em pressão externa para que se cumpra o acordo e, eventualmente, um constrangimento político para o Estado no caso de descumprimento. Supõe-se, assim, embora sem garantias, estar-se a incentivar a efetivação dentro das fronteiras nacionais do que foi objeto de consenso internacional.5

Não obstante, como esse incentivo por intermédio de mecanismos de soft law muitas vezes não é suficiente, a comunidade acadêmica tem procurado identificar direitos presentes em tratados de direitos humanos relacionados aos direitos sexuais e reprodutivos que possam lhes dar maior consistência normativa. Por serem, estes sim, juridicamente vinculantes, geram a obrigação legal para os Estados de efetivar os direitos sexuais e reprodutivos – mesmo que por meio de uma argumentação jurídica indireta.

Com a finalidade de explorar essas questões, este trabalho está dividido em três partes. A primeira apresenta uma breve retrospectiva histórico-contemporânea da formação dos direitos reprodutivos e sexuais tal como formulados no âmbito internacional. A segunda parte descreve as razões que explicam um grau maior de formulação e reconhecimento jurídico dos direitos reprodutivos se comparados aos sexuais. A terceira parte, por fim, conclui que uma definição clara dos direitos sexuais, com sua conseqüente positivação, beneficiará toda a sociedade.

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II. Formulação atual dos direitos sexuais e reprodutivos

Em 1948, a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), com a qual se iniciou o direito internacional dos direitos humanos e o sistema global de proteção aos direitos humanos no âmbito das Nações Unidas. Este sistema tem como destinatários todos os seres humanos, em sua abstração e generalidade.6 A construção e o reconhecimento dos direitos humanos vêm, desde então, evoluindo, tendo se expandido para áreas de importância vital para a preservação da dignidade humana. Nesse processo, denominado de especificação dos sujeitos de direitos, foram levadas em conta as especificidades de indivíduos e grupos. Dessa forma, houve um distanciamento da figura abstrata do homem para atender as diferenças existentes entre sexos, raças, gerações etc.7

Foi a partir desse processo que surgiram os direitos humanos das mulheres e, posteriormente, aqueles sexuais e reprodutivos, formulações contemporâneas, consolidadas na última década do século XX. Vejamos.

a) Direitos reprodutivos

O termo “direitos reprodutivos” tornou-se público no I Encontro Internacional de Saúde da Mulher realizado em Amsterdã, Holanda, em 1984. Houve um consenso global de que esta denominação traduzia um conceito mais completo e adequado do que “saúde da mulher” para a ampla pauta de autodeterminação reprodutiva das mulheres.8 A formulação do conteúdo dos direitos reprodutivos teve início, pois, em um marco não-institucional, de desconstrução da maternidade como um dever, por meio da luta pelo direito ao aborto e anticoncepção em países desenvolvidos.9

A partir daí, estudiosos do direito começaram a refinar o conceito de direitos reprodutivos, tentando dar precisão ao seu conteúdo. É o caso de Lynn Freedman e Stephen Isaacs que apontaram a importância da escolha reprodutiva como um direito humano universal.10 Rebecca Cook, por sua vez, defendeu a idéia de que as leis que negam, obstruem ou limitam o acesso aos serviços de saúde reprodutiva violam direitos humanos básicos previstos em convenções internacionais. Segundo ela, para ser realmente universal, o direito internacional dos direitos humanos deve exigir dos Estados que tomem medidas preventivas e paliativas para proteger a saúde reprodutiva da mulher, dando-lhe a possibilidade de exercer a sua autodeterminação reprodutiva.11

A nomenclatura “direitos reprodutivos” consagrou-se na Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD), que aconteceu no Cairo, Egito, em 1994, tendo sido reafirmada na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, China, no ano de 1995. Segundo o parágrafo 7.3 do Programa de Ação do Cairo:

[O]s direitos reprodutivos abrangem certos direitos humanos já reconhecidos em leis nacionais, em documentos internacionais sobre direitos humanos e em outros documentos consensuais. Esses direitos se ancoram no reconhecimento do direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva. Inclui também seu direito de tomar decisões sobre a reprodução livre de discriminação, coerção ou violência, conforme expresso em documentos sobre direitos humanos.

b) Direitos sexuais

Os direitos sexuais, por sua vez, começaram a ser discutidos no final da década de 80, com a epidemia do HIV/Aids, principalmente dentro do movimento gay e lésbico, a quem se juntou parte do movimento feminista.12 Segundo Sonia Corrêa e Maria Betânia Ávila, o termo “direitos sexuais” foi introduzido como estratégia de barganha na CIPD, em 1994, para que os direitos reprodutivos fossem garantidos no texto final da Declaração e Programa de Ação do Cairo – a inclusão do termo “sexual” radicalizava a linguagem de forma que ao conceder sua retirada negociava-se a manutenção de “direitos reprodutivos”.13 Com isso, o termo ‘direitos sexuais’ não aparece no documento final do Programa de Ação de Cairo.

Entretanto, a discussão sobre tais direitos foi retomada na IV Conferência Mundial sobre a Mulher. Consoante previsto no parágrafo 96 da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim:

Os direitos humanos das mulheres incluem seus direitos a ter controle e decidir livre e responsavelmente sobre questões relacionadas à sua sexualidade, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, livre de coação, discriminação e violência. Relacionamentos igualitários entre homens e mulheres nas questões referentes às relações sexuais e à reprodução, inclusive o pleno respeito pela integridade da pessoa, requerem respeito mútuo, consentimento e divisão de responsabilidades sobre o comportamento sexual e suas conseqüências.

Como se pode ver essa ainda não é uma definição propriamente dita dos direitos sexuais. Refere-se aos direitos que supostamente compõem os direitos sexuais, permanecendo o prazer, como um fim em si mesmo, oculto do discurso das Conferências Internacionais da ONU.

Rosalind Petchesky atenta para o fato de que o desenvolvimento, mesmo que incipiente do conceito de direitos sexuais, só foi possível de forma negativa, ou seja, enunciando o direito de não ser objeto de abuso ou exploração, no sentido paliativo de combate às violações. Ela pergunta, então: “porque é tão mais fácil declarar a liberdade sexual de forma negativa, e não em um sentido positivo e emancipatório? Por que é mais fácil chegar a um consenso sobre o direito de não ser objeto de abuso, exploração, estupro, tráfico ou mutilação, mas não sobre o direito de usufruir plenamente de seu próprio corpo?”. Para a autora, é preciso que o desenvolvimento dos direitos sexuais dê-se no sentido da ampliação para um conceito positivo, que vá além do combate às discriminações e abusos cometidos contra as minorias sexuais, incluindo-se aí as mulheres que não se enquadram nas formas dominantes de seu gênero. Assim, devem englobar as chamadas “titularidades (entitlements) afirmativas”, já que as titularidades afirmativas e negativas são os dois lados da mesma moeda: não posso gozar de meu corpo sexual se estou constantemente submetida ao temor, digamos, de um abuso.14

Tendo em vista a atual formulação dos direitos sexuais e reprodutivos, passamos à análise dos obstáculos e desafios para o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais na arena internacional.

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III. Perspectiva histórica

A perspectiva histórica da construção dos direitos sexuais e reprodutivos é, sem dúvida, a mais reveladora. Ao nos debruçarmos sobre a produção científica do ponto de vista médico sobre o masculino e o feminino, o entendimento sobre os corpos e a evolução das teorias a respeito da sexualidade fica mais claro porque há ainda hoje grande dificuldade de primeiro, separar a prática do sexo da finalidade da reprodução e, depois, alterar os modelos de gênero que temos, com suas perversas estruturas de poder.

De acordo com Wilza Villela e Margareth Arilha, “até o século XVII o humano era representado pelos homens, sendo as mulheres modos de corporeidade e existência intermediárias entre a humanidade e a animalidade”. Assim, só havia o sexo masculino, sendo a mulher um corpo de homem não desenvolvido.15

Foi somente a partir do século XVIII, no Renascimento, que se começou a considerar a existência de um modelo de dois sexos biológicos distintos. Foi o ambiente igualitário da Revolução Francesa que gerou uma reviravolta no modo de pensar a existência de homens e mulheres, tendo em vista a necessidade de, a partir do referencial da igualdade, desfazer a concepção de mulher como ser humano inferior. Assim, “no clamor por igualdade, liberdade e fraternidade, as mulheres deixaram de ser um homem atrofiado para ganhar um sexo e corporeidade própria”.16

Entretanto, em razão de fenômenos que transformavam a vida da mulher constantemente, como a gravidez e as “hemorragias esporádicas”, os homens achavam que as mulheres eram seres estranhos, capazes de perverter a ordem do mundo em função de sua inerente instabilidade. As mulheres pareciam estar mais sujeitas às influências externas, já que supostamente frágeis e vulneráveis – física, moral e intelectualmente.17 A inteligência estava associada ao masculino e a sensibilidade ao feminino, já que era por meio das características biológicas que se delimitavam as capacidades físicas e mentais e, portanto, os papéis que cada um dos sexos podiam assumir na sociedade.18 Neste sentido, a função precípua das mulheres era, pois, a procriação, e Deus as haviam feito com as necessárias características para o bom desempenho desta tarefa.19

Interessante notar que, segundo Fabíola Rohden, a idéia vigente à época era de que a natureza havia provido as diferenças básicas entre homens e mulheres, mas estas seriam operacionalizadas e cristalizadas ao longo de suas vidas. Para a consolidação das diferenças era preciso um bom governo da economia corporal da mulher – sendo, portanto, fundamental a cultura (em oposição à natureza). Ou seja, era da adequada e eficiente administração do desenvolvimento corporal e da capacidade reprodutiva das mulheres que dependia o desenvolvimento da sociedade.20 Isso, portanto, justificava o controle e a subordinação da mulher.

Mas, nas palavras de Wilza Villela e Margareth Arilha, “no recém-inaugurado mundo de dois sexos, [eram] as diferenças impressas pela natureza nos corpos dos homens e mulheres que os coloca [vam] ocupando lugares e funções sociais diferenciados. As mulheres seriam dotadas pela natureza de corpos e sentimentos adequados à tarefa de gestar, aleitar, cuidar do frágil bebê humano em seu processo de desenvolvimento – tarefa tão importante que as tornava quase que incapazes de desempenhar qualquer outra função social. Os homens, por não terem sido moldados para qualquer função específica, estariam incumbidos de todas as demais funções necessárias à reprodução humana, ou seja, atividades sociais, políticas, culturais e econômicas”.21

A importância da reprodução como finalidade última da relação sexual não se forma somente pelo discurso sobre a mulher e seu papel na sociedade. Atrela-se também aos discursos sobre o sexo, de forma a restringir não só as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, já que não geram filhos, como também o exercício da sexualidade pelas mulheres fora do casamento. Com isso, “qualquer expressão sexual ligada à obtenção de prazer, e não à reprodução, passa a ser rechaçada”.22

O modelo normativo, então, baseado nesta ligação sexo-reprodução, não poderia ser outro que não a heterossexualidade. Esta era (e continua sendo) entendida como a forma ‘natural’ de relação sexual,23 o que só foi possível por meio da repressão às outras formas de expressão sexual.24

Pode-se concluir, então, que as normas a respeito do exercício da sexualidade não são fatos dados, mas aprendidos socialmente: “cada cultura, em cada tempo histórico, constrói símbolos e signos do que é aceito e desejável em termos sexuais”.25

É tendo este panorama histórico mais longínquo que faremos a análise da construção histórica dos direitos sexuais e reprodutivos. Importante durante o exame da evolução histórica destes direitos ter em mente que (1) a mulher nos primórdios científicos era um corpo masculino menos desenvolvido; (2) uma vez “entendida” a existência de dois sexos, cada um tinha finalidades sociais determinadas por características biológicas, sendo a da mulher a procriação; (3) durante muito tempo houve (ainda há para alguns) uma necessária vinculação entre sexo e reprodução o que, por fim, (4) determina que a heterossexualidade, por ser a única capaz de viabilizar a reprodução, é a forma natural de se relacionar sexualmente, sendo vedadas socialmente aquelas que buscam somente o prazer, como a dos homossexuais ou fora do casamento.

A construção dos direitos reprodutivos como direitos humanos foi feita historicamente por dois movimentos distintos: o populacional e o das mulheres. Por essa razão, Lynn Freedman e Stephen Isaacs chamam-na de uma história esquizofrênica, já que cindida.26

O movimento populacional, durante a década de 60, chamado de neo-malthusiano27 previu que se não fosse revertida a curva de crescimento populacional, o mundo se destruiria. Surgiram, à época, os estudos sobre as formas de se reduzir a fertilidade, que dão origem aos anticoncepcionais – hoje já bastante disseminados, como a pílula e o DIU. Os países do terceiro mundo ao desencorajarem o uso de contraceptivos tornaram-se uma ameaça à própria raça humana, fazendo necessária, com isso, a interferência externa, ou seja, internacional.

Essa interferência tinha como único objetivo reduzir o crescimento populacional, não se preocupando de fato com as mulheres, sujeitos principais da atividade reprodutiva. A chegada dos métodos contraceptivos, que poderiam ser instrumentos de liberação feminina, já que separaram a atividade sexual da reprodução, passaram a ser vistos como um dispositivo de controle.28

Nesse sentido, a história dos direitos reprodutivos como direitos humanos – ou seja, com o enfoque na autonomia reprodutiva exercida principalmente pela mulher – supostamente começa na primeira Conferência Internacional de Direitos Humanos, que aconteceu em Teerã (Irã), no ano de 1968. Nessa Conferência, adotou-se, pela primeira vez, o que viria a ser o núcleo dos direitos reprodutivos: “os pais têm como direito humano básico decidir de forma livre e responsável sobre o número e o espaçamento de seus filhos e o direito à educação adequada e informação a este respeito”.29

Anos mais tarde, em 1974, na cidade de Bucareste, Romênia, quando da Conferência Mundial sobre População, representantes dos países em desenvolvimento defenderam a idéia de que o crescimento populacional estava vinculado ao grau de desenvolvimento dos países.30 Para eles, a prioridade dos governos do Norte para controlar o crescimento populacional era uma armação para assegurar sua primazia na ordem internacional e não um plano ‘humano’ de atenção à população dos países menos desenvolvidos. A Conferência acabou por reafirmar a linguagem do direito às escolhas reprodutivas, ampliando sua definição para incluir casais e indivíduos. Ademais, estabeleceu que as pessoas deveriam ter os meios, bem como informação e educação, para o exercício do direito reprodutivo.

Já na Conferência Mundial de População e Desenvolvimento, em 1984, no México, discutiu-se por sugestão do governo americano o crescimento populacional como um fenômeno neutro. Entretanto, em seu documento final, manteve-se a linguagem adotada em Bucareste, e ainda, incluiu-se a obrigação dos governos de tornar programas de planejamento familiar disponíveis universalmente.

Daí, a transformação da agenda da Conferência Internacional de População e Desenvolvimento realizada no Cairo, em 1994. As mulheres, principais vítimas dos programas de controle populacional, passaram de objeto a sujeito dos programas de desenvolvimento e população. Foi nesta ocasião, pois, que se conseguiu definir os direitos reprodutivos – como descrito na primeira parte.

Tal e qual o movimento populacional, o movimento de mulheres, por sua vez, também tinha na reprodução um de seus elementos centrais. Entretanto, com outro foco: o controle da mulher sobre o seu próprio corpo, sua sexualidade e vida reprodutiva. O lema feminista da década de 70 “nosso corpo nos pertence” estava em clara oposição à interferência da Igreja e do Estado.31

A década das Nações Unidas para as Mulheres iniciou-se com a I Conferência Internacional da Mulher, realizada no México, em 1975. Lá se reuniram pessoas do mundo todo (praticamente 70% eram mulheres) que conseguiram incluir na Declaração da Conferência o direito à autonomia reprodutiva. Mas, foi-se além: a declaração previu o direito à escolha reprodutiva sob a noção de controle e integridade corporal.32

Em 1979 foi adotada pela ONU a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, também chamada de CEDAW, sua sigla em inglês. Segundo Flávia Piovesan, a CEDAW fundamenta-se na “dupla obrigação de eliminar a discriminação e de assegurar a igualdade”.33

Seu artigo 16 determina a obrigação dos Estados-Partes em adotar todas as medidas necessárias para eliminar a discriminação contra as mulheres em todos os assuntos relativos ao casamento e às relações familiares e, em particular, de assegurar, com base na igualdade entre homens e mulheres, que elas tenham os mesmos direitos de decidir livre e responsavelmente sobre o número de filhos e o intervalo entre os nascimentos e de terem acesso à informação, à educação e aos meios necessários que lhes permitam exercer esses direitos.

Contudo, foi em 1993, na II Conferência Mundial sobre os Direitos Humanos, ocorrida em Viena, que a sexualidade das mulheres foi pela primeira vez invocada. Os parágrafos 18 e 38 da Declaração e Programa de Ação recorrem aos Estados para eliminar a violência baseada no gênero e todas as formas de abuso e exploração sexual.

Em dezembro do mesmo ano foi adotada na ONU a Declaração sobre a Eliminação da Violência contra a Mulher, que condena, em seu parágrafo 2º, as várias formas de violência física, sexual e psicológica sofridas pela mulher, afirmando estarem tais direitos e princípios embutidos nos tratados internacionais de direitos humanos. Ressalte-se, que esta declaração serviu de base para a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, aprovada pela Organização dos Estados Americanos, em 1994, cujo conteúdo é juridicamente vinculante aos países que a ratificaram.

Foi também em 1994, na Conferência sobre População e Desenvolvimento do Cairo, que o movimento feminista conseguiu deslocar definitivamente a questão demográfica para o âmbito dos direitos reprodutivos. Ficou explicitamente definido na Conferência que as políticas populacionais deveriam ser por orientadas pelos direitos humanos.34

Embora tenha sido impossível conceituar no Cairo os direitos sexuais, são inúmeras as referências ao “sexo” ou à “sexualidade”. Petchesky sustenta que a inclusão da saúde sexual como um direito a ser protegido deriva do esforço das delegações da África Sub-Saariana, cujas conseqüências da epidemia do HIV/Aids foram e continuam sendo devastadoras.35

A Plataforma de Ação elaborada na IV Conferência Mundial da Mulher, em Pequim, no ano de 1995, reafirmou as conquistas em relação aos direitos reprodutivos – a partir de então definitivamente incorporados na linguagem dos direitos humanos – e também conseguiu avançar na formulação dos direitos sexuais como parte dos direitos humanos. O consenso possível, de acordo com Petchesky, foi “notável”, já que pela primeira vez na história as mulheres foram consideradas seres sexuais, além de reprodutivos.36

Um dos principais pontos a serem enfatizados nesta retrospectiva histórica é o de que a interligação entre população e desenvolvimento claramente acelerou a positivação dos direitos reprodutivos que, como diria Norberto Bobbio, enquanto direitos humanos, “nascem em […] circunstâncias caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes”.37

Ademais, o fato dos direitos reprodutivos constituírem-se como uma demanda única e exclusiva do movimento feminista, deu-lhe coesão e, portanto, mais força. Na defesa dos direitos sexuais os atores são grupos de gays, lésbicas juntamente com parte do movimento de mulheres, não tendo sido desenvolvida a articulação necessária para a elaboração de estratégias eficazes, o que fez com que a conquista destes direitos restasse prejudicada.

Passemos agora à analise da perspectiva moral que obstrui o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais, se comparados aos direitos reprodutivos.

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IV. Perspectiva moral, com enfoque na perspectiva católica religiosa

Os obstáculos ao reconhecimento e à positivação dos direitos sexuais (e reprodutivos) impostos pela moral serão discutidos sob a ótica da religião, exemplificada aqui pela religião católica romana. Isto não quer dizer que não haja óbice para tal reconhecimento em outras religiões, como a muçulmana ou a judaica. Essas também vêem no exercício da sexualidade um tabu. Entretanto, a Igreja Católica, representada pelo Vaticano, com seu status e recursos disponíveis, tem exercido um papel mais ativo e de maior visibilidade na oposição aos direitos sexuais, sendo assim um exemplo mais claro dos obstáculos existentes.

Para a Igreja Católica Romana: (i) há um único padrão de família, a nuclear, formada por um homem e uma mulher e sua prole; (ii) a sexualidade só deve ser exercida para a reprodução e, mesmo assim, dentro do casamento; (iii) qualquer tipo de contracepção é sempre mau, e (iv) o aborto provocado, até para salvar a vida de uma mulher, é sempre imoral. A vida sexual das pessoas, na visão desta Igreja, não é um fim em si, senão um instrumento de procriação. E, por fim, (v) as mulheres não são ordenadas ao sacerdócio, e permanecem excluídas de todas as funções de tomada de decisões.38 Estes eram os padrões do Código Canônico e continuam a ser os padrões cristãos católicos. Assim, é possível afirmar que a crença católica naturaliza os papéis de gênero, e que a instituição esforça-se para que estes sejam mantidos pela cultura.

Esse entendimento é radicalizado nas esferas da sexualidade e da reprodução. Sua naturalização e cristalização ao longo do tempo, de acordo com Sonia Corrêa e Maria Betânia Ávila, sugerem que não é possível aplicar a estes domínios da vida humana a racionalidade do direito. Elas afirmam que “um desafio permanente da teorização dos direitos reprodutivos e sexuais tem sido questionar essa persistente naturalização […], com base em um novo paradigma que pensa a reprodução e a sexualidade como fenômenos de construção social […]. Um primeiro passo nessa direção é demonstrar que os discursos que naturalizam a reprodução e a sexualidade constituem de fato um estratagema ideológico para encobrir as muitas regras de regulação e disciplina a que a sexualidade e a reprodução estiveram e continuam sujeitas”.39

Tendo isso em mente, vejamos qual foi o papel da Igreja Católica, representada pelo Vaticano, ao longo do processo de construção dos direitos sexuais e reprodutivos na arena internacional.

Tanto na Conferência do Cairo, como na de Pequim, o movimento feminista organizado contrapôs-se aos grupos religiosos fundamentalistas, grupos populacionais e aqueles governamentais conservadores – todos muito mais poderosos. Consoante o entendimento de Rhonda Copelon e Rosalind Petchesky, um dos desafios do Cairofoi, pois, enfrentar a coalizão de fundamentalistas religiosos, unidos com o Vaticano e alguns Estados muçulmanos, que tentaram impor uma agenda rigidamente pró-natalista, opondo-se a qualquer termo que pudesse sugerir a aceitação do aborto e do prazer sexual, a educação e os serviços para adolescentes, a existência de gays e lésbicas bem como seus direitos, ou qualquer forma de família ou união fora da forma tradicional heterossexual.40

Este grupo tentou persistentemente prever no documento final de Cairo a religião e as culturas tradicionais como possíveis restrições à implementação dos direitos humanos, em total desacordo com o previsto no parágrafo 22 da Declaração de Viena – que dispõe que a cultura não deve ser invocada para negar os direitos humanos das mulheres. Neste parágrafo, todos os Estados são convidados a aplicarem, na prática, as disposições da Declaração sobre a Eliminação de todas as formas de Intolerância e Discriminação fundadas na Religião ou nas Convicções, de 1981, da ONU.

Tal Declaração considera em seu preâmbulo que é “essencial promover a compreensão, a tolerância e o respeito nas questões relacionadas com a liberdade de religião e de convicções e assegurar que não seja aceito o uso da religião ou das convicções com fins incompatíveis com os da Carta [da ONU] […]”. Por “intolerância e discriminação baseadas na religião ou nas convicções” entende-se toda distinção, exclusão, restrição ou preferência fundada na religião ou nas convicções e cujo fim ou efeito seja a abolição ou o fim do reconhecimento, o gozo e o exercício, em igualdade, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Intolerância e discriminação eram exatamente o que o Vaticano, junto com grupos religiosos fundamentalistas, estava propondo. Em razão disso, o Programa do Cairo falhou em não reafirmar que os direitos humanos têm preferência sobre conflitos de tradição cultural e religiosa.41

No final da Conferência do Cairo, consoante o Programa de Ação adotado, as delegações dissidentes registraram suas reservas. Especialmente relevante é a da Santa Sé cujo texto diz: “com referência aos termos ‘casais e indivíduos’, a Santa Sé mantém sua posição, de que esses termos significam casais unidos pelo matrimônio de homens e mulheres, enquanto indivíduos, que constituem o casal”.42 Com isso, fica clara a aversão aos direitos sexuais, que espreitava o tabu da homossexualidade, da bissexualidade e das formas alternativas de família.43

De todo modo, a afirmação positiva do valor de “uma vida sexual satisfatória e segura” sem limitação baseada em orientação sexual ou idade, pode ser considerada uma vitória parcial em vista do silêncio do documento quanto à sexualidade.44

A negociação na Conferência de Pequim também foi complicada: de um lado, as mulheres e, do outro, o Vaticano e seus aliados. Este, também representado por um grupo de mulheres norte-americanas denominado de “Coalizão para a Família e as Mulheres”, segundo relato de Rosalind Petchesky, distribuiu um panfleto intitulado Direitos Sexuais e Orientação Sexual: o que realmente significam essas palavras, associando “essas palavras” não apenas com a homossexualidade, o lesbianismo, as relações sexuais fora do casamento e entre adolescentes, mas também com “pedofilia”, “prostituição”, “incesto” e “adultério”. Soma-se a este esforço organizado o fato de, meses antes da Conferência, ter sido veiculada coincidentemente a encíclica Evangelium Vitae em que “o papa condena as idéias e práticas que garantem autonomia reprodutiva e sexual, associando-as com uma ‘mentalidade hedonista que se recusa a aceitar responsabilidades em assuntos ligados à sexualidade’ e com um ‘conceito egocêntrico de liberdade’”.45

Assim, justifica-se o desaparecimento na versão final da Plataforma de Pequim da expressão “direitos sexuais”, que estava em seu rascunho, e nunca terem surgido os termos “orientação sexual” e “lésbicas e gays”.46 Apesar disso, ressalte-se, foi possível aprovar o histórico parágrafo 96, com reserva da Santa Sé, que não se comprometeu com sua implementação.

A partir da posição da Igreja Católica nas Conferências Internacionais, é possível entender os entraves ao reconhecimento jurídico dos direitos sexuais e, também, reprodutivos. Há uma moralidade sexual e uma segurança da instituição familiar nuclear que devem ser preservadas como reflexo de uma visão negativa e bastante discriminatória da mulher e do exercício da sexualidade. A Igreja acaba por transformar a atividade sexual de cada um em balizador moral da pessoa, ficando seu caráter e moral subordinados à sua condição de homo ou heterossexual, casado ou não, regrado ou não quanto ao sexo.47

Instaura-se, pois, uma ameaça à universalidade dos direitos humanos, uma vez que ainda existem vozes que querem um conceito de direitos humanos sensível aos valores culturais e religiosos.48 Essas vozes, claramente, fazem uso político da religião, a cultura e a tradição para oprimir não só as mulheres, mas também as minorias sexuais, negando-lhes o exercício pleno da cidadania. Mas, argumentos de convicção religiosa, como elucida Lima Lopes, não podem ser legitimamente usados no espaço democrático quando fundados em si mesmos. Nesse sentido, a convicção religiosa alheia, quando há previsão de liberdade de convicção religiosa, não pode privar o exercício de direitos de determinado grupo social que não se recusa a cumprir os deveres gerais de cidadania.49

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V. Perspectiva do direito

A perspectiva do direito é a mais ampla dentre as aqui tratadas, uma vez que engloba uma série de questões. Primeiro, o fato dos direitos humanos em sua origem, terem sido, como veremos, formulados pelos homens, de acordo com as suas próprias necessidades. Depois, em razão da tradicional distinção de regulamentação e aplicação do direito entre a esfera pública e a privada. Essa distinção também afetou o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais em relação aos reprodutivos. Esta parte do artigo trata, ainda, e por fim, da importante conexão entre direitos reprodutivos e direito à saúde, que favoreceu o reconhecimento daqueles. Os direitos sexuais, cuja vinculação com a saúde só ocorreu posteriormente, mantiveram-se, como exposto adiante, relacionados aos chamados direitos liberais. Daí a preferência por sua não-regulamentação pelo Estado, o que prejudicou seu reconhecimento jurídico. Vejamos.

Desde o início da construção contemporânea dos direitos humanos, no pós- 2ª Guerra Mundial, houve o reconhecimento jurídico de um grande leque de direitos. Apesar de ter evoluído bastante, este ramo do direito, como afirmam Henry Steiner e Philip Alston, ainda tem nos direitos humanos das mulheres um de seus “pontos cegos”.50 O mesmo pode ser dito sobre os direitos dos homossexuais.

Segundo Katherine Bartlett, analisar as leis sob a ótica feminina significa examinar como falham em levar em conta as experiências e os valores das mulheres ou, ainda, verificar como as prejudicam.51 De acordo com Rebecca Cook, feministas têm dado ênfase ao quanto a indeterminação da lei, que se diz neutra e objetiva, mascara hierarquias e as distribuições de poder.52 Ora, não é possível pensar o direito sem as relações de poder entre os sexos, as classes e as etnias presentes na sociedade que o constrói. Evidente, pois, sua tendência de refletir o grupo dominante composto por homens, brancos e heterossexuais.

Em razão disso, o movimento feminista construiu sua agenda de direitos valendo-se da discriminação, ou seja, buscando a igualdade entre homens e mulheres. Discriminação, neste caso, é o prejuízo, o não reconhecimento ou o não exercício dos direitos humanos pela mulher em razão da distinção, exclusão ou restrição baseada em seu sexo. Mas quais os direitos humanos cuja reivindicação era dificultada às mulheres? Segundo Florence Butegwa,53 eram aqueles que não tinham paralelos masculinos, quer dizer, que dizem respeito às necessidades que os homens não têm.

Sem direitos humanos “exclusivos” de seu gênero, ficaram muito tempo sem regulação estatal direitos humanos fundamentais das mulheres,54 como é o caso dos reprodutivos, relativos à reprodução que ocorre em seu corpo.55 Neste sentido, para provarem violações dos seus direitos, tinham que, sem paralelo algum no mundo masculino, provar que tinham sido discriminadas e que o Estado falhou em protegê-las da forma como protege aos homens.

Por essa razão, Margaret Schuler entende que, embora o discurso da discriminação seja um instrumento poderoso de reivindicação de direitos, o discurso dos direitos é muito importante, já que as mulheres (e também homossexuais) têm características que as diferem dos homens (heterossexuais), e que requerem uma estrutura de direitos específica.56

Diante deste vácuo legal, o movimento feminista passou a reinterpretar os direitos que não foram tradicionalmente pensados para serem aplicados às mulheres. É o caso do direito à vida, previsto no artigo 6(1) do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, tradicionalmente entendido como a obrigação dos Estados-Parte de assegurar a observância do devido processo legal para imposição de uma pena de morte. O Comitê de Direitos Humanos da ONU, ligado ao mencionado Pacto, considera essa interpretação restritiva e afirma que a proteção ao direito à vida requer a adoção de medidas positivas, como aquelas voltadas para a redução da mortalidade infantil e o aumento da expectativa de vida.

O direito da mulher à vida, ou à sobrevivência, assegura-lhe o acesso aos serviços de saúde; portanto, qualquer restrição a tal acesso deve ser considerada violação ao direito internacional dos direitos humanos. Consoante Rebecca Cook, a aplicação tradicional do direito à vida é male-oriented – orientada ao gênero masculino -, já que os homens assimilam a violação ao direito à vida à pena de morte mais facilmente do que à morte por gravidez, ignorando a realidade histórica das mulheres.57

Esta reinterpretação dos direitos alargou o grau de responsabilidade do Estado e, mais recentemente, aumentou o poder dos Comitês que monitoram as ações/omissões daqueles relacionadas aos direitos das mulheres. Ainda assim, as mulheres, e os homossexuais, não têm a mesma aceitação como parte do sistema e como sujeitos plenos de direitos humanos, faltando-lhes freqüentemente a proteção do direito.58

À falta de proteção do direito às questões específicas das mulheres (e, ainda mais, dos homossexuais) somou-se a primazia da regulação e aplicação do direito na esfera pública. Karen Engle,ao tratar da distinção entre o público e o privado, critica o direito internacional público apresentando duas posições: uma que entende que ele é falho porque ao excluir o privado – a esfera doméstica, onde a mulher está mais presente – deixa de ser realmente universal; e outra que entende que ele usa a divisão entre público e privado de forma conveniente para evitar questões relativas às mulheres. De acordo com os defensores da primeira tese, o direito internacional público deve ser reconceitualizado para incluir as mulheres e o espaço privado. Já para os outros, os instrumentos doutrinários necessários para acomodação das mulheres no direito internacional já existem nos direitos humanos, o que significa que sua aplicação é feita de forma inconsistente – bom exemplo é a possível intervenção para abolir formas ‘privadas’ de violência, como o canibalismo ou a escravidão.59

A análise de Engle, acima exposta, indica claramente que não era do interesse do Estado regulamentar o que ocorria no âmbito doméstico, sendo-lhe conveniente manter-se alheio ao que lá se passava. Daí porque os direitos reprodutivos ficaram por tanto tempo sem regulamentação estatal.

Já a regulação da sexualidade mantém-se até o presente na interface entre o público e o privado. Se por um lado, o exercício dos direitos sexuais está no âmbito da privacidade e da liberdade sexual relativa à forma como se obtém prazer; por outro, é preciso a proteção estatal para que essa liberdade possa ser exercida plenamente, sem discriminação, coerção ou violência. O equilíbrio da regulação e desregulação estatal – ou seja, entre liberdade e proteção – é, como dizem Sonia Corrêa e Maria Betânia Ávila, um tema “inconcluso”. Em especial porque, ao romper as barreiras da esfera privada, em que, com freqüência, ocorrem os abusos em relação à sexualidade (e à reprodução), pode-se dar espaço para uma exagerada intervenção estatal implicando restrição à liberdade do indivíduo.60 Ao buscar este equilíbrio, corre-se o risco de se estar a fazer um convite para o abuso da discricionariedade estatal.

Resta evidente, pois, que a primazia da regulação e aplicação do direito na esfera pública contribui para que mulheres e minorias sexuais não tenham a proteção necessária do direito para exercer suas cidadanias no âmbito doméstico. A democracia, como nos ensina Pitanguy, não se refere apenas ao exercício da cidadania na esfera pública, mas também às relações na vida cotidiana, no trabalho, na família, na saúde, na educação.61

Em vista disso, como o movimento feminista conseguiu trazer a demanda por direitos reprodutivos e sexuais para a esfera do direito? A formulação dos direitos reprodutivos, e sua conseqüente positivação, deram-se a partir de sua aliança com o direito à saúde. Como um direito humano, a saúde apareceu pela primeira vez na DUDH, de 1948, tendo sido mais bem definido posteriormente em inúmeros documentos internacionais de proteção aos direitos humanos. É o caso do artigo 12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, que o formula como “o direito de toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível de saúde física e mental”, exemplificando medidas que devem ser adotadas para assegurar seu pleno exercício.

A CEDAW, de 1979, no seu artigo 12, também prevê o direito à saúde como um direito das mulheres, ressaltando a importância de “assegurar-lhes, com base na igualdade dos homens e das mulheres, o acesso aos serviços médicos, incluindo os relativos ao planejamento familiar”. O 2 o parágrafo do artigo estabelece como obrigação dos Estados-Partes fornecer às mulheres serviços apropriados gratuitos durante a gravidez, parto e pós-parto. Esses são exemplos da evolução do conceito de direito à saúde na arena internacional.

Com base nestes dispositivos, o movimento feminista começou a lutar na década de 70 pelos direitos reprodutivos, reivindicando a descriminalização do aborto. O aborto, enquanto um obstáculo ao exercício da liberdade humana da mulher,62 é um problema de saúde pública. Isso porque muitos são realizados de forma insegura, com riscos à saúde das mulheres, senão sua morte. De acordo com Rebecca Cook, “a OMS estimou que a cada ano morrem 500.000 mulheres de causas relacionadas à gravidez, sendo que o aborto inseguro gera entre 25 e 50% dessas mortes”.63 Sob a ótica da saúde, estas são evidentemente mortes evitáveis.

Para demonstrar a negligência estatal em relação às mulheres o movimento feminista usou dados estatísticos, que ajudaram a trazer para o debate público a necessidade de positivação dos direitos reprodutivos e o dever positivo dos Estados de prestar assistência à saúde integral da mulher – o que requer a formulação e execução de políticas públicas.

Contudo, à época, a mesma ligação entre saúde e direitos sexuais não foi possível. Associados à liberdade sexual, à privacidade e ao direito de não sofrer discriminação, coerção ou violência, o Estado deixou de regulamentar os direitos sexuais para salvaguardar a vida privada do indivíduo, principalmente de sua interferência.

Reitere-se que a sexualidade esteve ausente do discurso internacional sobre os direitos humanos até 1993.64 Não só; o discurso sobre os direitos humanos aceita a vida sexual apenas de modo implícito e, mesmo assim, restrita à reprodução e, portanto, ao casamento heterossexual. Basta pensar que nem mesmo a CEDAW menciona a liberdade sexual ou os direitos das lésbicas. Como nos ensinam Wilza Villela e Margareth Arilha, não faz sentido isolar a categoria “lésbica” da discussão política sobre opressão sexual que sofrem todas as mulheres, independente de sua orientação sexual.65

Mas, como a história bem demonstrou, existem “dimensões da autonomia privada da pessoa humana tão relevantes para a sua dignidade, que se torna necessário protegê-las até mesmo do legislador, encarnação da vontade das maiorias”.66 Os direitos sexuais, embora principalmente de caráter negativo – de abstenção estatal -, exigem uma prestação positiva do Estado, qual seja garantir seu exercício.

Esta constatação, entretanto, não foi suficiente para haver a regulamentação dos direitos sexuais. Foi somente com a eclosão da epidemia da AIDS, nos anos 80, que por uma questão de saúde, a sexualidade foi incorporada ao debate público internacional. Esta associação foi, novamente, determinante para as conquistas de direitos, neste caso dos gays e lésbicas.

Em países em desenvolvimento a vinculação com o direito à saúde ainda é muito importante. É por meio de um serviço público de saúde eficiente que mulheres, gays e lésbicas “conseguem” exercer plenamente sua cidadania, desde que protegidas sua liberdade e autonomia.67

Assim, resta claro que a vinculação com o direito à saúde viabilizou a formulação e positivação dos direitos reprodutivos e, posteriormente, ainda que de forma preliminar, a dos direitos sexuais.

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VI. Conclusão

Neste trabalho vimos que a formulação e o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais estão menos desenvolvidos que a formulação e o reconhecimento dos direitos reprodutivos. Apresentaram-se razões para este descompasso: (i) a perspectiva histórica demonstrou a ligação entre as questões populacionais e os direitos reprodutivos, que trouxe previamente sua discussão para arena pública internacional; (ii) a perspectiva da moral católica, que tentou ocultar a diversidade sexual apresentando-a como amoral; e, por fim, (iii) a perspectiva do direito que apontou a formulação ‘masculina’ do direito internacional dos direitos humanos e a distinção da aplicação do direito nas esferas pública e privada. Ainda, apresentou-se a estratégia tanto do movimento feminista, como daquela de gays e lésbicas, de vincular tais direitos ao direito à saúde com vistas ao seu reconhecimento jurídico. Resta-nos agora compreender a importância deste reconhecimento para a democracia e a cidadania pública de homossexuais e mulheres.

Segundo Lima Lopes, os direitos de reconhecimento existem a partir de alguns pressupostos: (a) de que existem na sociedade grupos estigmatizados; (b) que os estigmas68 são produtos institucionais e históricos; (c) que os estigmas podem não ter fundamentos científicos, racionais ou funcionais para a sociedade; (d) que as pessoas que pertencem a grupos estigmatizados sofrem a usurpação ou negativa de um bem imaterial, que é o respeito e o auto-respeito; (e) que a manutenção social dos estigmas é, portanto, uma injustiça, provocando desnecessária dor, sofrimento, violência e desrespeito; e (f) que os membros de uma sociedade têm direito a que lhes sejam retirados os estigmas alvitantes.69

Neste contexto, certamente, os homossexuais não são reconhecidos em nossas sociedades. As conseqüências desta negativa, ainda de acordo com Lima Lopes, são muitas. A primeira é a violência física, ou seja, o impedimento de alguém estar fisicamente seguro no mundo. Depois, a violência não física, que se subdivide em duas: a primeira – aqui, mais relevante – é a exclusão da esfera de direitos, negando à pessoa autonomia social e a possibilidade de interação; e, a segunda, a negativa de valor de uma forma de ser ou de viver, que supostamente explica o tratamento degradante e insultuoso a pessoas e grupos.70

Partindo-se do ponto de vista de Lima Lopes de que a negativa de direitos somada ao tradicionalismo do “status quo” é mantenedora e fomentadora das formas mais evidentes de violência física e é em si mesma uma ofensa ao regime democrático de iguais liberdades, não é de se admirar sua conclusão de que “sob o silêncio do sistema jurídico […] se cultive a intolerância”.71

Nesse sentido, a não regulação pelo direito – nos ordenamentos postos – contribui para a naturalização das diferenças e desigualdades comuns na cultura. A regulamentação pelo direito, segundo Lima Lopes, ajudará a promover as mudanças e a remover as injustiças historicamente consolidadas para com grupos estigmatizados, no caso os homossexuais.72 Acrescente-se a isto o fato de que estes grupos passarão a exercer plenamente sua cidadania e a sentir-se pertencentes a uma sociedade que valoriza a diversidade e a pluralidade e não simplesmente as tolera.

Nas palavras de Maria Betânia Ávila, os “[d]ireitos sexuais, ao colocar as relações sexuais como relações sociais a serem consideradas no plano da cidadania, a serem, portanto, mediadas e garantidas nas necessidades que produzem por meio de direitos, colocam a heterossexualidade e a homossexualidade como práticas sexuais igualmente livres”.73 O valor do reconhecimento jurídico dos direitos sexuais para os homossexuais está justamente no fato de assinalar a importância da dimensão sexual na vida humana74 e no resguardo da dignidade humana. Só assim, todos terão acesso aos direitos e às liberdades fundamentais que caracterizam a democracia.

Mas, o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais também tem conseqüências importantes para o cotidiano das mulheres, especialmente as heterossexuais. Isto ocorre porque, além de sofrerem repressão sexual, vivenciam abusos e violências que residem numa cultura que ainda não reconhece sua liberdade sexual. Nesse sentido, o reconhecimento dos direitos reprodutivos da mulher, se comparados aos direitos sexuais, foi possível por estarem ligados à suposta “função” ou “natureza” feminina, qual seja a reprodução. Mas, e o prazer sexual? Tem a mulher direito a usufruir seu próprio corpo?

Com o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais é possível, finalmente, dizer que sim. Ele consolida a separação do sexo e da reprodução, fazendo com que se entenda definitivamente que elas, as mulheres, são sim seres sexuais, e não somente reprodutivos. Dito de outra forma, o reconhecimento jurídico dos direitos sexuais das mulheres carrega consigo um caráter emancipatório, libertário, por aceitar como positivo e desejado o prazer sexual da mulher. Tornar a “vida sexual satisfatória e segura” um direito de todos, mas especialmente das mulheres (e dos homossexuais), representa um enorme ganho em sua qualidade de vida, já que poderão sem culpa buscar e sentir prazer sexual, com o(a) parceiro(a) que escolherem, de modo a exercer sua cidadania tanto na esfera pública, como no contexto privado, íntimo, doméstico.

Ressalte-se, entretanto, como dito anteriormente, que a mera positivação dos direitos não é garantia de sua efetivação. Ainda é preciso refletir sobre como efetivar os direitos humanos com vistas ao seu exercício por todos e à sua aceitação e reconhecimento sócio-cultural. Seja como for, o panorama atual indica a importância de expandir as fronteiras do debate sobre direitos humanos, incluindo novos direitos, como os sexuais, que assegurem ao menos do ponto de vista formal a dignidade humana de grupos vulneráveis, como as mulheres e os homossexuais.

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Notas

1. Não é só o sexo que se desvinculou da reprodução. A reprodução hoje também está desvinculada do sexo, tendo em vista os progressos científicos que deram origem à fertilização in vitro, entre outros métodos já disponíveis.

2. A relação entre positivação de direitos e sua implementação como políticas públicas não é automática. Sabe-se que direitos positivados podem não ter nenhuma eficácia social nem gerar, por parte do Estado, a destinação de recursos para sua efetivação. Entretanto, neste trabalho, adotar-se-á a premissa de que a positivação é um passo significativo no processo de implementação e efetivação de direitos. Isto porque especificamente no caso dos direitos sexuais, como se verá neste trabalho, a positivação de certa forma afasta considerações de caráter moral que representam obstáculos ao reconhecimento de homossexuais e transexuais, por exemplo, como sujeitos de direito.

3. Sinalização é a expressão usada por Miriam Ventura para a incipiente formulação e reconhecimento dos direitos sexuais. (VENTURA, M. (org.). Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos na Perspectiva dos Direitos Humanos: síntese para gestores, legisladores e operadores do direito. Rio de Janeiro: ADVOCACI, 2003, p. 14.)

4. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B. Direitos Sexuais e Reprodutivos – Pauta Global e Percursos Brasileiros. In: BERQUÓ, E. (org.). Sexo & Vida: Panorama da Saúde Reprodutiva no Brasil.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, p. 17-78, 2003, p. 23.

5. Mesmo assim, não se pode deixar de mencionar que, freqüentemente, há dificuldades em transpor tais consensos para arena doméstica.

6. PIOVESAN, F. Os Direitos Humanos da Mulher na Ordem Internacional. In: PIOVESAN, F. Temas de Direitos Humanos, 2 a ed., São Paulo: Max Limonad, p. 205-219, 2003, p. 205-206.

7 PITANGUY, J. O Movimento Nacional e Internacional de Saúde e Direitos Reprodutivos. In: GIFFIN, Karen e COSTA, Sarah H. (orgs.). Questões da Saúde Reprodutiva. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, p. 19-38, 1999, p. 37.

8. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 20.

9. CORRÊA, S. Saúde Reprodutiva, Gênero e Sexualidade: legitimação e novas interrogações. In: GIFFIN, K. e COSTA, S.H. (orgs.). Questões da Saúde Reprodutiva. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, p. 39-50, 1999, p. 41.

10. FREEDMAN, L.P. e ISAACS, S.L. Human Rights and Reproductive Choice. Studies in Family Planning, v. 24, n. 1 p. 18-30, 1993.

11. COOK, R. International Human Rights and Women’s Reproductive Health. Studies in Family Planning, v. 24, n. 2, p. 73-86, Marc-Apr. 1993.

12. O segmento do movimento feminista que se juntou na luta por direitos sexuais aos gays e lésbicas (que sofrem tanta opressão por serem mulheres como todas as outras) é aquele que considera a sexualidade como domínio crucial para compreender e transformar a desigualdade de gênero (CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 21).

13. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 21.

14. PETCHESKY, R.P. Direitos Sexuais: um novo conceito na prática política internacional. In: BARBOSA, Regina M. e PARKER, Richard (orgs.). Sexualidades pelo Avesso: direitos, identidades e poder. Rio de Janeiro: IMS/UERJ; São Paulo: Ed. 34, p. 15-38, 1999, p. 16, 24-25.

15. VILLELA, W.V. e ARILHA, M. Sexualidade, Gênero e Direitos Sexuais e Reprodutivos. In: BERQUÓ, Elza. (org.). Sexo & Vida: Panorama da Saúde Reprodutiva no Brasil. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, p. 95-150, 2003, p. 95 e 102.

16. Ibid, p. 102-103.

17. ROHDEN, F. A Construção da Diferença Sexual na Medicina. In: Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 19(Sup. 2):S201-S212, 2003, S206.

18. Ibid.

19. VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 95.

20. ROHDEN, F., op. cit.,nS205-S206.

21. VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 103.

22. VILLELA, W.V. Mulher e Saúde Mental. Tese (doutorado em medicina preventiva), FMUSP, USP, São Paulo, 1992, apud VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 104.

23. É justamente contra essa visão moral do que é natural que o movimento gay e lésbico luta, já que essa é uma questão central na configuração de suas cidadanias.

24. ÁVILA, M. B. Direitos Sexuais e Reprodutivos: desafios para as políticas de saúde. In:Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 19 (Sup.2):S465-S469, 2003, S466.

25. VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 98.

26. FREEDMAN, L.P. e ISAACS, S.L., op. cit., p. 21.

27. Thomas R. Malthus, economista britânico do século XIX (1766-1834), defendeu em seu livro “Ensaio sobre o Principio da População” sua teoria de que enquanto as populações cresciam de forma geométrica, os recursos naturais para a manutenção dessas populações aumentavam em forma aritmética. Assim, Malthus decretava o colapso da população humana se não se submetessem, de forma voluntária, à redução da natalidade.

28. ÁVILA, M.B. Direitos Reprodutivos: o Caos e a Ação Governamental. In: SOS CORPO – Grupo de Saúde da Mulher. Os Direitos Reprodutivos e a Condição Feminina. Recife, PE: SOS CORPO, p.17-25, 1989, p. 18.

29. FREEDMAN, L.P. e ISAACS, S.L., op. cit., p. 20.

30. Ibid, p. 22.

31. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 19.

32. Note-se, como atentam Freedman e Isaacs, o contraste desta declaração com aquelas de Teerã e de Bucareste, que nada dispuseram a respeito da integridade e controle da mulher sobre o seu corpo.

33. PIOVESAN, F. Integrando a Perspectiva de Gênero na Doutrina Jurídica Brasileira: Desafios e Perspectivas. In: PIOVESAN, F. Temas de Direitos Humanos, 2 a ed., São Paulo: Max Limonad, p. 221-235, 2003, p. 207.

34. BARSTED, L.L. As Conferências das Nações unidas influenciando a mudança legislativa e as decisões do Poder Judiciário. In: Seminário: Direitos Humanos: Rumo a uma Jurisprudência da Igualdade, Belo Horizonte, 14 a 17. de Maio de 1998, apud PIOVESAN, F. e PIROTTA, W.R.B. A Proteção dos Direitos Reprodutivos no Direito Internacional e no Direito Interno. In: PIOVESAN, F.Temas de Direitos Humanos, 2 a ed., São Paulo: Max Limonad, p. 237-276, 2003, p. 241-242.

35. PETCHESKY, R.P., op. cit., p. 19.

36. Ibid, p. 21.

37. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 5.

38. KISSLING, F. Perspectivas Católicas Progressistas em Saúde e Direitos Reprodutivos: o desafio político da ortodoxia. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 14 (Supl.1), 1998, p. 135-137.

39. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 58.

40. COPELON, R. e PETCHESKY, R.P. Toward and Interdependent Approach to Reproductive and Sexual Rights as Human Rights: Reflection on the ICPD and beyond. In: SCHULER, M.A. (ed.).From Basic Needs to Basic Rights. Washington D.C.: Women, Law and Development International, p. 343-368, p. 1995, p. 348-349.

41. Ibid, p. 355-356.

42. Conforme o Relatório da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento. Organização das Nações Unidas, 1994, Cairo, 5-13 de set..

43. PETCHESKY, R.P., op. cit., p. 22.

44. COPELON, R. e PETCHESKY, R.P., op. cit., p. 355.

45. PETCHESKY, R.P., op. cit., p. 23.

46. Ibid, p. 20-21.

47. WEEKS, J. Sexuality and its discontents: meaning, myths and modern sexualities. Londres: Routledge & Keagan Paul, 1985, apud VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p.105.

48. BUTEGWA, F. International Human Rights Law and Practice: Implication for Women. In: SCHULER, M.A. (ed.). From Basic Needs to Basic Rights. Washington D.C.: Women, Law and Development International, p. 27-39, 1995, p. 33.

49. LIMA LOPES, J.R. de. O Direito ao Reconhecimento para Gays e Lésbicas. In: Sur – Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 2, p. 65-95, 2005.

50. STEINER, H.J. e ALSTON, P.International Human Rights in Context: law, politics, morals. Text and Materials, 2nd Edition. New York: Oxford University Press Inc., 2000, p. 158.

51. BARTLETT, K. Feminist Legal Methods. Harvard Law Review. Cambridge: The Harvard Law Review Association, v. 103, n. 4, p. 829-888, Feb. 1990, apud COOK, R. International Human Rights and Women’s Reproductive Health. Studies in Family Planning, v. 24, n. 2, p. 73-86, Marc-Apr. 1993, p. 76.

52. COOK, R., op. cit., p. 76.

53. Conforme mencionado por Margareth Schuler em: SCHULER, M. Introduction. In : SCHULER, M. (editor.) From basic needs to basic rights. Women´s claim to human rights. Washington D.C.: Women, Law and Development International, p. 1-24, 1995, p. 10.

54. O mesmo ocorreu com os direitos das lésbicas e dos homossexuais.

55. BUTEGWA, F., op. cit., p. 31.

56. SCHULER, M., op. cit., p. 10.

57. COOK, R. Women’s Health and Human Rights. Genebra: Organização Mundial da Saúde, 1994, p. 24.

58. SCHULER, M., op. cit., p. 3.

59. ENGLE, K. After the Collapse of the Public/Private Distinction: Strategizing Women’s Rights. In: DALLMEYER, DORINDA G. (Ed.). Reconceiving reality: women and International Law.Washington D.C.: American Society of International Law, 1993, p. 143.

60. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 60-61.

61. PITANGUY, J., op. cit., p. 21.

62. CORRÊA, S. e ÁVILA, M.B., op. cit., p. 38.

63. Safe Motherhood Conference Conclusions. 1987. Lancet I:670 (COOK, R., op. cit., p. 83).

64. PETCHESKY, R.P., op. cit., p. 17-18.

65. VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 131.

66. SARMENTO, D. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, p. 173-220, 2004, Capítulo V, p. 190.

67. De acordo com o Comentário Geral 14 do Comitê PIDESC, item 8: “O direito à saúde não deve ser entendido como o direito a ser saudável. Contém tanto liberdades como entitlements(direitos)”. CESCR, General Comment 14, UN ESCOR, 2000, Doc. No. E/C.12/2000/4.

68. O termo estigma, segundo Goofman, é usado em referência a um atributo profundamente depreciativo. GOOFMAN, E. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro: LTC Editora, 4a. Ed., 1998, p. 13-14.

69. LIMA LOPES, J.R. de. O Direito ao Reconhecimento para Gays e Lésbicas. In: Sur – Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 2, p. 65-95, 2005, p. 72.

70. Ibid, p. 74-75.

71. Ibid, p. 78.

72. Ibid, p. 73.

73. ÁVILA, M.B., op. cit., S467.

74. VILLELA, W.V. e ARILHA, M., op. cit., p. 136.

Laura Davis Mattar

Laura Davis Mattar é formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2000. Fez mestrado em direito internacional dos direitos humanos e direito internacional criminal na Universidade de Sussex, Inglaterra, 2002. É especialista em direitos humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2004. Atualmente, é doutoranda da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e trabalha na Conectas Direitos Humanos como coordenadora de programas, entre eles o Projeto Direito à Saúde da Mulher Negra e o Programa de Intercâmbio em Direitos Humanos Brasil, Angola e Moçambique.

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Original em português.