Caderno Especial

Advocacia estratégica em direitos humanos

Oscar Vilhena Vieira e Eloísa Machado de Almeida

A experiência da Conectas

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RESUMO

Este artigo pretende analisar a experiência da advocacia em direitos humanos realizada pela Conectas entre 2003 e 2011. A partir das influências do histórico da advocacia de interesse público no Brasil, da adoção da carta de direitos da Constituição Federal de 1988 e do processo de internacionalização dos direitos humanos, o artigo descreve as principais linhas de atuação, as estratégias, as dificuldades e os sucessos da Conectas na superação de violências sistemáticas e exclusões injustificadas a partir da experiência de advocacia em direitos humanos.

Palavras-Chave

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1. Introdução

A Conectas Direitos Humanos foi concebida no início da década passada, em São Paulo, como uma organização internacional, com o objetivo de contribuir para o fortalecimento do movimento de direitos humanos no hemisfério Sul. Partíamos do diagnóstico de que era necessário fortalecer e integrar uma nova geração de militantes de direitos humanos que surgia após a queda de regimes autoritários, na América Latina, e de segregação racial ou mesmo coloniais, na África. As nascentes democracias no hemisfério Sul não traziam consigo, necessariamente, a solução imediata para práticas longevas de violação de direitos humanos, como a violência institucional, a discriminação racial ou de gênero ou a falta de acesso a direitos básicos como saúde e educação.

Por outro lado temas novos como acesso ao conhecimento, propriedade intelectual, violação de direitos humanos por empresas, pareciam muito distantes das agendas das tradicionais organizações de direitos. Nesse sentido era necessário inovar nas pautas, métodos de trabalho e mesmo no modo de organização do movimento de direitos humanos. Entre os desafios centrais colocavam-se: como favorecer a formação de novas solidariedades entre organizações ao redor do mundo? Como facilitar que experiências no combate a violações de direitos humanos num país pudessem inspirar militantes em outros países com problemas semelhantes? De que maneira aumentar a autonomia das organizações para que pudessem contribuir para um discurso efetivamente cosmopolita de direitos humanos?

O surgimento de novas tecnologias de comunicação nos deixavam otimistas em relação à possibilidade de criar uma ampla rede de parceiros, pela qual o conhecimento e a solidariedade iriam naturalmente fluir. Logo percebemos que mais do que meios de comunicação era necessário construir confiança entre pessoas e organizações e detectar pautas que realmente despertassem o interesse em agir coletivamente. O Colóquio Internacional de Direitos Humanos e logo depois a Sur – Revista Internacional de Direitos Humanos se demonstraram instrumentos extremamente eficientes, seja na construção da confiança intersubjetiva, seja na viabilização de um diálogo mais cosmopolita sobre os direitos humanos.

Situada no Brasil, no entanto, a Conectas Direitos Humanos não podia deixar de dar respostas a questões dramáticas de direitos humanos tanto no âmbito local como nacional. Apesar de o Brasil contar com uma rede de vibrantes organizações de direitos humanos, poucas eram aquelas que se utilizavam dos instrumentos legais, criados pelo nosso novo constitucionalismo e pela Carta Internacional de Direitos Humanos, para avançar suas causas. Surgidas num ambiente de ampla desconfiança nas instituições de aplicação da lei, a maior parte das organizações de direitos humanos brasileiras optava e ainda opta por métodos políticos de intervenção, que vão da mobilização à denúncia pública de violações, passando pela capacitação de comunidades. Embora no decorrer de nossa história muitos grupos tenham se utilizado de estratégias jurídicas para ampliar a força da ação política em favor de grupos excluídos ou perseguidos, no início da década nos parecia que a utilização do litígio de interesse público poderia ser mais bem explorada. Assim, juntando forças com o então recém-criado Instituto Pro Bono, decidiu-se por organizar um escritório de advocacia estratégica em direitos humanos. O objetivo central dessa iniciativa era desafiar as instituições de aplicação da lei no Brasil a implementarem o amplo rol de direitos reconhecidos pela Constituição Federal (CF) de 1988, sua legislação complementar, bem como aqueles direitos decorrentes de tratados internacionais dos quais o Brasil se tornou parte no decorrer do processo de democratização.

O presente artigo tem por finalidade analisar as iniciativas da Conectas no campo da justiça nesta última década. A atuação da Conectas, no entanto, só faz sentido se compreendermos o marco institucional no qual está inserida, bem como a tradição de advocacia de interesse público que a inspirou.

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2. O contexto da advocacia de direitos humanos no Brasil

O atual estágio de desenvolvimento da advocacia de direitos humanos no Brasil foi fortemente influenciado por pelo menos três fatores fundamentais: 1) o legado de setores de vanguarda (liberais/católicos/esquerda) da advocacia, que começaram a se formar na luta pelo abolicionismo e atuaram de maneira contundente na proteção de direitos civis e políticos no contexto de regimes autoritários (1937-1945; 1964-1985), bem como tiveram protagonismo nas lutas por direitos trabalhistas no decorrer do século passado; 2) o segundo fator essencial para se compreender a atuação da Conectas relaciona-se ao processo constituinte ocorrido no final da transição para a democracia, que culminou com a adoção da Constituição de 1988, marcada por uma generosa carta de direitos; 3) por fim, o processo de globalização e internacionalização com a expansão de um discurso mais cosmopolita sobre direitos e sustentabilidade, não pode ser desconsiderado.

2.1 A tradição brasileira em advocacia em direitos humanos

Em relação ao primeiro destes fatores, a atuação de setores progressistas da advocacia até 1988 se mobilizou em três ondas, nas quais advogados utilizaram o sistema jurídico como instrumento de proteção de direitos e mudança social.

Inicialmente, entre 1850 e 1950, houve uma intensa advocacia de cunho predominantemente liberal. A campanha pela abolição da escravatura e a atuação de advogados como Luiz Gama inaugurou a advocacia de interesse público no Brasil (MALHEIRO, 1944). Através da utilização de uma estrutura jurídica adversa, Luiz Gama criou uma rede de advogados e organizações de solidariedade, além de forjar inovadoras estratégias de advocacia, para libertar escravos africanos trazidos ilegalmente ao Brasil a partir de 1831, crianças nascidas de pais escravos a partir de 1871 e escravos que tentaram comprar a sua liberdade de acordo com o decreto de 1871.

Ruy Barbosa, que também participou intensamente da campanha abolicionista, ao lado de figuras como Joaquim Nabuco, simboliza um segundo passo na construção de nossa tradição liberal na luta pelos direitos. Como senador e jornalista, Ruy promove os direitos de dissidentes políticos, inclusive de seus opositores. Além disso, na condição de advogado, Ruy Barbosa terá uma intensa atuação junto a Suprema Corte, definindo-lhe um papel no arranjo institucional brasileiro, especialmente pela interposição de inúmeros habeas corpus na defesa de dissidentes políticos, de vítimas do arbítrio decorrente da sucessão de estados de exceção, e mesmos de pessoas comuns, que caiam nas malhas do precário sistema jurídico da Primeira República (RODRIGUES, 1965). Dentro dessa mesma tradição Sobral Pinto e Evandro Lins e Silva irão se notabilizar, durante o Estado Novo, na luta por direitos civis e políticos daquele que se opunham ao regime Vargas (DULLES, 2007).

Um terceiro momento dessa onda liberal progressista, que prevaleceu durante o Regime Militar (entre 1964 e 1985), foi composto por advogados majoritariamente ligados a setores de esquerda da Igreja Católica e sua ampla rede de centros de direitos humanos em todo o país. Em 1973, foi fundada a Comissão de Justiça e Paz de São Paulo sob os auspícios de Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo de São Paulo. A Comissão de Justiça e Paz formou naqueles anos uma rede de advogados para defender os direitos de presos políticos e seus familiares (CANCIAN, 2005). Esses advogados atuavam especialmente junto à Justiça Militar, onde ficaram concentrados os processos relativos a perseguidos pelo regime.

Surge também nesse período uma corrente composta por advogados de orientação mais radical, com atuação vinculada a sindicatos e movimentos de trabalhadores rurais sem terra. Muitos desses advogados também estavam ligados à Igreja Católica, mas sob influência da teologia da libertação – tendo cooperado, ainda, com partidos políticos de esquerda. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo, ainda muito ativo no atual cenário político brasileiro, foi fundado por grupos religiosos progressistas (STÉDILE, 1997). Esse movimento surgiu em resposta às rígidas restrições impostas pelo regime militar sobre os movimentos sociais. MST criou o seu próprio departamento jurídico com o objetivo de dar suporte às suas atividades e proteger seus lideres que se envolviam sistematicamente em confrontos com a polícia e com proprietários de terras.1 Também tem origem nesse processo a Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP), em funcionamento até os dias de hoje, formada por advogados de base e responsável por construir as estratégias jurídicas e por assistir juridicamente o MST em todo o Brasil (CAMPILONGO, 1991).

Por fim, outra importante parcela do movimento de advocacia de interesse público que passou a se destacar antes da Constituição de 1988 é representada pelo movimento de trabalhadores urbanos. Um elemento embrionário desse movimento foi a Frente Nacional do Trabalho, formada por mais de sessenta jovens advogados trabalhistas, das mais variadas matizes políticas, mas predominantemente de esquerda católica, que prestava assistência jurídica a sindicatos independentes em todo o Brasil (JESUS, 1967). Muitos destes, em confluência com advogados oriundos da esquerda partidária, contribuíram para a organização de um departamento jurídico no Sindicato de São Bernardo e, posteriormente, na Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Essas correntes não apenas influenciaram o imaginário e estabeleceram a tradição de nossa advocacia de interesse público, como influenciaram a própria renovação de nosso edifício constitucional em 1988. Sob o novo texto houve uma reconfiguração de expectativas normativas, no campo dos direitos, assim como novos atores institucionais passaram a atuar no campo da advocacia de interesse público.

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2.2 O impacto da Constituição na advocacia de direitos humanos

A Constituição de 1988 caracteriza-se pela adoção de uma extensa carta de direitos, previsão de instrumentos processuais inovadores, aproximação com o direito internacional dos direitos humanos e reconfiguração de algumas instituições ligadas à aplicação da lei, como o Ministério Público e as Defensorias Públicas. Isto alterou significativamente o mapa da advocacia de interesse público no Brasil. Muito mais do que uma advocacia nas lacunas da lei e que lutava pela alteração do marco legislativo, a advocacia de interesse público passou a se concentrar na efetividade e implementação dos direitos amparados pela Constituição de 1988.

É importante mencionar que a Constituição de 1988 se contrapôs a um passado recente marcado pelo governo autoritário e a uma longa história de injustiça social e desigualdade existente no Brasil. A Constituição de 1988, ademais, adotou um claro viés dirigente, com o objetivo de direcionar a mudança social, econômica e política. Nesse sentido, a Constituição atribuiu ao Estado um papel central de promover bem-estar social e desenvolvimento econômico (BONAVIDES; ANDRADE, 1991).

A mais importante inovação da Constituição de 1988, para os fins a que se propõe este artigo, é a sua carta de direitos, extremamente generosa e abrangente, que inclui tanto direitos civis e políticos, quanto econômicos, sociais e culturais, além de conceder direitos a grupos vulneráveis como povos indígenas, idosos e crianças. A Constituição também reconheceu um novo conjunto de direitos relacionados com o meio ambiente e as relações de consumo, bem como seguiu as diretrizes da carta internacional de direitos pós-1948. A sua linguagem e escopo, no entanto, mantêm a tradição de forte intervenção social do Estado que data da Era Vargas.

Há algumas características importantes do regime brasileiro de direitos fundamentais que deveriam ser aqui mencionadas. De acordo com o artigo 5 o, parágrafo 1 o da Constituição, todos os direitos fundamentais têm aplicação imediata, superando uma doutrina constitucional tradicional, que também encontra respaldo no direito internacional de direitos humanos, segundo a qual os direitos econômicos e sociais deveriam ser vistos como dispositivos programáticos e complementares. Combinado com o artigo 5 o, XXXV da CF, que estabelece que a lei não pode excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a um direito fundamental, fica claro porque o Poder Judiciário passou a desempenhar um papel político tão importante depois da promulgação da Constituição de 1988. Tanto ações positivas dos poderes legislativo ou executivo, quanto a omissão em implementar ou regular tais direitos passaram a poder ser objeto de apreciação pelo Poder Judiciário. O aspecto importante da arquitetura de nossos direitos fundamentais foi a proteção especial recebida pelo artigo 60, parágrafo 4º, IV da CF, face a ameaças decorrentes de emendas constitucionais.

Apesar desses avanços, é preciso reconhecer que uma gama importante de direitos deixou de ser contemplada na Constituição Federal de 1988, em especial aqueles relacionados a uma agenda mais contemporânea, ligada a questão de gênero. Temas como direitos reprodutivos, união civil homossexual e aborto não foram abordados pela Constituição, em decorrência da articulação de setores religiosos no processo Constituinte.

Por outro lado, a engenharia constitucional do federalismo brasileiro tem se mostrado, em muitas circunstâncias, um óbice à plena implementação dos direitos humanos, em especial de direitos civis. Tal como formulada originalmente pela Constituição de 1988, a competência para apuração de crimes contra os direitos civis – homicídios e torturas, por exemplo – ficou concentrada na esfera estadual. Para crimes contra os direitos humanos cometidos pelas polícias estaduais, por exemplo, a própria polícia “investigada” será quem promoverá as investigações. Essa proximidade e até mesmo a confusão entre as instituições perpetradoras e as instituições responsáveis pela apuração e julgamento desses crimes tem sido um dos fatores que contribuem para a impunidade das violações de direitos humanos.

Apenas em 2004, com a Emenda Constitucional 45, chamada de Reforma do Judiciário, foi inserida a previsão constitucional de federalização de casos envolvendo graves violações aos direitos humanos, ou seja, o deslocamento de competência de julgamento para a justiça federal. Ainda que seja um instrumento absolutamente central para a proteção dos direitos humanos e um avanço significativo no arranjo institucional destinado a essa proteção, a competência para autorizar esse deslocamento é do Superior Tribunal de Justiça, sendo o Procurador-Geral da República o único autorizado a apresentar tal solicitação. As consequências dessa limitação na sua utilização são evidentes: desde 2004, apenas dois casos deram ensejo à utilização da federalização pelo Procurador-Geral da República e apenas um foi aceito pelo tribunal.2

A Constituição de 1988 também previu novos instrumentos jurídicos capazes de permitir a implementação desses direitos, entre eles o mandado de injunção e o habeas data, bem como previu novas hipóteses para utilização de instrumentos jurídicos já consagrados, como o mandado de segurança e a ação civil pública, além de ter também reconhecido outros instrumentos igualmente tradicionais, como o habeas corpus.

Além desses instrumentos constitucionais específicos de proteção de direitos, a Constituição redefiniu a missão e a competência do Ministério Público e da Defensoria Pública. Tais mudanças fizeram com que essas instituições se tornassem atores centrais na promoção do direito de interesse público no Brasil.

Conforme afirma o artigo 127 da Constituição Federal de 1988, o Ministério Público se tornou “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, em outras palavras, a defesa do interesse público e dos direitos fundamentais (MACEDO JR., 1999). Nas últimas duas décadas após a promulgação da Constituição Federal de 1988, membros do Ministério Público participaram de diversas redes envolvidas em casos de interesse público, principalmente referente a direitos ambientais, de consumidores, crianças e indígenas. A maioria dos casos de interesse público que chegou ao Judiciário brasileiro passou por esse canal (ARANTES, 1999). Com o passar do tempo, a expectativa elevada acerca do papel do Ministério Público, como defensor por excelência do interesse público, tem diminuído entre organizações da sociedade civil. De fato, não há qualquer mecanismo eficaz por meio do qual as organizações da sociedade civil possam pressionar integrantes do Ministério Público a agir em uma determinada circunstância. Em razão disso, o Ministério Público não pode ser visto como a única opção por casos de interesse público.

De outra parte, as Defensorias Públicas, instituídas após a Constituição de 1988, constituem o segundo conjunto de agências públicas encarregadas diretamente de promover o direito de interesse público no Brasil. Nos termos do artigo 5º, LXXIV da CF, o “Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” e, para assegurar o cumprimento desse direito, a Constituição determinou que os governos estaduais e federal deveriam instituir Defensorias Públicas. Esta instituição é considerada “essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.

As Defensorias Públicas, justamente pelo caráter constitucional de assistência jurídica aos necessitados, atua em diversos ramos do direito, como família, imobiliário, criminal e civil, com um volume exorbitante de ações frente aos poucos e escassos recursos físicos e humanos (CUNHA, 2001). Isso, por muitas vezes, tem impedido as Defensorias Públicas de concentrar suas atividades em uma advocacia estratégica de direitos humanos, tendente a alterar significativamente as práticas institucionais violadoras de direitos humanos. No entanto, ainda com essas dificuldades, é inegável a importância das Defensorias Públicas e os avanços logrados com sua atuação como, por exemplo, a atuação emblemática contra os deslocamentos forçados no Rio de Janeiro.3

A Constituição, ademais, expressamente incorpora a linguagem internacional de direitos humanos. O artigo 4º estabelece que o Governo Brasileiro deve levar em consideração os direitos humanos em sua política externa; o artigo 5º, parágrafo 2º apregoa que os direitos expressos no texto constitucional não excluem outros decorrentes dos princípios e do regime por ela adotados ou aqueles arrolados nos tratados internacionais dos quais o Brasil seja parte, o que abre a possibilidade de incorporação do direito internacional de direitos humanos ao ordenamento jurídico brasileiro.

De fato, apenas após o fim do regime militar em 1985 e a eleição indireta do primeiro presidente civil, o governo brasileiro passou a assinar os principais tratados de direitos humanos. A ratificação desses tratados, contudo, apenas foi realizada após a adoção da nova Constituição.

Com a ratificação da Convenção Americana de Direitos Humanos, em 1992, e a aceitação da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos em 1995, muitas organizações, tanto no âmbito interno, quanto internacional, começaram a utilizar esse mecanismo internacional como forma de superar a inércia do sistema jurídico brasileiro em lidar com as violações sistemáticas de direitos humanos cometidas pelo novo governo democrático, fator que alterou, desse modo, a conformação da advocacia de interesse público no Brasil.

Na esteira do novo momento constitucional e sob a inspiração de avanços normativos no plano internacional, movimentos de defesa de direitos pressionaram o Congresso para produzir uma série de mudanças legislativas no campo de direitos humanos. Essas normas infraconstitucionais tratam de questões importantes como, por exemplo, direitos de crianças e adolescentes (1989), direitos de pessoas com deficiência (1989), crimes de racismo (1989), sistema de saúde (1990), seguridade social (1991), direito à educação (1990), acesso irrestrito a medicamentos para tratamento de HIV (vírus da imunodeficiência humana) (1996), tortura (1997), reforma agrária (1993), entre outros assuntos igualmente pertinentes.

Não obstante a existência desse marco normativo significativamente garantista no plano constitucional, internacional e infraconstitucional, as violações de direitos humanos continuam sendo uma realidade no país.

No campo dos direitos sociais, usando a educação apenas como um exemplo, dados de 2009 apontam que 52% dos alunos de 1ª a 4ª série são analfabetos funcionais, ou seja, são analfabetos ou possuem uma alfabetização rudimentar.4 (INSTITUTO PAULO MONTENEGRO, 2011). Dentre os alunos de 5ª a 8ª série, 24% dos alunos são analfabetos funcionais. Em relação à saúde, enfermidades como malária, por exemplo, afetam 500 mil pessoas por ano na região endêmica da Amazônica; quase um milhão de pessoas contraíram dengue em 2010 e a tuberculose causa aproximadamente cinco mil mortes ao ano (BRASIL, 2010).

Em relação aos direitos civis, a violência policial e as execuções sumárias e arbitrárias ainda são “amplamente praticadas” (UNITED NATIONS, 2010). De outra parte, a tortura e condições degradantes de detenção estão presentes em boa parte das instituições de privação de liberdade do Brasil, de adultos e adolescentes. Recentes visitas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aos estabelecimentos de internação de adolescentes pelo país verificou que a superlotação e prática de tortura são, ainda, uma triste realidade (BRASIL, 2011a).5

Episódios de violência e violações a direitos humanos, ademais, alcançam grupos determinados da sociedade brasileira, considerados grupos vulneráveis. Negros, mulheres, crianças, indígenas, quilombolas, pessoas com deficiência e comunidade LBGTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) estão mais sujeitos a serem vítimas de violações de seus direitos humanos.

A título de exemplo, a população negra do Brasil é mais pobre, possui menos acesso aos serviços essenciais e à educação. Para se ter uma ideia da força com que o racismo alimenta a desigualdade, o Brasil branco teria um IDH alto, de 0,814 e o Brasil negro, de população parda e preta, teria um IDH de 0,703. Se fossem dois países distintos estariam separados por 61 posições no ranking de desenvolvimento humano (CICONELLO, 2008). Mulheres negras, por sua vez, além de receberem menores salários para as mesmas funções, comprovadamente recebem atendimento médico de pior qualidade, como menos anestesia e atenção ginecológica, por exemplo (LEAL; GAMA; CUNHA, 2005).

O processo constitucional de expansão de direitos, voltado a contribuir para a superação do arbítrio e das diversas formas de hierarquização social, impactou diretamente a litigiosidade no Brasil. Isto não significa, no entanto, uma ampliação proporcional do acesso à justiça: a média nacional da relação entre pessoas necessitadas do serviço de assistência jurídica gratuita e seus defensores é de um defensor público para cada 32 mil pessoas (1:32.044) (BRASIL, 2009). A advocacia pro bono , que poderia se mostrar uma alternativa ao grave problema do acesso à justiça, é vista com restrições pela Ordem dos Advogados do Brasil, cuja regulamentação atual permite a advocacia gratuita apenas para organizações carentes do terceiro setor.6

O aumento da litigiosidade percebido nos últimos anos na sociedade brasileira, que passou de 5,1 milhões de processos novos nas justiças estaduais, federal e trabalhista, em 1990, para 24,5 milhões de novos processos em 2010, tampouco representou uma plena democratização do acesso ao Judiciário. Pesquisa recente detectou que os maiores litigantes nos tribunais brasileiros são os órgãos públicos estaduais, federais e os bancos privados (BRASIL, 2011b),7 ainda que parte significativa desses processos advenha de demandas consumeristas.

O fato é que o avanço normativo em prol dos direitos humanos a partir de 1988 não gerou um movimento considerável de litígio em sua defesa. Salvo atuações relevantes, mas não sistêmicas, das Defensorias Públicas e Ministérios Públicos, pouquíssimas organizações da sociedade civil têm se dedicado a litigar em direitos humanos.

2.3 Impacto da agenda internacional sobre a advocacia de direitos humanos

Difícil compreender a trajetória recente da advocacia de direitos humanos no Brasil sem levar em consideração os debates, movimentos e tratados elaborados na esfera internacional nas duas últimas décadas. Embora, a partir de 1988, as instituições públicas tenham adquirido grande proeminência no campo do litígio em direitos humanos, diversas organizações passaram a dialogar intensamente com o movimento internacional de direitos humanos.

Muito embora o movimento de direitos humanos tenha ganhado força após o fim da Segunda Guerra Mundial com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945, a adoção da Declaração Universal de Direitos Humanos em 1948 e de vários outros tratados internacionais de direitos humanos que tornaram juridicamente vinculantes os objetivos já expressos na Declaração Universal; no Brasil, a linguagem internacional de direitos humanos apenas passou a ser utilizada após o fim do regime militar. Isto se deve tanto ao isolamento gerado pelo regime autoritário, quanto ao impacto da Guerra Fria. No âmbito das Nações Unidas, a lógica da Guerra Fria contribuiu para o enfraquecimento da atuação da maioria dos movimentos de direitos humanos. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), estabelecida pela Organização dos Estados Americanos (OEA), era o único mecanismo internacional atuante no continente americano. Importante frisar que, à época, o Brasil não havia ratificado qualquer um dos principais instrumentos internacionais de direitos humanos, nem sequer a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969.

Apenas após o fim do regime militar em 1985 e a eleição indireta do primeiro presidente civil, o governo brasileiro passou a assinar os principais tratados de direitos humanos. A ratificação desses tratados, contudo, apenas foi realizada após a adoção da nova Constituição. Todo o movimento para que o governo brasileiro ratificasse os principais tratados internacionais de direitos humanos e a parceria com organizações internacionais de direitos humanos que passaram a atuar no país após o fim do período militar, inspirou a criação de novas organizações com a missão mais claramente voltada para a promoção dos direitos humanos.

Com a ratificação da Convenção Americana de Direitos Humanos, em 1992, e a aceitação da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos em 1995, muitas organizações, tanto no âmbito interno, quanto internacional, começaram a utilizar esse mecanismo internacional como forma de superar a inércia do sistema jurídico brasileiro em lidar com as violações sistemáticas de direitos humanos cometidas pelo novo governo democrático (SANTOS, 2007).

Diversas conferências das Nações Unidas ocorridas nos anos noventa impulsionaram, no âmbito global, uma nova corrente de ideias que influenciaram movimentos sociais e a prática das organizações de direitos humanos no Brasil. A Conferência sobre Meio Ambiente de 1992, a Conferência sobre Direitos Humanos de 1993, a Conferência sobre Desenvolvimento Social de 1995, a Conferência sobre Mulheres de 1995, a Conferência sobre Assentamentos Humanos de 1996 e a Conferência sobre Racismo de 2001 – todas elas fomentaram distintas formas de trocas e o fluxo de ideias no âmbito internacional entre movimentos sociais, organizações e até mesmo agentes estatais ao redor do mundo. Essas conferências internacionais, diferentemente daquelas realizadas anteriormente, mobilizaram milhares de grupos da sociedade civil e defensores de direitos humanos de todo o mundo, não apenas com o intuito de participar das reuniões, mas também de articular propostas da sociedade civil, bem como demandar que os Estados se posicionem sobre esses assuntos. Durante as reuniões preparatórias para as conferências, organizações e defensores de direitos humanos com atuação no âmbito nacional em seus respectivos países começaram a interagir com organizações e defensores de outros países e regiões, o que abriu novas frentes de diálogo no âmbito internacional, bem como permitiu que se vislumbrassem novas formas de engajamento na política internacional; formas essas que não fossem monopolizadas pelos Estados, e tampouco fossem controladas, no âmbito da sociedade civil, por grandes organizações transnacionais do hemisfério Norte (NADER, 2007).

A partir da exposição das organizações brasileiras a essa nova etapa da internacionalização dos direitos humanos, que não se limitou aos agentes de Estado, muitas organizações brasileiras, entre elas a Conectas, passaram a levar as instituições internacionais e mesmo estratégias de organizações similares em consideração na formulação de suas linhas de ação.

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3. O Programa de Justiça da Conectas: Artigo 1º

Nesse contexto político institucional e sobre a influência dessas distintas tradições é que a Conectas decidiu organizar um programa de advocacia estratégia,8 em junho de 2003, chamado de Artigo 1º, em referência ao artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos “todos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.9

Desde o início do Artigo 1º – Conectas, foram eleitos dois focos principais de atuação: i) advocacia intensiva estratégica, com o objetivo de desestabilizar práticas institucionais sistêmicas de violação de direitos humanos; ii) advocacia constitucional estratégica, voltada a proteger avanços legislativos sobre ameaça de retrocesso, no Supremo Tribunal Federal (STF), bem como litígio com o objetivo de ampliar o escopo de direitos de grupos injustificadamente excluídos do texto constitucional.

3.1 Litígio sistêmico e as violações persistentes de direitos humanos

Violações sistemáticas de direitos humanos, entrincheiradas em práticas institucionais duradouras, apresentam enormes dificuldades para serem alteradas, tanto para atores sociais engajados na sua alteração, como para as próprias autoridades que com elas não pactuam.

A opção por utilizar um grande número de ações de distinta natureza, voltadas porém a atacar um questão específica, tem por objetivo a desestabilização de práticas de violações sistemáticas de direitos humanos arraigadas nas instituições brasileiras, buscando, por meio de ações judiciais, obrigar essas instituições a aperfeiçoar os seus processos de controle, transparência e participação. A prática sistemática de violação de direitos humanos por essas instituições pressupõe o mau funcionamento dos mecanismos de controle, de forma que a impunidade é elemento central na perpetuação das violações.

Para tanto, foi desenhada uma dupla estratégia: ações voltadas a testar e questionar diretamente os processos de controle e transparência das instituições e ações voltadas a impor condenações financeiras vultuosas a essas instituições, como reparação às vitimas, e com isto explorar o caráter pedagógico das indenizações.

A área temática inicialmente escolhida dentre as violações persistentes de direitos humanos foi a violência institucional contra adolescentes nos sistemas de privação de liberdade no Estado de São Paulo.10 Diversos foram os motivos para a escolha dessa temática: tratava-se de uma área com notórias e profundas violações de direitos humanos, reconhecidas no âmbito nacional e internacional através de relatórios de organizações e de setores públicos; a centralização da gestão das unidades favoreceria uma ação sistêmica por parte da Conectas; já havia, em meados de 2003, parcerias estabelecidas com organizações de vítimas e familiares de vitimas,11 em especial a Amar – Associação de Mães e Amigos de Crianças e Adolescentes em Risco, construídas em projetos então geridos no Ilanud – Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente.12

Com a proximidade de organizações de defesa dos direitos da criança e do adolescente, a Conectas passou a realizar visitas e inspeções periódicas às unidades de privação de liberdade, obtendo, diretamente com os adolescentes, as informações e constatações sobre violações a direitos humanos. Dentre os anos de 2003 a 2008, essas visitas abrangeram cerca de 70% das unidades de privação de liberdade do Estado de São Paulo.

A partir das visitas e inspeções nas unidades de internação, a Conectas passou a acionar judicialmente as instâncias oficiais de apuração das violações de direitos humanos, objetivando, com isto, provocar o funcionamento dos instrumentos de controle existentes de modo a permitir a reestruturação institucional. A partir da constatação da precariedade e inoperância dos mecanismos de controle institucional – como já era esperado – em casos específicos de violações de diretos humanos acompanhados pela Conectas, foi possível construir ações judiciais direcionadas a aperfeiçoar esses mecanismos.

Nesse sentido, destacam-se três blocos de ações judiciais que conseguiram, através da litigância e das decisões judiciais, aprimorar e instituir mecanismos de controle, transparência e participação das instituições de privação de liberdade no Estado de São Paulo.

Um primeiro bloco de ações se refere a mandados de segurança impetrados pelos familiares de vitimas de violações de direitos humanos contra as decisões administrativas que lhes negava acesso aos procedimentos internos de apuração de responsabilidades dos agentes públicos por violações de direitos humanos, no âmbito da Corregedoria da Febem – Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor (atual Fundação Casa – Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente).13

Esses mandados de segurança tinham por objetivo afirmar o direito de adolescentes vítimas de violações de direitos humanos e seus familiares de terem acesso e de participarem desses processos. Nas decisões, o Judiciário brasileiro afirmou:

Direito líquido e certo plenamente amparável por mandado de segurança. Existência, ademais, de garantia constitucional de acesso às informações que também restou lesado. Estado que falhou, ao que tudo indica, na preservação da vida de adolescente por ele custodiado e que opôs indevidos óbices à seus familiares, impedindo-os de acessarem informações da sindicância que apurava referida morte. Obstáculo inaceitável que não pode ser perpetuado em razão de excessivo formalismo ou apego a filigranas jurídicas. Afora o direito da apelante de acesso às informações relativas à morte de seu filho há verdadeiro dever do Estado de prestar os devidos esclarecimentos. Sentença que deve ser reformada a fim de que seja concedida a segurança, permitindo à apelante o acesso, a extração de cópias e obtenção de certidões de sindicância relativa à morte de seu filho. Apelação provida para se conceder a ordem. 
(SÃO PAULO, 2005).

Após reiteradas ações e decisões judiciais, a Fundação Casa e o Juízo da Infância de São Paulo reformularam seu entendimento e passaram a garantir o acesso e a participação das vítimas e de seus familiares aos procedimentos administrativos. O uso desse caminho pelas vítimas pode vir a surtir efeitos na prática institucional da Fundação Casa, em especial na ruptura de um ciclo de impunidade.

Outro bloco de ações se referiu à autorização e às prerrogativas das organizações de direitos humanos nas visitas e inspeções às unidades de privação de liberdade. Com o passar dos anos e a intensificação das denúncias por violações de direitos humanos, a Fundação Casa passou a dificultar a entrada das organizações nas unidades até que, em 2005, proibiu, de forma geral, a entrada de organizações não-conveniadas à Fundação.

Essa proibição explícita e a ausência de uma política definida sobre as fiscalizações, levou a Conectas, em parceria com outras organizações de defesa dos direitos da criança e do adolescente, a propor uma ação civil pública com o objetivo de obrigar a Fundação Casa a criar uma política de fiscalização e transparência adequada às regras internacionais de proteção dos direitos humanos, notadamente o Protocolo Facultativo à Convenção contra Tortura da ONU. A ação obteve sucesso em grau de recurso e a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ressaltou a importância do trabalho das organizações não-governamentais (ONGs) na defesa dos direitos humanos:

(…) Não há dúvida de que é dever de todos, e não só do Estado, assegurar à criança e ao adolescente os direitos inatos da personalidade, como o direito à vida, à saúde, à integridade física etc. A própria Constituição Federal deixa isso bem claro em seus arts. 1º, III, 204 e 227. Assim, aplicando o Estado aos menores infratores medidas socioeducativas que visem seus amadurecimentos, a conscientização de seus erros e suas ressocializações, há, de certa forma, não só um dever participativo de toda a população, aqui incluídas, obviamente, as entidades não-governamentais, mas também um direito de todos de verificar se tais objetivos estão sendo atingidos ou, pelo menos, se, para tanto, esforços estão sendo realizados. (…) Se por um lado deve a ré ter liberdade para o planejamento e a execução de seus programas de proteção, não tem o direito de proibir que associações não governamentais, que atuam na proteção das crianças e adolescentes, tenham acesso aos menores e aos locais onde estão internados. Quando a Fundação CASA age dessa forma, viola o princípio da transparência que deveria nortear sua atuação; deveria ela ser a primeira a deixar claro que não há em suas unidades qualquer violação aos direitos previstos no art. 124 do Estatuto da Criança e do Adolescente. (…) Dou provimento ao recurso, permitindo-se às autoras e demais associações não-governamentais com os mesmos objetivos, o ingresso nas unidades de internação da Fundação CASA, respeitadas as demais normas eventualmente existentes, ou a virem ser editadas. 
(SÃO PAULO, 2008).

Esta talvez seja a sentença mais relevante obtida nesse período e isto por diversos motivos: foi adotada em um procedimento coletivo, o que amplia o impacto e a abrangência da ação, e impõe à Fundação Casa uma obrigação clara de criar meios de controle, transparência e participação.

Por fim, um terceiro bloco de ações buscou questionar as más condições de detenção das unidades de internação a partir das violações das regras gerais de edificações e atendimento. Com isso, foram questionadas diversas unidades nas quais não havia equipamentos de segurança contra incêndios, por exemplo, favorecendo a interdição judicial de unidades insalubres. Essa atuação favoreceu a condenação oficial do Estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em dezembro de 2005, em caso proposto em parceria com um grupo de ONGs.14 Essa ação foi apresentada perante o sistema interamericano em nome de quatro mil adolescentes da unidade de internação da Fundação no Tatuapé, conhecida por submeter os internos a condições e tratamento desumanos. Depois do fracasso do governo brasileiro em implementar as medidas estabelecidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (entre elas, reparação às vítimas, fechamento da unidade de internação e responsabilização dos perpetradores das violações), o caso foi encaminhado à Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Corte confirmou as mesmas medidas enunciadas pela Comissão e exigiu a desativação do Complexo Tatuapé, o que finalmente ocorreu em dezembro de 2006.

A segunda estratégia utilizada pela Conectas foi buscar, por intermédio do litígio, ampliar as indenizações para vítimas de violações de direitos humanos, de forma a reverter um processo de banalização das violações perpetradas pelo Estado, já que a aplicação de sentenças condenatórias de alto valor financeiro aponta para a gravidade do fato e a necessidade de combater tais práticas.

Com relação a esses pedidos de indenização por danos morais em razão de execuções extrajudiciais e ocorrências de tortura em unidades de internação da Fundação, houve muitas vitórias. O Artigo 1º – Conectas conseguiu transformar o padrão do Tribunal de Justiça de São Paulo em relação ao valor das indenizações pagas em decorrência da perda da vida e da tortura. Num primeiro momento, as sentenças determinavam o pagamento de valores pífios, em torno de R$ 30.000 (US$ 15.000) às famílias das vítimas fatais de ações do Estado. A partir de um intenso trabalho da Conectas, os desembargadores foram alterando suas perspectivas em relação à obrigação do Estado de assegurar a vida daqueles que se encontram sob sua custódia. Os valores pagos, em média, a titulo de indenização aumentaram para R$ 300.000 (US$ 150.000). O objetivo de conceder essas indenizações é enviar ao público em geral a mensagem clara de que as vidas desses adolescentes não poderiam ter sido desprezadas por esses abusos.

Foi proposta quase uma centena de ações judiciais em nome de adolescentes de unidades de internação da Febem, com o objetivo de assegurar indenização para vítimas de abusos, punição a perpetradores dessas violações e mudanças nas práticas institucionais da Fundação. Cada um desses casos exigiu e ainda exige que sejam abordados os aspectos civil, administrativo e, por vezes, penal do problema.

De forma geral, o Artigo 1º – Conectas buscou utilizar o sistema judicial para aumentar os custos políticos decorrentes das práticas violadoras de direitos, contribuindo assim para pressionar por reformas nos sistema de internação de adolescentes em conflito com a lei em São Paulo.

Além da área de adolescentes privados de liberdade, a partir de 2005 o Artigo 1º – Conectas passou a atuar no tema de violência policial, particularmente em casos de execuções sumárias, com a mesma estratégia de, por um lado, fortalecer os mecanismos de controle, transparência e participação e, por outro, de buscar o efeito pedagógico de indenizações vultuosas às vítimas.

Nessa área, destaca-se a atuação na chamada semana sangrenta de maio de 2006. No período entre 12 e 21 de maio de 2006, houve uma série de atentados à polícia e rebeliões em presídios do Estado de São Paulo orquestrados pela facção criminosa Primeiro Comando da Capital – PCC, seguida de uma resposta violenta por parte da polícia. Foram 492 pessoas mortas por arma de fogo no período, com claras indicações de execuções sumárias praticadas pela polícia (CANO, 2009). A atuação do Artigo 1º – Conectas foi no sentido de buscar a federalização do caso, dada o elevado comprometimento das instituições do sistema de justiça paulista para investigar os fatos. Em âmbito internacional, o Artigo 1º – Conectas procura abolir o uso da expressão “resistência seguida de morte” nos boletins de ocorrência policiais, fator responsável por esconder os números de violência policial e favorecer a impunidade, bem como a adoção de padrões de conduta policial sobre o uso excessivo de força letal.

A partir de 2007, o Artigo 1º – Conectas passa a utilizar sua experiência adquirida em outras áreas para atuar em sistema prisional de adultos, com foco no tema de superlotação, uso excessivo de prisão cautelar e más condições de detenção.

O primeiro caso trabalhado foi na Cadeia Pública do Guarujá, na qual a superlotação e as péssimas condições de detenção caracterizavam situação análoga à tortura. A partir de uma intensa articulação com atores locais,15 o Artigo 1º – Conectas conseguiu mobilizar uma grande discussão sobre o uso indiscriminado de prisão provisória e a precariedade das prisões em cadeias públicas,16 conseguindo a desativação da Cadeia e a adoção de medidas cautelares por parte da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.17

A mesma estratégia foi adotada em 2009 para atuar no sistema carcerário do Espírito Santo, notadamente conhecido como grande violador de direitos humanos. O Artigo 1º – Conectas e parceiros18 atuaram com uma estratégia combinada de mídia, mobilização local e atuação internacional que gerou grande impacto. Centros de privação de liberdade absolutamente inadequados, como a Delegacia de Policia Judiciária de Vila Velha e celas metálicas que funcionavam em contêineres foram interditadas e desativadas após a adoção de medidas cautelares pela CIDH e discussão do tema em evento paralelo no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Esse modelo de atuação, baseado na intensidade de ações, coordenada com outras organizações e o emprego da mídia parece ter contribuído para desestabilizar práticas violadoras sistemáticas.

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3.1.1 Litígio para ampliar o espectro de direitos

A opção por ampliar o espectro de direitos está baseada no fato de que, apesar de a Constituição Federal de 1988 representar um grande avanço, há direitos que deixaram de ser reconhecidos, acarretando exclusões injustificadas de grupos vulneráveis a um eficaz sistema de proteção. Para atacar essas exclusões injustificadas, foram traçadas duas estratégias: por um lado, defender avanços normativos obtidos no Congresso Nacional e, por outro lado, defender uma interpretação constitucional pela ampliação dos direitos humanos.

Para desenvolver essas estratégias foi escolhido, ao invés de um tema, um local privilegiado: o Supremo Tribunal Federal (STF). Tal escolha se dá pela inegável centralidade que o STF tem conseguido no debate sobre direitos humanos (VIEIRA, 2008). De fato, nos últimos 18 anos, o Supremo Tribunal Federal tornou-se um dos principais fóruns nacionais na definição dos direitos fundamentais.

No entanto, há regras muito restritivas que afastam boa parte da sociedade civil do debate constitucional: é possível ter acesso ao STF quer por meio de um recurso proposto em um caso individual, quer por meio de uma ação direta de inconstitucionalidade; contudo, somente alguns atores sociais e políticos podem acionar diretamente o Supremo Tribunal Federal. Para democratizar essa arena, o Congresso aprovou uma lei em 1999 que permite que terceiros apresentem amicus curiaeperante o STF. Em alguns países, como nos Estados Unidos, esse instrumento tem influído consideravelmente nas decisões da Suprema Corte americana, embora ainda seja pouquíssimo explorado no Brasil.

É no uso da figura do amicus curiae que o Artigo 1º – Conectas tem concentrado sua atuação na estratégia de ampliar o espectro de direitos humanos no país. Atualmente a Conectas é a organização que apresentou o maior número de amici curiae no Supremo Tribunal Federal (ALMEIDA, 2006) – 38 até o momento – sobre uma grande variedade de questões, sempre procurando formar parcerias com atores relevantes em cada área. É também a única organização que participou de todas as cinco audiências públicas realizadas até o momento pelo STF.19

O Brasil adotou uma Constituição progressista em 1988. Depois de sua promulgação, o Congresso aprovou diversas leis destinadas a implementar os anseios trazidos pela nova ordem constitucional. Essas novas leis são constantemente questionadas por setores conservadores que saíram derrotados do processo político que culminou na adoção da Constituição; tais setores têm utilizado o Supremo Tribunal para questionar os atos do Congresso Nacional. De outra parte, grupos vulneráveis minoritários que não conseguem adquirir aprovação de leis no Congresso Nacional, vêm recorrendo ao Judiciário para conseguir alguma proteção. Atualmente, o desafio para as organizações da sociedade civil comprometidas com a promoção dos direitos humanos é justamente defender essa legislação progressiva aprovada após a Constituição de 1988 e grupos minoritários perante o Poder Judiciário.

Com a estratégia de ampliar o espectro de direitos a partir dos avanços normativos produzidos pelo Congresso Nacional, o Artigo 1º – Conectas se manifestou em ações de grande relevância pública, defendendo as novas leis. São emblemáticas, nesse sentido, as manifestações como amicus curiae do Artigo 1º – Conectas em defesa do controle de armas, das pesquisas com células-tronco embrionárias e em favor das ações afirmativas para negros nas universidades, nas quais já há posicionamento do STF.

A primeira vitória substantiva se deu no caso sobre controle de armas (Ação Direta de Inconstitucionalidade–ADI 3112) (BRASIL, s.d. a), assunto de extrema importância no Brasil em razão do impacto desse controle sobre as taxas de homicídio. O Brasil possui uma taxa de homicídio extremamente elevada, sendo que armas de pequeno porte são responsáveis pela maioria dessas mortes. Após um longo debate parlamentar, o Congresso Nacional aprovou o Estatuto do Desarmamento, uma lei de controle de armas, estabelecendo diversas restrições à posse individual de armas. Essa lei, no entanto, possuía um artigo proibindo totalmente o comércio de armas no Brasil, dispositivo que somente entraria em vigor após ser aprovado por meio de referendo nacional. O resultado desse referendo foi negativo. Por isso, o comércio de armas é hoje legalizado no Brasil, embora diversas restrições sobre a posse de arma estejam ainda em vigor. Contra essas restrições, uma ação direta de inconstitucionalidade foi proposta pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), de direita, sobre diversos dispositivos da nova lei. O Supremo Tribunal decidiu o caso em maio de 2006, mantendo a lei, com pequenos ajustes em questões procedimentais e valendo-se dos argumentos oferecidos pelos amici curiae Artigo 1º – Conectas, Sou da Paz e Viva Rio.

O segundo caso de avanço normativo defendido pelo Artigo 1º – Conectas foi relativo à lei sobre pesquisa com células-tronco embrionárias (ADI 3510) (BRASIL, s.d. b). Essa lei sofreu diversos ataques, em especial de setores religiosos que pretendiam a proteção constitucional da inviolabilidade da vida do embrião descartado no processo de fertilização artificial. Nesse caso, além de conseguir um pronunciamento favorável à lei pelo STF, o Artigo 1º – Conectas colaborou para a realização da primeira audiência pública no âmbito do tribunal.

Por fim, o caso em defesa da lei que instituiu ação afirmativa (ADI 3330) (BRASIL, s.d. c) com critérios raciais no âmbito do Programa Universidade para Todos (ProUni), amplo programa do governo federal de concessão de bolsas de acesso ao ensino universitário. Nesse caso, o Artigo 1º – Conectas atuou em defesa das ações afirmativas e conseguiu voto favorável do ministro relator, antes do pedido de suspensão do julgamento. Atuou, também, na audiência pública realizada pelo STF sobre esse tema.

Não obstante esses bons resultados substantivos, deve-se ressaltar também o resultado obtido pelo Artigo 1º – Conectas no que se refere à determinação da legitimidade de organizações de direitos humanos para apresentar amicus curiae perante a Corte. A partir de um pedido do Artigo 1º – Conectas, os ministros do Supremo Tribunal Federal debateram quais seriam os critérios que o Tribunal deveria utilizar para admitir amici curiae apresentados por organizações da sociedade civil e decidiram que uma organização como esta, com a missão ampla de promover os direitos humanos, seria competente para se manifestar em todos os casos em que forem discutidas questões relacionadas com direitos fundamentais.

De outra parte, há a atuação em defesa da interpretação constitucional para ampliação de direitos. Conforme mencionado anteriormente, a Constituição Federal de 1988 deixou de congratular em seu texto, expressamente, direitos de alguns grupos, sendo necessária a atuação do STF no sentido de buscar uma interpretação ampliativa e expansiva dos direitos.

O caso mais emblemático nessa linha de atuação é o de recente julgamento sobre a constitucionalidade da união civil de pessoas do mesmo sexo (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental–ADPF 132) (BRASIL, s.d. d). A Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre o regime de união estável e sua conversão em casamento fez menção explícita à união entre homem e mulher. Essa menção vinha servindo de justificativa para a negação do reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo. A ação proposta no STF buscou, justamente, uma interpretação que afastasse essa exclusão injustificável. A manifestação do Artigo 1º – Conectas e de seus parceiros foi aceita,20 bem como de outras organizações, e o STF, por unanimidade, reconheceu o direito à união de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Há outras ações destinadas a conferir uma interpretação mais próxima dos direitos humanos em casos nos quais a Constituição deixou de fazê-lo, como, por exemplo, no caso do ensino religioso, ainda não julgadas.
Por fim, ainda com o objetivo de ampliar o espectro de direitos, o Artigo 1º – Conectas passou a compor o GTPI/Rebrip – Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos, com o objetivo de formular estratégias e ações judiciais voltadas a revisão do atual sistema de proteção à propriedade intelectual em benefício do maior acesso a medicamentos. Uma das ações mais exemplares está justamente aguardando julgamento pelo STF e questiona especificamente as patentes pipeline e, de forma geral, todo o sistema de proteção à propriedade intelectual em um país onde a assistência farmacológica compõe o direito fundamental à saúde e é um dever do Estado.

Dessa iniciativa, ademais, foram formuladas ações paradigmáticas e inovadoras, como a ação civil pública que busca o uso de flexibilidades do sistema de proteção para diminuição de preço de medicamentos distribuídos gratuitamente pelo poder público. Além dessa ação, que ainda aguarda julgamento definitivo, o GTPI atua na formulação de oposições à concessão de patentes de medicamentos e na realização de debates que expõe a ineficiência do atual sistema de proteção à propriedade intelectual em garantir inovação e desenvolvimento de medicamentos para doenças negligenciadas ou acesso a medicamentos já produzidos.

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4. Conclusão

Após essa curta e intensa experiência de advocacia estratégica no campo dos direitos humanos poderíamos resumir da seguinte maneira nossas maiores dificuldades e conquistas. Dividiremos as dificuldades em obstáculos externos, relacionados ao marco institucional e estrutura social, e dificuldades internas, relacionadas às próprias limitações da organização e sua sustentabilidade. No âmbito das conquistas buscaremos enfatizar mais as estratégias e os métodos do que propriamente os resultados que acima já foram descritos.

Múltiplos são os obstáculos externos à advocacia de direitos humanos no Brasil. O primeiro deles refere-se à sistematicidade e amplitude das violações de direitos humanos no Brasil. Dada a nossa estrutura social altamente hierarquizada, caracterizada por uma profunda e persistente desigualdade entre os diversos seguimentos da sociedade, as violações são difusas e muitas vezes naturalizadas pela opinião pública. A brutalidade, o arbítrio e, na maioria das vezes, o simples descaso e negligência em relação às franjas de nossa sociedade não são capazes de provocar reações políticas e jurídicas articuladas com o objetivo de superar esse estado de coisa. Assim, advogar por causas de direitos humanos é em muitas circunstâncias algo impopular, colocando em risco as organizações e pessoas envolvidas com essa causa.

Uma segunda dificuldade está diretamente relacionada à falta de responsividade do sistema de justiça em relação a causas que defendam interesses de grupos vulneráveis na sociedade brasileira. Como demonstram inúmeras pesquisas, como o Índice de Confiança na Justiça da Direito GV (2011) ou mesmo as pesquisas do Latinobarometro (2005), há uma forte percepção entre os brasileiros de que o nosso sistema de justiça não aplica a lei de forma imparcial. Assim, muitas vezes, nossas demandas jurídicas ficaram simplesmente sem uma resposta institucional. Os exemplos mais destacados talvez sejam aqueles relacionados à tortura e às mortes em estabelecimentos prisionais e de internação juvenil. A solicitação de intervenção federal protocolada junto à Procuradoria Geral da República, em função da crise aguda do sistema carcerário do Espírito Santo, em 2009, jamais recebeu qualquer resposta daquela instituição. Da mesma forma, o pedido de investigação de um caso de suspeita de tortura coletiva de adolescentes na penitenciária de Tupi Paulista não apenas não teve seguimento, como redundou em diversas denúncias feitas pelo Ministério Publico e acatadas pelo judiciário estadual, imputando aos jovens a prática de autoflagelamento, bem como de denúncia caluniosa.

Também no campo das instituições de justiça detecta-se um terceiro obstáculo relacionado à dificuldade de juízes de proferirem sentenças em situações de maior complexidade, como falta de condições de sanidade ou superlotação de estabelecimentos prisionais. Em poucas circunstâncias onde o judiciário decide pela interdição de um estabelecimento, como ocorrido na cadeia pública do Guarujá, não é raro que os detidos sejam simplesmente realocados para outro estabelecimento, sendo mantidas, portanto, as circunstâncias violadoras. Os limites da decisão judicial ainda são muito estreitos na cultura jurídica brasileira. Situações complexas demandam um novo tipo de decisão de natureza gerencial, onde juízes imponham prazos, critérios e mecanismos mais transparentes para o enfrentamento desses problemas. Decisões de natureza terminativa, vistas como balas de prata, tem se mostrado muitas vezes insuficientes para solucionar o problema. Em primeiro lugar deixam os juízes temerosos em relação a suas consequências, criando assim um desincentivo para sua concessão. E quando concedidas, são sistematicamente suspensas pelos tribunais. Advogados e juízes necessitam ousar mais em termos da formulação do remédio necessário para enfrentar problemas de violação sistemática de direitos humanos.

Um quarto obstáculo externo refere-se à fragilidade da cultura de precedentes no Brasil. O esforço por conseguir uma boa decisão no campo dos direitos humanos não significa que uma determinada prática violadora esteja sendo suspensa de maneira generalizada. Num sistema onde decisões judiciais representam apenas, em muitas circunstâncias, fragmentos da história jurídica e não o indício de uma mudança interpretativa, os custos para os “advogados de causas” são majorados. A falta de autoridade do precedente favorece indivíduos e advogados bem posicionados a alcançarem seus objetivos singulares, sem que isto altere a lógica do sistema. Nesse sentido, eventuais vitórias no campo dos direitos humanos não se transformam necessariamente em jurisprudência dominante e menos ainda em reversão de práticas violadoras.

Por fim, um quinto obstáculo refere-se à lentidão da justiça brasileira. Dado o acúmulo de processos e a sucessão de instâncias que se deve percorrer para se chegar à coisa julgada, o litígio em direitos humanos cria desestímulos a setores hipossuficientes, favorecendo as fortes estruturas de advocacia estatais. Poucas são as organizações de direitos humanos que têm condições de manter uma equipe acompanhando inúmeros processos que podem demorar mais de uma década para chegar a algum desfecho. A lentidão contribui, assim, para a perpetuação de práticas violadoras.

Os desafios internos também são múltiplos. O primeiro deles relaciona-se à formação de uma eficiente equipe de advogados. Questões de direitos humanos são normalmente complexas, exigindo profissionais bem treinados e experientes. Em face de questões de direitos humanos ocuparem uma posição apenas marginal no currículo acadêmico das faculdades de direito, quando ocupam algum lugar, é muito difícil encontrar jovens com a formação necessária. A questão ainda é mais complexa, pois um advogado combativo deve conhecer não apenas a área de direitos humanos, propriamente dita, mas também processo civil e penal, direito administrativo, além de direito constitucional. Esse domínio de múltiplas áreas normalmente só se encontra em profissionais mais experientes. No mais das vezes esses profissionais têm expectativas salariais inúmeras vezes maiores do que aquela viável para uma organização de direitos humanos. O problema não é apenas salarial, mas também de perfil. Em nossa experiência de recrutamento, poucos são os jovens engajados em direitos humanos que ao mesmo tempo dominem o processo e estejam dispostos a desempenhar a advocacia de forma metódica. Pior, quando se tornam bons advogados as atrações de mercado são enormes.

Associada à questão da formação de uma boa equipe está a de sua manutenção. Aqui há dois elementos, um de ordem financeiro e outro de natureza psicológica. No campo financeiro dificilmente organizações não-governamentais recebem recursos de longo prazo, compatíveis com o tempo necessário para o desfecho de um processo judicial no Brasil. As doações invariavelmente atendem as lógicas de projetos, de um ou dois anos, que devem ser renovados. Mesmo fundações mais estáveis cobram uma constante renovação de projetos, o que no campo jurídico não é necessariamente possível e/ou necessário. Raras são as fundações que compreendem a natureza do litígio estratégico e investem a mais longo prazo. O que se precisa é continuar fazendo o mesmo por muitos anos. A lentidão judicial também não contribui para que projetos de advocacia em direitos humanos se tornem autossustentáveis. Eventuais vitórias processuais, que em hipótese, poderiam gerar remuneração para os advogados demoram muitos anos para serem executadas, ainda mais quando o polo passivo da relação processual é o Estado. As dificuldades de manutenção de equipe, no entanto, não se limitam a questão financeira. A advocacia em direitos humanos, embora moralmente gratificante, é extremamente desgastante do ponto de vista psicológico. O contato diário com a violência, o arbítrio e o sofrimento alheio acaba por prejudicar a saúde psicológica de jovens advogados (também de outros profissionais). Mais do que isto, eventuais ameaças podem desestabilizar equipes que não dispõem, no mais das vezes, do devido apoio das organizações (psicológico e de segurança).

Um terceiro problema interno que detectamos nesse percurso, mas que é comum a outras organizações que dispõem de equipes de advogados, é o relacionamento entre o corpo jurídico e o corpo político da organização. Advogados tendem a se concentrar em processos, que têm prazos inadiáveis e exigem certa reclusão. A militância exige constante disponibilidade para o diálogo com outros interlocutores, a presença em múltiplos foros de debates, a ação coordenada com distintas esferas da sociedade e eventualmente do Estado. No percurso de uma organização que disponha de corpos jurídicos, não é incomum que essas distintas lógicas de trabalho gerem atritos. Ora são os advogados que não compreendem os imperativos políticos da ação da organização, ora são os militantes que não valorizam a reclusão e os imperativos temporais do processo. A mediação e integração das equipes devem ser constantes.

Uma forma de buscar superar problemas de escassez de recursos, sustentabilidade e mesmo experiência profissional, é buscar parcerias, seja no âmbito das agências de advocacia de interesse público estatais, seja na prática da advocacia pro bono, ou mesmo de outras organizações não-governamentais. Essas parcerias são essenciais, mas fazê-las funcionar é um constante desafio. Instituições públicas têm seus próprios mecanismos de tomada de decisão e formam suas próprias agendas, não estando sempre disponíveis para atender organizações não-governamentais. Favorecer esse diálogo, no entanto, é fundamental. O peso de instituições como o Ministério Público e mesmo as defensorias é tão grande no Brasil que não se pode pensar em um projeto de advocacia estratégica em direitos humanos que não leve essas instituições em consideração. A advocacia pro bono também tem um enorme potencial. Nesses anos todos, diversas parcerias estratégicas foram construídas, mas muitas vezes a alta tensão política que envolve um caso não facilita a entrada de advogados pro bonoem litígios de direitos humanos. Adicione-se a isto as restrições colocadas pela Ordem dos Advogados do Brasil à prática de advocacia pro bono . Também há que se explorarem melhor as parcerias com a universidade. Na experiência do Artigo 1º – Conectas, a maior dificuldade de se contar com a colaboração de professores e alunos de faculdades de direito está relacionada ao tempo; a academia é invariavelmente mais lenta do que o necessário.

Apesar desses obstáculos, inúmeras conquistas foram alcançadas nesse período e merecem ser destacadas num balanço como este. Não se trata de narrar eventuais vitórias judiciais, mas sim de refletir de que modo essas vitórias foram alcançadas e, sobretudo, de que maneira processos judiciais tiveram algum impacto no campo dos direitos humanos.

Se tomarmos como exemplo nossa advocacia voltada a coibir as más práticas no âmbito prisional juvenil, algumas linhas de ação positiva podem ser apreendidas. Três foram as diretrizes que buscamos levar em consideração. Quando devidamente articuladas, aumentaram nossas chances de sucesso.

O primeiro elemento que merece destaque é a relação íntima que um projeto de advocacia de direitos humanos deve ter com os diretamente interessados (vítimas ou seus representantes). Será apenas a partir de uma relação de confiança e respeito para com as vítimas que os advogados formularão demandas eventualmente relevantes para os grupos vulneráveis. Essa aproximação também é fundamental para que eventuais vitórias possam ser apropriadas por esses grupos. Essa relação é que dará sentido político e densidade social a prática da advocacia estratégica em direitos humanos. O enfrentamento de problemas dramáticos na extinta Febem de São Paulo só foi possível graças a uma aliança das mães, por intermédio da Amar, com os advogados da Conectas.

Um segundo elemento chave é a relação com a mídia. Embora haja no Brasil uma mídia reiteradamente contrária aos direitos humanos, a parte mais relevante da mídia escrita e mesmo de alguns dos mais relevantes canais de televisão dão enorme atenção à cobertura de questões relacionadas aos direitos humanos. Informar sistematicamente esses setores da mídia, produzir material confiável, oferecer casos reais e representativos de práticas violadoras é fundamental para obter a atenção dos meios de comunicação. No caso da crise do sistema carcerário do Espírito Santo acima narrado, a cobertura da mídia foi fundamental para desestabilizar as práticas violadoras.

Um terceiro fator que nos pareceu relevante em casos bem sucedidos foi que a atuação deu-se de forma sistemática, intensiva e persistente. Dificilmente consegue-se desestabilizar uma prática violadora por intermédio apenas de uma ação ou decisão judicial. É necessário cercar os problemas, atacá-los de múltiplos ângulos, reduzir as esferas de arbítrio, criar canais de participação e intervenção para que grupos dispostos a melhorar a situação possam participar do processo. Uma aproximação sistêmica do problema exige profundo conhecimento daquela realidade. Seja a questão carcerária, de violência policial, ou de discriminação de jovens com deficiência no sistema de ensino, é necessário antes de agir compreender os principais gargalos, os pontos de perpetuação dos problemas e atacá-los de múltiplas direções. A advocacia estratégica deve buscar oferecer aos juízes alternativas para o enfrentamento do problema. Como mencionado anteriormente, não basta obter o atendimento de um pleito, é necessário que sejam criados mecanismos que impeçam a perpetuação de práticas violadoras. Nesse mesmo sentido, a advocacia estratégica deve se aperfeiçoar e muito na formulação dos pedidos. Sem que os advogados sejam criativos quanto ao que pedir os juízes não serão “originais” no que conceder. Por fim, aprendemos que a persistência é indispensável para se conseguir alguns avanços, pois múltiplas são as derrotas para cada vitória obtida.

Além desses três elementos que buscamos constantemente levar em consideração, houve também uma abertura para se detectar oportunidades institucionais, que se não forem bem exploradas, vão se perdendo. Quando em 1999 surgiu a oportunidade legal para que organizações da sociedade civil pudessem participar de processos de interesse público no Supremo Tribunal Federal, por intermédio da apresentação de amicus curiae, poucas organizações se deram conta de que um novo caminho para uma importante arena de tomada de decisão estava sendo aberto. A atuação da Conectas no Supremo Tribunal Federal tem sido muito positiva não apenas por aduzir um viés de direitos humanos nas ações pendentes no Tribunal, mas sobretudo por ter sido capaz de inspirar inúmeras outras organizações a também buscarem apresentar suas perspectivas à Corte. Essa ampliação da participação social na Corte certamente impôs aos ministros a necessidade de tomar mais a sério a gramática dos direitos humanos.

A última lição que extraímos de nossa pequena, mas intensa, experiência com a advocacia estratégica em direitos humanos refere-se às próprias expectativas que devemos nutrir quando nos engajamos em complicadas lides. A advocacia não pode ser vista como um meio para se resolver os problemas, mas, sobretudo, como um meio para expor problemas de direitos humanos por outra ótica, muitas vezes negligenciada no Brasil, que é a do direito. Isto pode parecer uma contradição, mas entendemos que questões de direitos humanos, quando apresentadas apenas das perspectivas moral, política e mesmo econômica, tornam-se objeto de maior elasticidade argumentativa, como se certas práticas abusivas pudessem ser constantemente objeto de deliberação pelo corpo social. Ao aduzir a perspectiva dos direitos e chamar as instituições de aplicação da lei para o enfrentamento de questões de violações de direitos humanos, queremos chamar a atenção para a natureza imperativa desses direitos, que já foram objeto de deliberação. Assim, não há espaço para se discutir se a tortura foi legítima ou se a discriminação é parte de nossa cultura. Ao incorporar a gramática dos direitos humanos, por intermédio da Constituição e inúmeras leis e tratados, a sociedade e as autoridades brasileiras assumiram responsabilidade de natureza legal, que não podem ser sistematicamente flexibilizadas. Os direitos humanos são, assim, compreendidos em sua dimensão imperativa. Isto não significa negar a complexidade das situações de violação sistemática de direitos humanos, que exigem múltiplos esforços para serem superadas. A função da litigância é expor a inadmissibilidade de condutas violadoras, visando à responsabilização dos perpetradores e sobretudo buscando abrir canais institucionais para que essas práticas sejam superadas. Ao longo desse percurso, com enorme dificuldade e senso de limitação, o Artigo 1º – Conectas buscou atrair o peso do poder judiciário para desestabilizar práticas sistêmicas de violação de direitos humanos. Embora não seja possível traçar relações diretas de causalidade nesse campo de conhecimento, temos inúmeros indícios de que mesmo a atuação de um pequeno escritório de advocacia estratégica, como o da Conectas, pode sim contribuir para reduzir a invisibilidade de violações, a impunidade de violadores e, mais do que isso, o aperfeiçoamento de mecanismos institucionais voltados à questão dos direitos humanos.

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Notas

1. A RENAP, formada por advogados de base, sob a liderança de Jacques Alfonsin, Luiz Eduardo Greenhalg e Plínio de Arruda Sampaio. Essa rede ainda está em funcionamento, sendo responsável por construir as estratégias jurídicas e por assistir juridicamente ao MST em todo o Brasil.

2. Está em trâmite no Senado Federal a Proposta de Emenda Constitucional PEC 61/2011, que pretende ampliar o rol de legitimados para a propositura do Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) para os mesmos legitimados à propositura das ações de controle concentrado de constitucionalidade, previstos no artigo 103 da Constituição Federal de 1988.

3. O Núcleo de Terras e Habitação (NUTH) da Defensoria Pública teve uma forte atuação na denúncia de deslocamentos forçados no Rio de Janeiro e defesa das comunidades. Diante de grande pressão política feita contra os Defensores, que incluiu a demissão e transferência de funcionários do NUTH, os Defensores se afastaram das atividades por discordância com os rumos sugeridos pela atual administração.

4. Definição do Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF): Analfabetismo – Corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases ainda que uma parcela destes consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.). Alfabetismo rudimentar – Corresponde à capacidade de localizar uma informação explícita em textos curtos e familiares (como um anúncio ou pequena carta), ler e escrever números usuais e realizar operações simples, como manusear dinheiro para o pagamento de pequenas quantias ou fazer medidas de comprimento usando a fita métrica.

5. Por exemplo, no estado do Piauí foi constada a seguinte situação: “os adolescentes queixam-se consistentemente de agressões e maus tratos por parte de policiais (…). Descreveram os adolescentes (…) que são amarrados com as mãos presas para trás nas grades do alojamento, de modo a permanecerem nas pontas dos pés, por períodos prolongados”. No Rio Grande do Norte: “Conforme se verifica (…) há fezes humanas jogadas pelas paredes e teto, e lixo acumulado; foi relatado que o odor é repugnante. Os adolescentes narraram agressões por parte de policiais militares que realizam a segurança da unidade” (BRASIL, 2011a).

6. Apenas os Estados de São Paulo e Alagoas possuem Resolução Pro Bono emitidas pela Ordem dos Advogados do Brasil.

7. Relatório do CNJ indica que “o setor público (Federal, Estadual e Municipal), bancos e telefonia representam 95% do total de processos dos 100 maiores litigantes nacionais” (BRASIL, 2011b). Estima-se que estes 100 maiores litigantes representem 20% do total de processos no Brasil.

8. O Programa de Justiça da Conectas teve seu impulso inicial a partir do financiamento da Fundação AVINA (2003-2005), em apoio às atividades do fellow Oscar Vilhena Viera. Após a Fundação AVINA, o Programa de Justiça da Conectas obteve o apoio da OAK Foundation (2006-2008 e 2008-2010) e da Open Society Institute (2008-2009). Atualmente, o Programa de Justiça é financiado pela União Europeia, OAK Foundation e Open Society Institute.

9. Fizeram parte da equipe do Artigo 1º – Conectas: Advogados: Oscar Vilhena Vieira (2003-2010); Eloísa Machado de Almeida (2003-2009 e 2011); Beatriz Carvalho dos Santos (2004); Marcela Fogaça Vieira (2004-2011); Humberto Polcaro Negrão (2005-2008); Irineu João Simonetti Filho (2008); Samuel Friedman (2008-2010); Julia Mello Neiva (2009-2010), Vivian Calderoni (2011) e Flávia Annenberg (2011); Estagiários: Thiago Amparo (2004); Cecília Oliveira (2004); Vivian Sampaio Gonçalves (2005-2009); Valcrécio Paganele (2008-2009); Riccardo Silva (2009-2011); Rosa de Santana Santos (2010); Fernanda Sacillotto (2010); Fabiane Oliveira (2010).

10. O Estado de São Paulo concentrou, de 2003 a 2010, metade dos adolescentes privados de liberdade no país, caracterizando, portanto, um universo representativo do problema.

11. Outras organizações parceiras nessa área foram: Comissão Teotônio Vilela (CTV); Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca); Conselho Regional de Psicologia (CRP); Fundação Abrinq; Fundação Projeto Travessia; Centro de Direitos Humanos (CDH), Conselho Estadual de Direitos Humanos do Espírito Santo (CEDH-ES).

12. O Programa de Justiça da Conectas teve grande influência de projetos desenvolvidos pelo Ilanud, organização em que Oscar Vilhena Vieira e Eloísa Machado de Almeida desenvolveram de forma embrionária projetos de defesa judicial técnica de adolescentes em conflito com a lei, de 2000 a 2003, então sob a coordenação de Karyna Sposato.

13. As Corregedorias são órgãos de controle interno de instituições públicas, com objetivo de apurar faltas e violações a leis e regramentos internos. A Febemé a instituição pública responsável pela execução e gestão das unidades de privação de liberdade de adolescentes. Atualmente é denominada Fundação Casa.

14. Medidas Provisionais aos Adolescentes do Complexo Tatuapé, proposta por Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional – Cejil; Comissão Teotônio Vilela – CTV; Associação de Mães e Amigos de Crianças e Adolescentes em Risco – AMAR; Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos – FIDDH; Conectas Direitos Humanos e Fundação Projeto Travessia.

15. Foram parceiros dessas ações o Instituto Pro Bono, o Conselho Comunitário Penitenciário do Guarujá e o Ministério Público da comarca.

16. O caso segue em andamento na CIDH. Caso 12.654 (COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2008).

17. Medidas Cautelares em favor dos Presos na Cadeia Pública do Guarujá/ CIDH MC 63/2007 (COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2007).

18. Foram parceiros nessas ações: Centro de Apoio aos Direitos Humanos “Valdício Barbosa dos Santos”, Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra, Conselho Estadual de Direitos Humanos do Estado do Espírito Santo CEDH-ES, Justiça Global e Pastoral do Menor do Espírito Santo.

19. O Artigo 1º – Conectas participou de todas as ações as audiências públicas realizadas pelo STF até o momento sobre: pesquisa com células-tronco embrionárias (ADI 3510) (BRASIL, s.d. b); antecipação terapêutica de parto de feto anencéfalo (ADPF 54) (BRASIL, s.d. e); proibição da importação de pneus usados (ADPF 101) (BRASIL, s.d. f); ação afirmativa para negros nas universidades (ADPF 186) (BRASIL, s.d. g)e sobre o papel do Judiciário na efetivação do direito à saúde (BRASIL, s.d h).

20. Foram parceiros do Artigo 1º – Conectas nessa ação: Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Grupo CORSA, Grupo Gay da Bahia e Escritório de Direitos Humanos de Minas Gerais.

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REFERÊNCIAS

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Oscar Vilhena Vieira

Oscar Vilhena Vieira é Diretor da FGV Direito SP, onde leciona nas áreas de Direito Constitucional, Direitos Humanos e Direito e Desenvolvimento. Possui Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1988), Mestrado em Direito pela Universidade de Columbia, Nova York (1995), Mestrado e Doutorado em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (1991-1998) e Pós-doutorado pelo Centre for Brazilian Studies, Universidade de Oxford (2007). Foi Diretor Executivo do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Crime (ILANUD), assim como fundador e Diretor da organização Conectas Direitos Humanos. É editor da Sur – Revista Internacional de Direitos Humanos. Além disso, é membro de diversos conselhos de organizações da sociedade civil, entre os quais Instituto Pro Bono e Open Society Foundations. Possui diversos artigos e livros publicados na área de direitos humanos e direito constitucional. Entre eles, podem ser citados: “Direitos Fundamentais: uma Leitura da Jurisprudência do STF” (2006), “Supremo Tribunal Federal - Jurisprudência Política” (2002) e “A Constituição e sua Reserva de Justiça” (1999).

E-mail: oscar.vilhena@fgv.br

Original em português.

Eloísa Machado de Almeida

Eloísa Machado de Almeida é doutoranda em Direitos Humanos pela USP, mestra em política e advogada formada pela PUC/SP. Foi coordenadora do Projeto Artigo 1º do Programa de Justiça da Conectas Direitos Humanos de 2003 a 2009. Atualmente é consultora da Conectas.

Email: elo.machado@gmail.com

Original em português.